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AGRONEGÓCIOS

 

Procurando flores no campo
Especialistas apostam no agronegócio e lamentam
que o brasileiro sinta vergonha de seu talento rural

A receita do agronegócio representa 39% do PIB brasileiro e é considerada a área de maior contágio em outros segmentos sociais. Seu desenvolvimento gera inclusão social e tem impacto direto na balança comercial. Ostenta índices invejáveis de produtividade em diversas áreas e agrega mão-de-obra e comunidade. Mas nem tudo são flores no campo brasileiro. Há falta de política agrícola de longo prazo, desprezou-se até hoje o estímulo ao valor agregado nas exportações e o país enfrenta os subsídios internacionais, tão execrados pelos governos do primeiro mundo quando se deparam com preços mais competitivos do terceiro mundo.

O salto tecnológico de que tanto se fala não parece inalcançável, na opinião dos especialistas da área. Já existe o conhecimento, falta disseminá-lo. Assim como falta extirpar a idéia de que agricultura familiar é atrasada e pouco econômica. Esta falácia, que proliferou nos anos da expansão das culturas mecanizadas em grandes áreas, é desmentida pelos números, daqui e de fora: representa de 35% a 40% da produção brasileira e é predominante nos países desenvolvidos.

“A população brasileira parece ter vergonha de seu talento rural e optou por ser ‘urbanóide’ ao invés de urbana”, lamenta o secretário estadual da Agricultura, João Carlos Meirelles. “O que mais surpreende são os contrastes do país, existentes mesmo dentro do próprio Estado de São Paulo, que tem o quadrilátero formado por Campinas, Sorocaba, Santos e São José dos Campos com tecnologia de primeiro mundo e um estupendo débito social”.

Da porteira para dentro, a propriedade rural brasileira dispõe de toda a tecnologia necessária para tornar a agricultura um setor ainda mais vigoroso de negócios. Mas falta a apropriação deste conhecimento de forma ampla, envolvendo setores mais atrasados da agricultura familiar e como instrumento decisivo de inclusão social. Existem falhas na comercialização, como a falta de contratos de longo prazo, a existência de desperdícios na logística de transporte e manipulação dos produtos do campo às prateleiras de venda, assim como é preciso maior ajuste da produção à demanda internacional e no próprio país, onde se incluem os produtos orgânicos, em rápida expansão em todo o planeta.

Maior área – Apesar de dispor do maior potencial de área agricultável do planeta, o que permite respostas positivas em produtividade só comparada à dos Estados Unidos – um exemplo evidente é o caso da soja que, com a política de incentivo saltou do patamar de milhares para milhões de toneladas em apenas 20 anos –, o Brasil continua atrasado no processo de agregação de valor ao produto rural . O secretário da Agricultura critica o retrocesso que significa as exportações brasileiras continuarem ancoradas no produto primário (veja tabela).

“O Brasil exporta o café verde pelo porto de Santos há séculos, enquanto os Estados Unidos e Alemanha, grandes importadores do grão, são os maiores exportadores de café industrializado da atualidade. O mesmo ocorre com o couro bovino versus o sapato ou o açúcar, que têm a indústria mais eficiente do mundo, mas mantêm suas vendas externas no mesmo padrão de quando começou, em 1540, em Pernambuco”.

Ao mesmo tempo em que não dispõe de uma política governamental de incentivos de valor agregado, Meirelles ressalta que o exportador brasileiro enfrenta uma concorrência internacional altamente subsidiada, o que sufoca a balança comercial do terceiro mundo. Diante de um quadro de quase US$ 1 bilhão por dia de subsídios nos 29 países mais ricos, o ponto central da discussão do governo deve ser uma política concreta de enfrentamento neste mercado, conforme o secretário.

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A identificação da origem

O mercado internacional é seletivo, exige qualidade e, para isso, o produtor brasileiro, além de ajustar seu cultivo a tais demandas, deve dispor de um processo de qualidade com rastreabilidade. “Esta é a exigência do mercado mais qualificado daqui para diante: a Europa quer saber se foi utilizado agrotóxico no cultivo, se foi usada semente geneticamente modificada, se houve trabalho infantil no processo”, ressalta o secretário-adjunto da Secretaria Lourival Carmo Monaco.

A identificação de origem é uma estratégia que o agricultor deve perseguir para conseguir melhores preços, defende Rubens Mandetta, assessor técnico da Secretaria Estadual de Agricultura. Ele assinala que existem hábitos regionais de compra e é fundamental a busca da praticidade de alimentos preparados, semi-elaborados, para atender exigências urbanas. A rede varejista de certa forma participou deste movimento, ao exigir qualidade dos produtos hortícolas, mas vem pecando por não cumprir compromissos e se pautar pelo item preço na hora de suas grandes aquisições, aponta Mandetta. “Embora o varejo esteja cada vez mais preocupado com a qualidade e aparência dos produtos, ainda existem grandes perdas na cadeia do consumo, desde o transporte a granel, a conservação e o sistema de refrigeração, assim como ausência de logística interna das lojas”, acrescenta.

Mandetta defende a modernização na distribuição como forma de evitar perdas e preservar a qualidade do produto. Para isso, o varejo precisaria trabalhar com maior número de entregas diárias, agrupar produtos na distribuição, terceirizar vendas às grandes redes e modernizar a logística de manuseio interno e externo dos produtos perecíveis. Ele acrescenta que a diversificação de produtos é outro fator a ser considerado pelo agricultor. Informa que nos Estados Unidos, até 1975, existiam 65 variedades de hortaliças; hoje, elas superam 400, com diferenciação na cor, tamanho e natureza do cultivo, sejam hidropônicas ou orgânicas.

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As vantagens
competitivas do Brasil

Ademar Ribeiro Romeiro, chefe do Centro de Monitoramento Ambiental da Embrapa, assinala que o cultivo de arroz no Japão custa dez vezes mais do que na Coréia ou Vietnã, mas a produção interna é considerada estratégica. A China produz 500 milhões de toneladas de grãos e enfrenta estresse muito grande das áreas de produção e poderá se transformar em grande importadora, alavancando os preços internacionais. Diante deste quadro, o Brasil tem boa posição neste mercado. A área bovina, por exemplo, com o maior rebanho de corte do planeta, é privilegiada, pois a maior parte vive de pastagens, o que o isenta do risco da “vaca louca”.

Tais vantagens competitivas, no entanto, não eliminam questões sociais urgentes de serem atendidas. Na opinião de Romeiro, o problema agrário brasileiro de acesso à terra teve sua última chance de ser resolvido nos anos 60. “Deveria ter ocorrido antes da aceleração industrial e permitiria um perfil de crescimento totalmente diferente, sem tanta concentração de renda. Portanto, o desastre está feito e a política agrária só pode atenuar esses problemas”. Ele defende a necessidade de uma nova política agrícola que inclua a agricultura familiar de forma prioritária.

O Brasil tem área suficiente para acomodar a demanda social de ocupacão no campo e, além da inclusão social, pode ser eficiente na exportação. Para isso, precisa identificar filões de mercado como o de produtos orgânicos – o segmento de agricultura ecológica no Brasil ocupa apenas 2% da área total plantada. “Não há contradição entre aumento de competitividade e a política de inclusão social e de cuidados ambientais. Este, inclusive, é um nicho de mercado com as maiores taxas de crescimento”, diz Romeiro.

Para o secretário João Carlos Meirelles, o setor de agronegócios é aquele com maior potencial para gerar emprego rapidamente. Para cada R$ 1 milhão de vendas adicionais, é a agropecuária que mais reverte renda em empregos: a indústria de equipamentos eletrônicos gera 63 novos postos; a de veículos, 69; a construção civil emprega mais 99 trabalhadores; o comércio, 131; e a agropecuária é responsável por 187 novos empregos.

 

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