Pesquisa produz cera extraída de subproduto
da cana
MANUEL
ALVES FILHO
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A pesquisadora Thaís Maria Ferreira de
Souza Vieira: destino mais nobre à torta
de filtro |
Um subproduto da indústria
sucroalcooleira, a torta de filtro, atualmente descartada
ou utilizada como fertilizante, pode ganhar um destino
mais nobre e gerar lucros adicionais para o setor,
graças a uma pesquisa desenvolvida por Thaís
Maria Ferreira de Souza Vieira, que acaba de se doutorar
pela Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da
Unicamp. O resíduo dá origem a uma cera
que apresentou propriedades químicas e físicas
próximas às das ceras comerciais de
carnaúba e abelha. O trabalho mostrou
que a cera obtida a partir da cana-de-açúcar
pode vir a ser uma alternativa à cera de carnaúba,
com potencial de aplicações nas áreas
alimentícia, farmacêutica, de cosméticos
e de limpeza, afirma a autora da tese. Segundo
ela, o estudo gerou um pedido de registro de patente
em nome da Universidade.
A cera da cana-de-açúcar
apresenta pelo menos duas vantagens importantes sobre
as demais, conforme Thaís. Primeiro, ela é
extraída de um subproduto abundante gerado
pela indústria sucroalcooleira. O Brasil, lembra
a pesquisadora, é o maior produtor mundial
dessa cultura agrícola. Dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
estimam que o País fechará 2003 com
uma safra de aproximadamente 380 milhões de
toneladas. Segundo, porque a cera da cana-de-açúcar
poderia ser usada como alternativa à de carnaúba,
que resulta de uma atividade extrativista e de produção
limitada.
A autora da tese de doutorado explica
que a cera está presente na superfície
da cana-de-açúcar. Ela forma uma espécie
de película que protege a planta contra a desidratação
e do ataque de microorganismos e insetos. Depois que
a cana é moída e o caldo é extraído
para a produção de açúcar
ou álcool, restam alguns subprodutos, entre
eles a torta de filtro. Para separar a cera dos outros
materiais é usado um solvente. Processo semelhante
é adotado para purificar o produto. Thaís
afirma que cada tonelada de cana-de-açúcar
gera, em média, 30 quilos de torta de filtro.
O rendimento em cera purificada,
a partir das tortas de filtro secas utilizadas no
trabalho, variou de cerca de 2% a 4%, de acordo com
a pesquisadora. Ao promover a análise da cera
já purificada, Thaís constatou que ela
apresentou propriedades químicas e físicas
similares às da cera comercial de carnaúba.
Embora o estudo não tenha incluído testes
relativos à aplicação, a autora
da tese acredita que, em virtude dessas características,
a cera de cana-de-açúcar poderia se
constituir em alternativa à cera de carnaúba
em algumas aplicações. As ceras, esclarece
a especialista, são usadas na produção
de biofilmes comestíveis, cosméticos,
revestimentos de cápsulas de remédios
e pastas para limpeza e polimento.
Segundo Thaís, a sua tese
de doutoramento faz parte de uma linha de pesquisa
da FEA, sob a coordenação do seu orientador,
o professor Daniel Barrera-Arellano. Algumas usinas
de açúcar e álcool, revela a
pesquisadora, já demonstraram interesse em
dar um destino mais nobre à torta de filtro,
a partir do processo desenvolvido por ela. Acredito
que, antes da transferência de tecnologia para
a iniciativa privada, seria necessário desenvolver
trabalhos que tenham como objetivo a aplicação
da cera da cana-de-açúcar, afirma.
Para desenvolver a tese, Thaís, que atualmente
trabalha na Embrapa Agroindústria de Alimentos,
contou com bolsa concedida pela Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (Fapesp).