Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 234 - de 20 a 26 de outubro de 2003
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Diário de Lisboa
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Tese: plano estratégico
Saúde: acidentes de trânsito
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O plano estratégico que virou tese
Secretário municipal de Sorocaba usa projeto idealizado por ele como arcabouço teórico de dissertação de mestrado

MANUEL ALVES FILHO

O secretário de Desenvolvimento Econômico de Sorocaba, Luiz Christiano Leite da Silva: levando em conta a realidade do município

Para quem não sabe para onde quer ir, qualquer caminho é bom. O adágio serve de ponto de partida para a entrevista com o secretário de Desenvolvimento Econômico de Sorocaba, Luiz Christiano Leite da Silva. Idealizador de um plano estratégico voltado para o desenvolvimento econômico sustentável do município, ele cumpriu um trajeto diferente da maioria dos alunos de pós-graduação da Unicamp. Ao invés de partir de um estudo de caso para chegar a algumas conclusões, ele tomou os resultados de um projeto que vem sendo executado na cidade desde o início de 1997 para dar sustentação científica à experiência. O resultado do trabalho, na forma de dissertação de mestrado, foi a concepção de uma ferramenta de gestão pública que, adaptada às necessidades específicas de cada localidade, pode trazer ganhos importantes, sobretudo no que se refere à qualidade de vida da população.

O exemplo de Sorocaba pode ser considerado impressionante no que se refere aos avanços econômicos e sociais proporcionados pelo conjunto de conceitos e iniciativas estabelecido no planejamento estratégico. Entre janeiro de 1997 e dezembro de 2002, a cidade experimentou um salto em diversos indicadores. Para começar, 32 novas empresas se instalaram na cidade nesse período. Juntas, elas apresentaram uma previsão de investimento de aproximadamente R$ 1 bilhão em cinco anos. O nível de emprego ficou 30% acima da evolução média verificada no Estado de São Paulo – 13% contra 10%. Como se não bastasse, a taxa de mortalidade infantil caiu de 25,8 para 13,8 por mil nascidos e o número de estudantes da rede municipal de ensino foi ampliado de 28.839 para 43.741, graças à construção de 34 escolas.
Mas como foi possível chegar a números tão positivos? Valendo-se mais uma vez do provérbio inicial, o secretário responde: “Nós sabíamos para onde queríamos ir”. Mas isso só não bastava, como o próprio Silva esclarece. As dificuldades para formular e colocar o plano estratégico em prática foram enormes. Ele descobriu, por exemplo, que praticamente não existe literatura sobre o assunto, que aborde ações no âmbito local. “As poucas obras disponíveis, editadas em outros países, tratam a questão do ponto de vista macro”, afirma.

A adaptação dos princípios do planejamento estratégico à realidade do município talvez tenha sido a grande virtude do trabalho, na opinião de Silva. A metodologia propriamente dita, segundo ele, não tem nada de original. “Aliás, não há nada de errado em copiar os bons projetos”, recomenda. “Nós fomos fazendo, aprendendo e aprimorando a base científica, tendo em vista não apenas o aspecto econômico, mas também o social e o filosófico”, acrescenta. O plano aplicado à Sorocaba seguiu quatro vertentes, conforme o autor da dissertação de mestrado. Elas tiveram como objetivo o fortalecimento das empresas locais, a atração de novos investimentos, a melhoria da infra-estrutura urbana e o aprimoramento dos serviços públicos.

Sorocaba: em seis anos, 32 empresas instaladas, investimento de aproximadamente R$ 1 bilhão e nível de emprego 30% acima da evolução registrada no Estado de São Paulo

Para isso, foi preciso mobilizar e obter o engajamento dos vários segmentos da população, definidos por Silva como “agentes ativos da sociedade”. Foram criados conselhos municipais, de caráter consultivo, que ajudaram na formulação do plano. A meta era, e continua sendo, otimizar os recursos e tornar as ações mais eficazes. Depois de debater incansavelmente as questões relacionadas ao futuro da cidade, os representantes da comunidade definiram algumas condições sem as quais não seria possível promover o ansiado desenvolvimento. Primeiro, seria necessário respeitar a vocação econômica do município, notadamente industrial. Depois, era indispensável oferecer aos futuros investidores condições vantajosas nas áreas de logística, infra-estrutura, mão-de-obra, atendimento e organização local e regional.

Posteriormente, foram definidas e executadas ações estratégicas diretas, de competência exclusiva da administração pública municipal, e indiretas, aquelas que dependiam de outras instâncias de governo e da iniciativa privada. As medidas envolveram desde a aprovação de leis de incentivo fiscal aos futuros investidores e aos empreendedores já instalados até a recuperação de rodovias e a revitalização da área central, passando pela criação da própria Secretaria de Desenvolvimento Econômico. O resultados dessas iniciativas, reforça o autor da dissertação, foram altamente positivos.

Além dos avanços já citados, Sorocaba registrou um aumento progressivo em seu orçamento. As receitas municipais, que eram da ordem de R$ 162 milhões em 1996, pularam para R$ 354 milhões em 2002 - variação de 114%. Os recursos adicionais, conforme o secretário, foram devolvidos à sociedade. Em seis anos, afirma Silva, a Prefeitura executou 1,5 mil obras, que beneficiaram 83 bairros. O número de famílias que vivem em áreas de risco foi reduzido de 1.500 para 420. Também foram asfaltados cerca de 1,5 milhão de metros quadrados de ruas.

O projeto de asfaltamento, destaca o secretário, é emblemático no que toca aos ganhos subjacentes proporcionados pelo planejamento estratégico, que não podem ser traduzidos em números. Ele conta que, em alguns bairros, o asfalto promoveu uma revolução de comportamento. Na medida em que as obras avançavam, diz, os moradores executavam melhorias em suas casas. “Eles entenderam que, com as vias pavimentadas, suas famílias precisavam ter moradias mais bonitas. Esse resgate da auto-estima de uma parcela significativa dos sorocabanos é um avanço que não tem como ser mensurado”, afirma o secretário.

Idéias e perenização – Alguém há de imaginar que, para colocar tantos projetos em prática e contabilizar números tão expressivos, foi preciso partir de um patamar elevado em termos financeiros. Nada disso, segundo o autor da dissertação. Pegue-se como exemplo a realidade orçamentária da Pasta comandada por Silva. Os recursos originais para 2003, que eram de R$ 30 mil, foram reduzidos para R$ 10 mil. “O dinheiro, obviamente, é indispensável para a promoção de transformações como as que ocorreram em Sorocaba. Mas, antes dele, é preciso ter idéias que convençam os vários segmentos da sociedade a participar desse esforço. É necessário, prioritariamente, unir competências, identificar oportunidades e respeitar a vocação da cidade”, ensina.

Uma pergunta, porém, sempre ocorre a quem toma contato com um assunto que une gestão pública e projetos duradouros. Afinal, o planejamento estratégico é capaz de sobreviver à natural sucessão dos dirigentes, cada qual com a sua visão particular do que seja desenvolvimento econômico? De acordo com Silva, não há garantias quanto a isso. Nenhum plano dessa natureza traz em si mecanismos que assegurem a sua perenização. “Mas acredito que qualquer governante vai pensar muitas vezes antes de desconsiderar um conjunto de ações que deu tão certo e que envolveu um amplo espectro da sociedade”, afirma. Pelo menos por enquanto, Sorocaba parece saber onde quer chegar.

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