O plano estratégico que virou tese
Secretário
municipal de Sorocaba usa projeto idealizado por ele
como arcabouço teórico de dissertação
de mestrado
MANUEL
ALVES FILHO
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O secretário de Desenvolvimento Econômico
de Sorocaba, Luiz Christiano Leite da Silva: levando
em conta a realidade do município |
Para quem não sabe para onde
quer ir, qualquer caminho é bom. O adágio
serve de ponto de partida para a entrevista com o
secretário de Desenvolvimento Econômico
de Sorocaba, Luiz Christiano Leite da Silva. Idealizador
de um plano estratégico voltado para o desenvolvimento
econômico sustentável do município,
ele cumpriu um trajeto diferente da maioria dos alunos
de pós-graduação da Unicamp.
Ao invés de partir de um estudo de caso para
chegar a algumas conclusões, ele tomou os resultados
de um projeto que vem sendo executado na cidade desde
o início de 1997 para dar sustentação
científica à experiência. O resultado
do trabalho, na forma de dissertação
de mestrado, foi a concepção de uma
ferramenta de gestão pública que, adaptada
às necessidades específicas de cada
localidade, pode trazer ganhos importantes, sobretudo
no que se refere à qualidade de vida da população.
O exemplo de Sorocaba pode ser considerado
impressionante no que se refere aos avanços
econômicos e sociais proporcionados pelo conjunto
de conceitos e iniciativas estabelecido no planejamento
estratégico. Entre janeiro de 1997 e dezembro
de 2002, a cidade experimentou um salto em diversos
indicadores. Para começar, 32 novas empresas
se instalaram na cidade nesse período. Juntas,
elas apresentaram uma previsão de investimento
de aproximadamente R$ 1 bilhão em cinco anos.
O nível de emprego ficou 30% acima da evolução
média verificada no Estado de São Paulo
13% contra 10%. Como se não bastasse,
a taxa de mortalidade infantil caiu de 25,8 para 13,8
por mil nascidos e o número de estudantes da
rede municipal de ensino foi ampliado de 28.839 para
43.741, graças à construção
de 34 escolas.
Mas como foi possível chegar a números
tão positivos? Valendo-se mais uma vez do provérbio
inicial, o secretário responde: Nós
sabíamos para onde queríamos ir.
Mas isso só não bastava, como o próprio
Silva esclarece. As dificuldades para formular e colocar
o plano estratégico em prática foram
enormes. Ele descobriu, por exemplo, que praticamente
não existe literatura sobre o assunto, que
aborde ações no âmbito local.
As poucas obras disponíveis, editadas
em outros países, tratam a questão do
ponto de vista macro, afirma.
A adaptação dos princípios
do planejamento estratégico à realidade
do município talvez tenha sido a grande virtude
do trabalho, na opinião de Silva. A metodologia
propriamente dita, segundo ele, não tem nada
de original. Aliás, não há
nada de errado em copiar os bons projetos, recomenda.
Nós fomos fazendo, aprendendo e aprimorando
a base científica, tendo em vista não
apenas o aspecto econômico, mas também
o social e o filosófico, acrescenta.
O plano aplicado à Sorocaba seguiu quatro vertentes,
conforme o autor da dissertação de mestrado.
Elas tiveram como objetivo o fortalecimento das empresas
locais, a atração de novos investimentos,
a melhoria da infra-estrutura urbana e o aprimoramento
dos serviços públicos.
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Sorocaba: em seis anos, 32 empresas instaladas,
investimento de aproximadamente R$ 1 bilhão
e nível de emprego 30% acima da evolução
registrada no Estado de São Paulo |
Para isso, foi preciso mobilizar
e obter o engajamento dos vários segmentos
da população, definidos por Silva como
agentes ativos da sociedade. Foram criados
conselhos municipais, de caráter consultivo,
que ajudaram na formulação do plano.
A meta era, e continua sendo, otimizar os recursos
e tornar as ações mais eficazes. Depois
de debater incansavelmente as questões relacionadas
ao futuro da cidade, os representantes da comunidade
definiram algumas condições sem as quais
não seria possível promover o ansiado
desenvolvimento. Primeiro, seria necessário
respeitar a vocação econômica
do município, notadamente industrial. Depois,
era indispensável oferecer aos futuros investidores
condições vantajosas nas áreas
de logística, infra-estrutura, mão-de-obra,
atendimento e organização local e regional.
Posteriormente, foram definidas
e executadas ações estratégicas
diretas, de competência exclusiva da administração
pública municipal, e indiretas, aquelas que
dependiam de outras instâncias de governo e
da iniciativa privada. As medidas envolveram desde
a aprovação de leis de incentivo fiscal
aos futuros investidores e aos empreendedores já
instalados até a recuperação
de rodovias e a revitalização da área
central, passando pela criação da própria
Secretaria de Desenvolvimento Econômico. O resultados
dessas iniciativas, reforça o autor da dissertação,
foram altamente positivos.
Além dos avanços já
citados, Sorocaba registrou um aumento progressivo
em seu orçamento. As receitas municipais, que
eram da ordem de R$ 162 milhões em 1996, pularam
para R$ 354 milhões em 2002 - variação
de 114%. Os recursos adicionais, conforme o secretário,
foram devolvidos à sociedade. Em seis anos,
afirma Silva, a Prefeitura executou 1,5 mil obras,
que beneficiaram 83 bairros. O número de famílias
que vivem em áreas de risco foi reduzido de
1.500 para 420. Também foram asfaltados cerca
de 1,5 milhão de metros quadrados de ruas.
O projeto de asfaltamento, destaca
o secretário, é emblemático no
que toca aos ganhos subjacentes proporcionados pelo
planejamento estratégico, que não podem
ser traduzidos em números. Ele conta que, em
alguns bairros, o asfalto promoveu uma revolução
de comportamento. Na medida em que as obras avançavam,
diz, os moradores executavam melhorias em suas casas.
Eles entenderam que, com as vias pavimentadas,
suas famílias precisavam ter moradias mais
bonitas. Esse resgate da auto-estima de uma parcela
significativa dos sorocabanos é um avanço
que não tem como ser mensurado, afirma
o secretário.
Idéias
e perenização Alguém
há de imaginar que, para colocar tantos projetos
em prática e contabilizar números tão
expressivos, foi preciso partir de um patamar elevado
em termos financeiros. Nada disso, segundo o autor
da dissertação. Pegue-se como exemplo
a realidade orçamentária da Pasta comandada
por Silva. Os recursos originais para 2003, que eram
de R$ 30 mil, foram reduzidos para R$ 10 mil. O
dinheiro, obviamente, é indispensável
para a promoção de transformações
como as que ocorreram em Sorocaba. Mas, antes dele,
é preciso ter idéias que convençam
os vários segmentos da sociedade a participar
desse esforço. É necessário,
prioritariamente, unir competências, identificar
oportunidades e respeitar a vocação
da cidade, ensina.
Uma pergunta, porém, sempre
ocorre a quem toma contato com um assunto que une
gestão pública e projetos duradouros.
Afinal, o planejamento estratégico é
capaz de sobreviver à natural sucessão
dos dirigentes, cada qual com a sua visão particular
do que seja desenvolvimento econômico? De acordo
com Silva, não há garantias quanto a
isso. Nenhum plano dessa natureza traz em si mecanismos
que assegurem a sua perenização. Mas
acredito que qualquer governante vai pensar muitas
vezes antes de desconsiderar um conjunto de ações
que deu tão certo e que envolveu um amplo espectro
da sociedade, afirma. Pelo menos por enquanto,
Sorocaba parece saber onde quer chegar.