Grafar “em cima”, separado e, “embaixo” junto, pode parecer natural para um adulto que já está familiarizado com a escrita. Para uma criança, em idade de alfabetização, no entanto, o caso já é mais complicado. É muito comum encontrar em textos infantis junções e separações de palavras não previstas pelas convenções escritas, como “aiquedelícia” (Ai que delícia!) e “a quario” (aquário). Por isso, a lingüista Cristiane Carneiro Capristano decidiu investigar quais fatos lingüísticos que estariam por trás desses “erros” cometidos pelas crianças.
No estudo feito com a orientação da professora Maria Augusta Bastos de Mattos, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), a lingüista acompanhou a aquisição da escrita por duas crianças matriculadas no ensino fundamental.
Os textos produzidos pelas crianças fazem parte de um banco de escrita infantil, com cerca de dois mil dados, organizado por Cristiane, em parceria com o professor Lourenço Chacon, da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (Unesp), de Marília. O projeto pretende disponibilizar o material colhido ao longo de quatro anos (de 2001 a 2004) em duas escolas da região de São José do Rio Preto. Neste período, Cristiane freqüentou as escolas para colher textos de cerca de cem crianças.
A cada encontro, era sugerida uma atividade a ser desenvolvida. “Contava uma história e pedia a interpretação por escrito ou, ainda, que escrevessem uma receita, uma carta, algum texto livre para a análise”, explica a lingüista. Para a tese de doutorado, Cristiane selecionou duas crianças mais freqüentes nas atividades para analisar as mudanças ocorridas no modo como ao longo do tempo as crianças segmentavam, por espaços em branco, suas produções escritas.
Dois fenômenos já descritos na literatura basearam o estudo de Cristiane, a hipossegmentação e a hipersegmentação. No primeiro, a junção das palavras é a marca da escrita e, no segundo, ocorre justamente o inverso. “As crianças precisam construir a noção de morfológica. As análises neste processo, na minha opinião, são fontes riquíssimas de informações para os professores, e possibilitam uma melhor intervenção no aprendizado”, acredita Cristiane.