Entre exportar e morrer Frase
de FHC transforma-se em mote do debate entre especialistas sobre mercados
comuns Exportar
ou morrer! Ao parafrasear D. Pedro I, o presidente Fernando Henrique Cardoso provocou
a polêmica entre os especialistas em globalização e comércio
internacional, já que, com as economias em desaceleração
nos principais países importadores e as barreiras protecionistas em vigor,
fica difícil escapar da segunda alternativa. Não se sabe a
quem esta frase foi dirigida: se aos empresários ou à população,
declarou durante a Cientec o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, ex-diretor
de Relações Internacionais do Itamaraty, que acaba de ser dispensado
do cargo.
Guimarães
é um crítico do atual governo, no que se refere ao entusiasmo em
firmar alianças comerciais que considera de resultado duvidoso. Uma delas
é a Alca, que o embaixador vê como uma iniciativa sob controle e
interesse dos Estados Unidos e não dos demais integrantes. Os aspectos
negativos da Alca vão além das barreiras tarifárias, pois
interfere nas políticas de financiamento dos países envolvidos,
até na gestão do meio ambiente. Tende a ser uma extensão
do Nafta à América Latina, esperando obter ainda maiores concessões.
O ex-diretor do Itamaraty considera que a área englobada pela Alca é
um ambiente heterogêneo, com 34 países assimétricos, onde
apenas os EUA detêm um PIB equivalente ao de 80% da região. O Brasil,
segundo este ranking, possui 50% do PIB da América Latina, excluindo o
México.
Diante
deste quadro desigual, a tendência é de os norte-americanos atraírem
a maior parte dos investimentos, para uma gestão e distribuição
dentro de sua lógica aos demais membros, o que representa um sério
risco para os países mais pobres. De acordo com o embaixador, aceitar tais
condições significa, para o Brasil, abrir mão de definir
sua política comercial, industrial e tecnológica. O país
precisa ter políticas ativas de desenvolvimento e a Alca retiraria sua
independência.
Guimarães
assinala duas características singulares do Brasil, que são as
extraordinárias disparidades e vulnerabilidade externa, além de
uma vulnerabilidade ideológica inacreditável!. O embaixador
acrescenta: Talvez seja o único país no planeta que tem estrangeiro
com coluna diária na mídia, dando palpite sobre os rumos, e onde
tais palpites viram verdade absoluta para o governo e a opinião pública.
Samuel
Guimarães analisa a situação atual como sendo de uma crise
singular, resultado de um modelo econômico que reduziu investimentos sociais
e de infra-estrutura, revelando um grau de incompetência técnica
extraordinária. Em sua opinião, o Brasil precisa retomar a
idéia de desenvolvimento e o Estado atuar como alavanca. A crise energética
é um sinalizador, segundo o embaixador, pois evidencia uma característica
óbvia da empresa privada, que só decide se investe ou não
diante da certeza do lucro. Para José Ripper, diretor-presidente da
AsGa Eletrônica, existe um desequilíbrio adicional na Alca, que é
o de a legislação norte-americana pretender se sobrepor a qualquer
lei do próprio acordo. Os Estados Unidos não respeitam acordos
que coloquem sua economia ou suas empresas em desvantagem, relembra Ripper. --------------- Ministro
do STF vê ameaças iminentes Não
nos interessam modelos importados e é importante lembrar, sempre, que todas
as organizações internacionais estão a serviço dos
governos dos países centrais, acusa o ministro do Superior Tribunal
Militar Sérgio Xavier Ferolla. Ele não poupa ataques a atitudes
do atual governo que considera subservientes e ameaças iminentes: o acordo
de uso da base de Alcântara (MA) pelos Estados Unidos, em condições
inaceitáveis que afetam a autonomia sobre o território
nacional e a pesquisa tecnológica espacial brasileira; e a inserção
na Alca. O
governo Bush acaba de dar US$ 30 bilhões aos seus produtores de soja,
ilustra Ferolla. Diante de tal subsídio explícito, as nossas exportações
do produto ficam comprometidas, argumenta. O ministro do STM lembra que os EUA
obrigaram o Brasil a fabricar um foguete 100% nacional porque bloquearam todas
as compras de componentes necessários no exterior. Empresas alemãs
foram proibidas de atender as encomendas brasileiras, revela. Ele lembra
que o governo norte-americano também tentou impedir a construção
do avião Bandeirante na época que o ministro estava à frente
da Embraer.
É
importante reforçar que programa espacial puxa tecnologia e temos casos
recentes, nos bons tempos do BNDES, que financiou tecnologia de ações
especiais alavancando a criação de empresas como a Eletrometal,
hoje indústria de ponta na área, mas infelizmente se desnacionalizou
por pressão da globalização. Sérgio Ferolla
acredita que o país tem condições e deve fazer o melhor em
suas áreas de competência, seja na de tecnologia espacial ou agrícola.
Mas não pode pretender fazer tudo. --------------------- Ilhas
de excelência no mar de mediocridade
Para
o economista Otaviano Canuto, da Unicamp, o Brasil é um país que
convive com contrastes como exportação de alta tecnologia da Embraer
versus venda externa de grãos com baixo valor agregado. Mesmo no Projeto
Genoma, em que a pesquisa brasileira demonstrou estar no nível dos países
de ponta, dificilmente conseguirá capacitação para exportar
biotecnologia, que será mais utilizada no exterior que no próprio
país. As descobertas devem virar matriz de produtos rentáveis
lá fora, prevê Canuto. Ele acrescenta que nossas ilhas de excelência,
que nada devem às do Primeiro Mundo, são insuficientes para gerar
melhoria concreta nos indicadores sociais de renda, educação e mercado
de trabalho. O
Brasil tem 5 mil doutores, o que o aproxima de Canadá, Itália, Suíça,
China e Coréia do Sul, mas sofre uma grave drenagem desses cérebros,
absorvidos pelos países avançados, acrescenta o professor
da Unicamp. Ele informa que, embora apresente um baixo número de registros
de patentes, mesmo assim o país apresentou um crescimento de 80% nos últimos
três anos, o que demonstra uma movimentação nesta área
. Mas ainda é uma situação insignificante, que não
resiste à comparação com outros países. No Japão,
por exemplo, existem 500 patentes por milhão de habitantes; no Brasil,
são apenas duas por milhão.
Já
na experiência de incubação de empresas, fórmula de
sucesso aplicada em todos os países asiáticos em desenvolvimento,
o Brasil ocupa o quarto lugar. Existem hoje 180 incubadoras brasileiras, com uma
taxa de crescimento de 30% ao ano. O desafio é aproximar as ilhas
de excelência, que são poucas e de forte concentração
regional e social, do mar de mediocridade tecnológica existente nas empresas
brasileiras. Para Canuto, tecnologia é uma questão prática,
que deve interferir diretamente nos meios de produção. Não
pode ficar presa dentro das universidades; precisa ser incorporada às empresas. |
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