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POPULAÇÃO E VIDA

 

Clichês da xenofobia
Apesar da intolerância contra o migrante,
ele não merece ser o bode expiatório pelo desemprego

Os migrantes estão longe de ser os vilões das regiões metropolitanas, conforme pregam os clichês da xenofobia, da intolerância e do discurso político. Esse é o eixo central da pesquisa feita pelo sociólogo José Marcos Pinto da Cunha, do Núcleo de Estudos da População (Nepo) e por Cláudio Dedecca, professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp. Os números do levantamento, revelados por Cunha durante o debate “Migrações e Emprego nas Regiões Metropolitanas”, durante a Cientec, questionam claramente a posição corrente e comprovam que a questão é muito mais complexa, sobretudo no que diz respeito ao papel do migrante no mercado de trabalho.


“A tendência é sempre mostrar, iclusive na região de Campinas, que um dos culpados pelo desemprego é o migrante. No Nepo, tentamos esclarecer que a migração não é o motivo, mas sim o resultado do conjunto de desigualdades e desencontros que ocorrem na sociedade”, alertou Cunha, já no início de sua apresentação.
O trabalho não fecha os olhos para as saídas de grandes contingentes de migrantes das regiões metropolitanas, sobretudo da Grande São Paulo, mas leva em conta, segundo o pesquisador, o “fetiche” que a metrópole ainda desperta naqueles que ficam seduzidos com a promessa de uma vida melhor. Cunha Pinto lembra que a migração de retorno não significa necessariamente a perda de atração, mas sim a incapacidade de retenção e inserção da população, fenômeno diferente do registrado nos anos 60 e 70, época em que grandes grupos de pessoas de outros Estados desembarcaram em São Paulo em busca do eldorado.

Segundo Cunha, a “grande profissão de fé” desse trabalho é que o migrante não pode ser considerado o bode expiatório. O levantamento revela que as taxas de crescimento do desemprego na Grande São Paulo da população migrante recente são de 1% ao ano, enquanto no caso da população não-migrante está em 8% ao ano, comprovando que a falta de contrato na carteira de trabalho está afetando muito mais a população não-migrante do que aqueles que vêm de fora, particularmente os recém-chegados.

A pesquisa mostra ainda que o aumento da disponibilidade da força de trabalho metropolitana, nos anos 90, não pode ser atribuído ao migrante, invariavelmente acusado de “empurrar” a oferta no mercado. “Revela também que, se por um lado constatamos que os migrantes recentes estão desempregados em maior número em termos percentuais – em 92, eles eram 11%, contra 6,5% dos não-migrantes –, a gente olha para 1998 e eles continuam estabilizados (12%), enquanto entre os não-migrantes esse desemprego cresce (quase 10%)”, pondera Cunha. Os números não deixam dúvidas de que o crescimento do desemprego se dá muito mais entre os não-migrantes.

Piores lugares – O levantamento mostra aonde se inserem os migrantes: invariavelmente nas piores posições no mercado de trabalho e da estrutura ocupacional da região metropolitana. Não é à-toa que o fenômeno coincide, por exemplo, com aqueles verificados nos estudos feitos sobre imigração internacional. São empregos, conforme observa Cunha, dos quais a população nativa quer distância. “A menor possibilidade de os migrantes se manterem desempregados, por várias condições, faz com que eles se submetam a todos os tipos de tarefas”.

O sociólogo conclui que, embora o ritmo do crescimento demográfico na região metropolitana tenha diminuído, as grandes cidades ainda são a maior porta de entrada dos migrantes interestaduais no território paulista. A continuidade da migração nordestina, a redução da mineira e da paranaense, e o aumento do retorno são, na verdade, as novas faces da configuração regional.

Normalmente a visão preconceituosa sobre os efeitos da migração no mercado de trabalho subestima a importância do fenômeno migratório na constituição da força de trabalho, pondera Cunha. “Todos os dados mostram que a migração, particularmente a recente, não parece ser a responsável pelos problemas de desemprego na região metropolitana. A migração tem um impacto muito pequeno nesse contexto. Além disso, a inserção do migrante é sempre mais precária, com níveis de proteção muito baixos”, observa Cunha.

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Rede de proteção para quem quer trabalhar

O agravamento da situação do desemprego tem a ver com as transformações do aparelho produtivo e da inadequação da força de trabalho para a nova realidade das empresas, mas está muito mais relacionado com as baixas taxas de crescimento da economia. O diagnóstico foi feito no debate “Migrações e Emprego nas Regiões Metropolitanas”, durante a Cientec, pelo economista Walter Barelli, secretário de Emprego e Relações de Trabalho do Estado de São Paulo.

Para Barelli, o atual cenário “reforça a impetuosidade de um sistema público de emprego, composto de um conjunto de políticas que consigam não só refletir as realidades multifacetadas e a heterogeneidade do nosso mercado de trabalho, mas que se constituam numa rede de proteção e de promoção do indivíduo que queira trabalhar”.

Apesar de afirmar que ainda faltam elementos para que seja feita uma avaliação mais precisa dos efeitos e impactos das mudanças ocorridas na década de 90, no movimento de redefinição das atividades econômicas, na geração de oportunidades e nos movimentos migratórios, Barelli diz ter algumas pistas.

Para o secretário, os impactos das novas tecnologias e das novas formas de organização do trabalho foram grandes para o desenho de um novo cenário no país. Barelli acrescentou a esses fatores a abertura da economia, as privatizações e a intensificação do processo de desconcentração da atividade da atividade industrial.

Com base nas pesquisas domiciliares anuais (PNAD’s), Barelli citou alguns exemplos dessa nova configuração. Tomando-se como base 10 Estados e suas respectivas regiões metropolitanas e comparando-se as PNAD’s de 1992 e 1999, Belo Horizonte, Curitiba e Salvador apresentaram os melhores desempenhos.

Na região metropolitana de Belo Horizonte, a PEA (População Economicamente Ativa) aumentou em 26,1% entre 1992 e 1999. Em Curitiba, essa variação foi de 32,9%, enquanto em Salvador o aumento foi de 30,4%. Barelli citou como contraponto do mesmo período pesquisado, a PEA das regiões metropolitanas de São Paulo (15,4%), Rio de Janeiro (8,6%), Porto Alegre (10,8%) e Belém (4,7%).

 

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