IQ desenvolve dispositivo útil para farmácias
de manipulação
Equipamento portátil e barato
mede princípio ativo em formulações
farmacêuticas comerciais
LUIZ
SUGIMOTO
|
A
professora Adriana Rossi e a pesquisadora Wilma
Crivelente: simplificando ao máximo o procedimento
analítico |
Desde 2001, as farmácias
de manipulação estão submetidas
a uma legislação nacional que obriga
a apresentação de laudos atestando a
qualidade da matéria-prima e dos produtos manipulados.
No caso da matéria-prima, os estabelecimentos
contam com resultados de análises do fornecedor.
Já quanto ao medicamento manipulado, as farmácias
ficam responsáveis pelo laudo comprovando a
dosagem prescrita pelo médico. Isto pode ser
encomendado a um laboratório especializado,
mas a custos razoáveis.
Um produto adequado para que as
farmácias de manipulação cumpram
a legislação e igualmente útil
em pequenos laboratórios é o
fruto de pesquisas realizadas pelo Instituto de Química
(IQ) da Unicamp. Wilma Cristina Tavares Crivelente,
em dissertação de mestrado orientada
pela professora Adriana Vitorino Rossi, dosou hidrocortisona
em formulações farmacêuticas comerciais,
usando um equipamento portátil que pode ser
montado por meros R$ 600. Nos testes, conseguimos
quantificar a hidrocortisona com boa precisão,
afirma Wilma Crivelente.
A professora Adriana Rossi explica
que a quantificação de medicamentos
envolve dois aspectos. Um deles é a dosagem
em fluidos biológicos do paciente, com fins
de análise clínica, controlando, por
exemplo, o quanto dele é absorvido pelo organismo,
quanto é efetivamente utilizado e quanto é
eliminado o que pode ser útil em diagnósticos.
Neste caso, as faixas de concentração
são muito baixas, um problema que requer detalhes
e cuidados especiais no desenvolvimento dos métodos
analíticos. Outro aspecto, muito diferente,
é dosar a quantidade do princípio ativo
numa formulação farmacêutica.
Então, as concentrações são
mais altas e o controle de qualidade passa a ser um
ponto crítico para garantir as propriedades
terapêuticas do produto a ser comercializado.
Esta dissertação
surgiu muito em função da idéia
de simplificar ao máximo o procedimento analítico.
As grandes indústrias farmacêuticas possuem
laboratórios que resolvem quase todos os problemas
de análise, mas graças a equipamentos
muito caros, inacessíveis para indústrias
menores e mais inacessíveis ainda para farmácias
de manipulação, diz a professora.
Baixo custo Para os
pesquisadores do Grupo de Pesquisas em Química
Analítica e Educação (GPQUAE)
do IQ, simplificar também significa tornar
mais barato. Os procedimentos que envolvem a formação
de compostos coloridos facilitam medidas analíticas.
Uma técnica é a espectrofotometria,
que no trabalho de Wilma Crivelente acabou adaptada
num equipamento portátil de baixo custo. O
aparelho, também desenvolvido aqui no laboratório
com a colaboração dos professores Matthieu
Tubino e Xiwen He, relaciona a intensidade da cor
proporcional à concentração
da substância com a resistência
de um resistor fotossensível que é lida
num multímetro, demonstra Adriana Rossi.
O multímetro pode ser comprado
em lojas de materiais elétricos por cerca de
R$ 70. A cela de medida, que envolve um resistor fotossensível
de R$ 1 real, é montada em teflon grafitado
(R$ 120) que precisa ser torneado em oficina (o trabalho
de torno não deve passar de R$ 400). Quanto
aos procedimentos, colocamos à disposição
dos interessados. Como toda farmácia de manipulação
possui um técnico em Química ou Bioquímica,
além de um farmacêutico, os procedimentos
experimentais são de domínio do estabelecimento,
acrescenta a professora.
Versatilidade Wilma
Crivelente não encontrou irregularidades em
seus testes com produtos comerciais contendo hidrocortisona.
Eles apresentaram variações dentro
da faixa estabelecida pelos fabricantes, atesta.
Esta variação é larga,
facilmente detectável em termos de análise.
Nosso procedimento atinge uma faixa muito menor. O
importante é que aplicamos uma reação
muito adequada, estudada no IQ e na Unesp de Araraquara,
pela professora Helena Pezza e o mestrando André
Vicentim, na qual se forma um composto colorido derivado
da hidrocortisona, assegura Adriana Rossi.
Os testes com a hidrocortisona confirmam
a eficácia do equipamento desenvolvido no IQ
na quantificação de um princípio
ativo, mas a professora, ao lado de outros pesquisadores,
vem trabalhando em procedimentos para outros princípios
ativos de formulações farmacêuticas,
como clorotetraciclina, acetato de dexametasona e
acetato de hidrocortisona. É possível
estudar outras reações para diferentes
compostos. Interações com farmácias
de manipulação ajudariam a priorizar
aqueles de seu maior interesse, sugere Adriana
Rossi.
Excesso acarreta efeitos colaterais
A hidrocortisona é
um hormônio produzido pelo organismo e
pode atuar como mecanismo natural de defesa,
apresentando importante atividade antiinflamatória.
Quando esta produção é
insuficiente, uma dosagem adicional pode ser
oferecida com medicamentos. Porém, o
uso prolongado desses medicamentos faz com que
o corpo vá deixando de produzir o hormônio,
tornando-se cada vez mais dependente da fonte
externa. Surge o risco de diversos efeitos colaterais,
variando conforme o metabolismo de cada pessoa,
sendo descritos na literatura casos que vão
do simples aumento de acnes ao agravamento de
problemas menstruais e ósseos, dores
de cabeça e até a morte.
A hidrocortisona possui várias
outras funções, dentre elas a
de aumentar o tônus muscular, tendo provocado
sua associação com doping de atletas.
Mas o uso abusivo afeta mais a população
que se automedica com antiinflamatórios.
Os médicos a prescrevem apenas como último
recurso, assim mesmo começando por doses
baixas e voltando a diminuí-las ao final
do tratamento, dando tempo ao organismo de repor
o que estava sendo ingerido.
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