A noção de conjuntos nebulosos surgiu para ampliar a teoria e metodologia e solucionar problemas em áreas da engenharia elétrica e de computação relacionadas a sistemas inteligentes, inteligência artificial, sistemas de processamento de informação e de decisão.
Para explicar do que trata a teoria que surgiu em 1965, criada pelo professor Lotfi Zadeh, da Universidade da Califórnia, Berkeley, e que deu origem ao Fuzzy Systems Engineering, o professor Gomide lança mão de analogias. Segundo ele, a questão nasce do debate entre o ser ou não ser cartesiano.
Na opinião do docente, as ciências são essencialmente cartesianas uma coisa ou é branca ou preta, verdadeira ou falsa, e não se contemplam as nuances. A observação mostra que as ocorrências não se dão somente dessa forma o mundo admite verdades, falsidades, meias verdades, meias falsidades etc.
Por exemplo, pela teoria clássica dos conjuntos, um copo estará cheio ou vazio, sem toda a gama de possibilidades intermediárias, incluindo o caso de meio cheio ou meio vazio, como um copo com água pela metade. Estas variações, não-contempladas pela teoria clássica dos conjuntos, passaram a ser abordadas com a utilização da teoria dos conjuntos nebulosos, referência à palavra inglesa fuzzy, que sugere a idéia de transição gradual entre o ser e o não ser (a transição de um copo vazio a um copo cheio de água é gradual), pertencer ou não pertencer a um conjunto (conjuntos dos copos cheios e conjunto dos copos vazios) etc.
Isso permite, explica o docente, a representação formal de grandezas e conceitos imprecisos e incertos, de pertinência gradual, e abre mão da dicotomia cartesiana. Até recentemente, não se tinha um aparato formal para tratar dessas questões.
Essa representação matemática é usada, diz Gomide, em um sistema de computação para modelar e controlar processos, para analisar informação e tomar decisão, ou fazer um robô navegar de forma autônoma utilizando sensores e visão computacional. O pesquisador acrescenta, com certa ironia: “dá respostas precisas para fenômenos imprecisos, por paradoxal que possa parecer”.
A respeito da obra, Gomide diz que o livro trata dos princípios básicos da teoria dos conjuntos nebulosos e se estende por alguns estudos de caso feitos por ele e outros pesquisadores. “Vários capítulos transpiram as pesquisas que realizamos e apresentam em primeira mão trabalhos ainda não divulgados em periódicos. Consideramos a obra consistente com o estado da arte”.
Embora a publicação tenha como alvo a engenharia elétrica, computação e áreas correlatas, atende também os interesses de áreas como logística, gestão, transporte, modelagem, controle e otimização de processos industriais, economia e biologia.
Modelos econômicos e biológicos se encaixam no contexto de sua abordagem, pois utilizam noções e conceitos relacionando variáveis cujos valores não são necessariamente precisos. Para o autor, com os sistemas nebulosos podem ser criados os chamados modelos lingüísticos. Se um sistema tiver seu funcionamento descrito lingüisticamente, a descrição pode ser traduzida em algoritmos utilizando a teoria dos conjuntos nebulosos, o que possibilita seu uso computacional.
A teoria de conjuntos nebulosos tem importância considerável na sumarização e compactação de informação. Gomide explica: “Ao avaliar o conforto térmico de um ambiente, geralmente, atribuímos a ele sensações como muito frio, frio, agradável, quente, muito quente. Termos lingüísticos como ‘agradável’, por exemplo, encapsulam um número grande de valores de temperatura, compactando e sumarizando a informação”.
A teoria de conjuntos nebulosos permite, continua o docente, representar termos lingüísticos matematicamente através de funções de pertinência, que na realidade são sinônimos de conjuntos nebulosos, e processar conhecimento lingüístico. “Com isso, obtemos mecanismos e algoritmos para computar com palavras, variáveis com valores imprecisos e implementar procedimentos de raciocínio aproximado. Obtém-se, assim, maior tratabilidade e robustez na solução de problemas complexos”.
O convite Fernando Gomide lembra que, a partir de meados da década de 90, as atividades com inteligência artificial se intensificaram na FEEC. Desde então, aumentaram as participações em congressos, surgiram oportunidades de desenvolvimento de trabalhos de cooperação com o exterior e adensaram-se as relações com a comunidade internacional.
Esse contexto possibilitou que, ao fazer a sugestão da publicação da obra à editora, a comunidade científica internacional lhe associasse também o nome do professor Fernando Gomide e do seu colega canadense Witold Pedrycz, com quem comunga pontos de vistas comuns.
Convidados pela editora, os autores apresentaram projeto aprovado por revisores internacionais, a exemplo do que ocorre com os artigos submetidos a periódicos, e executaram a obra em cerca de dois anos. O professor Gomide entende que o delinear desse caminho envolve muitos atores: os colegas de departamento, da FEEC e da Unicamp como um todo, alunos de graduação e pós-graduação, a Fapesp, o CNPq, além da família e amigos.
Em relação à obra, o autor enfatiza: “Hoje, até onde vai meu conhecimento, não existe algo no gênero, porque os livros em circulação estão um pouco defasados. Estamos próximos do estado de arte e talvez nos mantenhamos assim por uns dois anos, pois previsões para além são difíceis”, constata.
A abordagem está voltada para a desmistificação, apresenta muitos exemplos que ajudam a compreensão, sempre que possível introduz algoritmos para mostrar a aplicação prática, foi organizada de forma distinta do usual e traz uma bibliografia bastante atualizada.
Ele considera que o aspecto didático é fundamental em uma obra produzida por um professor: “É um livro escrito para alunos, profissionais e professores que querem estudar, aprender o assunto e aplicar os conceitos e idéias nas respectivas áreas de interesse. Contém itens com abordagens mais avançadas para estimular a pesquisa e o desenvolvimento, mas na essência trata-se de um livro-texto”, afirma.
Projetada para utilização nos últimos anos de cursos de graduação e no inicio da pós-graduação em engenharia e áreas correlatas, a obra exige conhecimentos básicos de cálculo e álgebra linear inerentes a esses cursos e áreas afins.