A arte de retratar o cotidiano em muros e paredes não é atual. Em Pompéia, cidade do Império Romano, as inscrições em muros e interiores de cavernas também traziam aspectos relacionados às práticas habituais daqueles povos. A diferença, hoje, segundo a mestre em Artes Ana Célia Garcia de Sales, é a intenção. “O jovem que recorre a este tipo de manifestação artística quer passar uma mensagem de reafirmação e de contestação”, destaca.
Em dissertação apresentada no Instituto de Artes (IA), Ana Célia aborda estas duas categorias de escritas em paredes e analisa as políticas públicas, em Campinas, para inibir as pichações, consideradas como crime contra o patrimônio público. Para Ana Célia, a pichação e o grafiti são manifestações artísticas. Ela reconhece, no entanto, que o problema da pichação está justamente na expressão da arte em locais proibidos. “Existe um componente artístico neste tipo de manifestação, só que é feita em lugar errado”, acredita.
Uma das principais discussões propostas por Ana Célia é o conceito de arte livre. Suas análises, orientadas pelo professor Marco Antonio Alves do Valle, apontam que a pichação é manifestada de forma mais livre do ponto de vista artístico. Isto porque, na tentativa de combater o crime, a Prefeitura de Campinas desenvolve, desde 2001, uma série de projetos que oferecem espaços para a grafitagem. A questão seria a apresentação de temas para serem pintados. “Este aspecto descaracteriza a arte livre”, argumenta Ana Célia.
Por outro lado, a iniciativa trouxe uma opção para a preservação do patrimônio histórico da cidade. Pelo código de honra firmado entre as duas categorias, não se faz pichação em locais onde ocorrem as grafitagens. Desta forma, edifícios e monumentos históricos foram selecionados para receber os trabalhos de grafiteiros, entre os quais, o Colégio Culto à Ciência, a Estação Guanabara e até mesmo espaços públicos de grande circulação de pessoas, como é o caso do Terminal Barão Geraldo.
O estudo utilizou a metodologia de entrevista oral com os principais grupos de grafiteiros de Campinas. No caso dos pichadores, Ana Célia recorreu a estudos sobre o perfil, uma vez que eles vivem no anonimato.
A pichação surgiu nos Estados Unidos, entre o final da década de 1960 e início dos anos 1970. A arte foi disseminada pelo mundo todo, evoluindo na seqüência para a grafitagem, caracterizada pela manifestação consentida pelos donos dos espaços. Já os pichadores têm como meta pintar edifícios altos e de difícil acesso, em horários noturnos, sem que o dono saiba da ação.