9 a 15 de setembro de 2002
Jornais anteriores
Unicamp Hoje
PDF
Acrobat Reader
Unicamp
3
Capa
Cátedra
CNPq
Capuaçú
Planejamento urbano
Jornalismo on-line
Laser
Administração
Na Imprensa
Bactéria
Síndrome de Down
Embalagem
ProvaNet
Sérgio Buarque
Cinema
Nutrição
Futsal
Vida Acadêmica
Roberto Ventura
Opus 18
Origem da Vida
 
O pesquisador Sidney Chalhoub: "Estamos com muita dificuldade para concluir o trabalho"Pesquisadores
reagem a cortes
no CNPq

Governo promete à SBPC "restabelecer as funções vitais" da principal agência nacional de fomento à pesquisa

CLAYTON LEVY

Menos de uma semana após a divulgação de dois manifestos contra os cortes no repasse de verbas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o governo federal deu sinais de que estaria disposto a evitar um colapso no andamento de projetos aprovados pelo Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex) e Instituto do Milênio. Durante toda a semana passada houve intensas negociações em Brasília para reverter o contingenciamento de verbas na principal agência de fomento à pesquisa no País, que teve 45% de seu orçamento previsto para esse ano cortado pelo governo. A expectativa cresceu na última quarta-feira, quando o presidente FHC teria se reunido com a equipe econômica para discutir a restauração da capacidade financeira do CNPq. Até o fechamento dessa edição, porém, nenhuma medida prática havia sido anunciada.

Levantamento do próprio CNPq revela que diminuíram gradativamente, nos últimos seis anos, os investimentos em pesquisa nas universidades paulistas (veja gráfico nesta página). Os cortes deixaram apreensivos os coordenadores dos 17 projetos de pesquisa em andamento na Unicamp financiados com verbas do Pronex e Instituto do Milênio.

"Certamente haverá atraso na conclusão do nosso trabalho", disse o pesquisador Jacobus Swart, coordenador de um projeto para desenvolvimento de tecnologia para fabricação de microsensores e circuitos integrados eletrônicos. O trabalho, desenvolvido no Centro de Componentes Semicondutores da Faculdade de Engenharia Elétrica, interessa diretamente à indústria eletrônica nacional, que depende de inovação tecnológica para ser competitiva . A conclusão da pesquisa estava prevista para 2004, mas com o corte nas verbas esse prazo, segundo o coordenador, terá de ser revisto.

O professor Jacobus Swart: sem dinheiro, equipe não consegue adquirir material de trabalhoO projeto, no valor de R$ 4,3 milhões, envolve sete universidades e foi aprovado em dezembro pelo CNPq, via Instituto do Milênio. Segundo o professor Swart, a parte que cabe à Unicamp gira em torno de R$ 1 milhão, que deveria chegar em parcelas anuais. Até agora, porém, apenas a primeira parcela, repassada em janeiro, chegou integralmente. A segunda, enviada em julho, foi reduzida a apenas 10% do valor normal. A verba prevista para 2001 e 2002 deveria somar R$ 632 mil, mas foram repassados apenas R$ 420 mil, segundo o coordenador. Sem dinheiro, a equipe não está conseguindo comprar equipamentos e materiais necessários ao trabalho.

"Estamos com muita dificuldade para concluir o trabalho", disse o pesquisador Sidney Chalhoub, que coordena uma pesquisa sobre diversidade cultural no Brasil, em curso no Centro de Pesquisa em História Social da Cultura (Cecult), ligado ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). O estudo deveria ser concluído esse ano, mas com os cortes nas verbas a situação está indefinida. "O Pronex funcionou muito bem até o ano passado, mas de lá para cá, o dinheiro escasseou", conta o pesquisador.

O contrato com o Pronex, assinado em 2001, prevê o repasse de R$ 390,6 mil, divididos em parcelas anuais, e envolve outras três universidades além da Unicamp. "Em 2001 recebemos dois terços do valor e este ano ainda não recebemos nada", diz Chalhoub. O dinheiro, segundo o pesquisador, vinha sendo aplicado principalmente na compra de fontes históricas, como jornais do século 19 microfilmados pela Biblioteca Nacional. "O trabalho tem grande interesse histórico", afirma.

Chalhoub ajudou a redigir a "Carta Aberta ao à Presidência da República e ao Ministério da Ciência e Tecnologia", um dos dois manifestos da comunidade cientifica que circularam na semana passada protestando contra os cortes no CNPq. O documento, que aponta o "sério comprometimento da capacidade instalada de produção de ciência", obteve adesão de 121 pesquisadores em todo o País. O outro manifesto, divulgado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), diz que os cortes, "além de gerar forte desestímulo a uma atividade essencial, já provoca danos inestimáveis a uma série de programas e projetos".

Até a semana passada, o texto já havia obtido adesão de 670 pesquisadores. Acompanhada de carta firmada pela presidente da SBPC, Glaci Zancan, o manifesto foi remetido na última terça-feira aos ministros da Casa Civil, Pedro Parente, da C&T, Ronaldo Sardemberg, do Planejamento, Guilherme Dias, e da Fazenda, Pedro Malan.

A presidente do SBPC, Glaci Zancan, chegou a discutir o problema com o presidente Fernando Henrique Cardoso, no dia 9 de agosto. Na ocasião, o presidente, segundo Glaci, disse que "faria o possível". Até a última terça-feira, porém, a situação continuava inalterada.

Atento à preocupação da comunidade científica, o presidente do CNPq, Esper Cavalheiro, tem enfrentado uma maratona de reuniões para tentar solucionar o impasse. No dia 22 de agosto, após reunir-se com a diretoria do CNPq, foi ao encontro do ministro da Ciência e Tecnologia (MCT), Ronaldo Sardemberg, mas o quad

ro não se alterou. No último dia 02, o presidente do CNPq reuniu-se com o secretário executivo do MCT, Américo Pacheco, mas também retornou sem solução. Enquanto isso, pesquisadores do Pronex e Instituto do Milênio se vêem sem opções. "Esperamos que a situação se reverta e tudo volte ao normal o mais rápido possível", disse o professor Swart.

Íntegra do manifesto divulgado pela SBPC

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com mais de 50 anos de relevantes serviços prestados ao Brasil numa área estratégica, está praticamente paralisado por falta de recursos financeiros.

Este fato lamentável, além de gerar forte desestímulo a uma atividade absolutamente essencial, já provoca danos inestimáveis a uma série de programas e projetos de vital

importância para o avanço da ciência e tecnologia no país, e para a imprescindível formação de novas gerações de pesquisadores.

Em recente audiência especial concedida aos presidentes da SBPC, Glaci Zancan, e da Academia Brasileira de Ciências, Eduardo Krieger, o presidente Fernando Henrique Cardoso, sensível à gravíssima situação por que passa o CNPq, prometeu fazer tudo o que estiver a seu alcance para contornar a crise e restabelecer as funções vitais de nossa principal agência nacional de fomento à pesquisa em C&T.

Na solenidade de outorga da Ordem Nacional do Mérito Científico, no dia 15 de agosto, o presidente declarou publicamente que estava determinando a liberação do fluxo contínuo do CNPq. Os cientistas, conscientes de sua alta responsabilidade nesta hora decisiva, formulam um apelo veemente para que a promessa do mais alto dignatário da nação seja rigorosamente concretizada e que as atividades do CNPq retornem à normalidade com toda a presteza possível.