Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 270 - de 18 a 24 de outubro de 2004
Leia nessa edição
Capa
Diário da Cátedra
O tipo da soja em 30 segundos
Parceria com a Renault
Polpa da laranja contra diabetes
A hora do reconhecimento
Fóruns
Visões sobre a fome
Superávit primário
Jovens de São Paulo:
   desemprego
Painel da semana
Oportunidades
Teses da semana
Unicamp na mídia
O mundo gira
Unicamp e Sebrae
O império muda de ares
 

9

Estudo mostra como a década de 90 foi perversa
para trabalhadores de 15 a 24 anos na Grande SP

Aos jovens de São Paulo, o desemprego



MANUEL ALVES FILHO


Em busca de uma vaga em São Paulo: desemprego, informalidade e violência explodiram na região metropolitana (Foto:Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem)A situação sócio-ocupacional do jovem residente na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) sofreu sensível piora ao longo da década de 90 em comparação com o período imediatamente anterior. A conclusão faz parte da dissertação de mestrado de Luciane Bombach, defendida recentemente no Instituto de Economia (IE) da Unicamp. Em seu trabalho, a pesquisadora traçou, a partir de uma tipologia construída pelo professor Waldir Quadros, seu orientador, um panorama da realidade enfrentada por trabalhadores de 15 a 24 anos. Os dados gerados pelo estudo, segundo ela, desfazem algumas lendas que envolvem o mundo do trabalho no qual essas pessoas estão inseridas. Uma delas diz respeito ao reflexo do crescimento do nível de escolaridade no rendimento do jovem trabalhador. Embora as matrículas no ensino médio tenham experimentado um aumento de 118% nos últimos 20 anos, a renda média real desse segmento despencou de R$ 661,90 em 1981 para R$ 570,00 em 2002.

Renda cai em todos os níveis de escolaridade

De acordo com Luciane, todos os indicadores sócio-ocupacionais relacionados aos jovens da RMSP perderam vigor nos anos 90 em comparação com a década anterior. Isso ocorreu, segundo ela, em razão da queda do desempenho da economia brasileira de um período para o outro. Se na década de 80 o país enfrentou um forte processo de estagnação, na fase seguinte esse problema foi reforçado por outros fatores, como a desestruturação do setor industrial e a abertura comercial e financeira. Uma das conseqüências desse quadro foi a explosão do desemprego e, conseqüentemente, da informalidade. “Nesse aspecto, o jovem normalmente é a maior vítima. Quando uma empresa se vê obrigada a demitir, o trabalhador juvenil quase sempre é o primeiro a ser escolhido”, lembra a pesquisadora.

Luciane Bombach: jovem é levado a assumir uma culpa que não tem (Foto: Antoninho Perri)A partir de dados coletados junto à Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Luciane lançou mão da tipologia concebida pelo professor Waldir Quadros para traçar o panorama da situação dos jovens da RMSP. Atualmente, esse contingente é formado por cerca de 3,5 milhões de pessoas, sendo que 1,7 milhão tem ocupação. Entre os ocupados, 60% alcançam rendimentos de até R$ 500,00 ao mês, independente do grau de escolaridade. Em seu estudo, a pesquisadora promoveu alguns recortes, como o de raça e gênero. Da população jovem ocupada, 56% são homens e 65% são brancos.

Segundo Luciane, foi possível identificar, ainda, uma hierarquia em termos de rendimento e status, que segue a seguinte ordem: homem branco, mulher branca, homem negro e mulher negra. “O rendimento médio de uma mulher negra no mesmo ramo de atividade de um homem branco é 30% inferior ao deste”, afirma. Em alguns setores, como o financeiro e o industrial, essa discrepância atinge 60% e 50% respectivamente, conforme a autora da pesquisa. Entre a população branca, a mulher ganha de 15% e 20% menos do que o homem. A investigação conduzida pela economista também desfaz algumas lendas e fábulas criadas em torno da situação sócio-ocupacional do jovem trabalhador.

A primeira, como já foi mencionado, refere-se à questão da escolaridade. A despeito de o número de matrículas no ensino médio ter sofrido um aumento de 118% ao longo dos últimos 20 anos, esse dado não permite fazer qualquer co-relação com o rendimento dos jovens. “Entre a década de 80 e a de 90, a renda desses trabalhadores caiu em todas as faixas. Os trabalhadores de nível médio perderam 36%, os de nível fundamental 21% e os de nível superior 20,6%”, aponta Luciane. Conforme o estudo, entre os 270 mil jovens com nível superior, 22% recebem salários de até R$ 500,00 ao mês. Além disso, 25 mil deles têm renda média mensal de R$ 65,00, ou seja, menos de um quarto do salário mínimo nacional. “Como é que esse jovem consegue pagar a faculdade?”, questiona a especialista.

Outra lenda diz respeito à ampliação do número de jovens com carteira de trabalho assinada. Entre os trabalhadores de 18 a 24 anos, 19,6% não eram registrados em 1982. Em 2002, esse percentual saltou para 35,8%, o que representa um contingente de 472.317 pessoas. Mais uma lenda desfeita pelo estudo relaciona-se com a questão da socialização juvenil. De acordo com Luciane, o jovem não participa mais de sindicatos, partidos políticos e nem mesmo de agremiações estudantis como em épocas passadas. Atualmente, eles estão mais voltados para ações voluntárias, movimentações políticas instantâneas e pouco institucionais e participações em grupos artísticos, esportivos e religiosos.

Todo esse cenário, destaca Luciane, criou uma situação de desencanto do jovem em relação ao próprio futuro. Em entrevistas que promoveu com alguns personagens, a pesquisadora constatou que muitos deles não têm qualquer perspectiva de melhora em sua condição sócio-ocupacional. “O pessimismo tomou conta de uma parcela significativa desse segmento”, diz. Em alguns casos, conforme a economista, o jovem é levado a assumir uma culpa que na realidade não tem. “Eu entrevistei jovens que diziam não ter tido a sorte de serem registrados, como se isso fosse responsabilidade unicamente deles”, surpreende-se.

A forma como o jovem encara a falta de perspectiva – vários disseram não ter planos concretos no âmbito profissional e mesmo pessoal – é explicada não apenas pela piora sensível da sua situação sócio-ocupacional, mas também por fatores decorrentes dela, em certa medida. Com a retração econômica e o aumento do desemprego, explodiram, por exemplo, os índices de violência, principalmente nos grandes centros urbanos, caso específico da Região Metropolitana de São Paulo. “Nesse aspecto, o jovem mais uma vez é o mais atingido. Diversas pesquisas indicam que esse contingente é a principal vítima e ao mesmo tempo o maior algoz da violência urbana”, assinala a autora da dissertação, que contou com bolsa de estudos concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia.

De acordo com Luciane, que pretende expandir a sua pesquisa para o âmbito nacional na tese de doutoramento, é importante destacar que a crise que envolve a empregabilidade do jovem não é uma característica apenas do Brasil. Na Argentina, da taxa total de desemprego (39,5%), 15,4% corresponde ao segmento juvenil. No Chile, esses índices são, respectivamente, de 21,4% e 9,4%. Em terras tupiniquins, o desemprego juvenil corresponde à metade do desemprego total, que é da ordem de 14%.

Topo

SALA DE IMPRENSA - © 1994-2004 Universidade Estadual de Campinas / Assessoria de Imprensa
E-mail: imprensa@unicamp.br - Cidade Universitária "Zeferino Vaz" Barão Geraldo - Campinas - SP