192 - ANO XVII - 30 de setembro a 6 de outubro de 2002
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O professor Geraldo Di Giovanni: norteando políticas públicasNas ruas, mas com tutela

Crianças que trabalham em cruzamento freqüentam escola, têm casa e ajudam a família

ROBERTO COSTA

Campinas, como toda grande metrópole, possui crianças pelas ruas vendendo balas, limpando pára-brisa de carros ou realizando outros pequenos serviços. Pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (Nepp) da Unicamp mostra que, ao contrário do que se dizia, a grande maioria tem casa, estuda e não é influenciada por terceiros para lhes garantir renda. São crianças sempre vigiadas pelos pais ou amigos maiores que vão para os cruzamentos atrás de sustento, fruto da migração de famílias de outros estados para Campinas, fenômeno ocorrido basicamente nos anos 80. O trabalho do Nepp, que norteou políticas públicas pela Prefeitura de Campinas, acaba de se transformar em livro e pode, em breve, ganhar um novo levantamento de campo que abrangeria a Região Metropolitana de Campinas.

Criança vende doces em avenida na região central de Campinas: pesquisa desenvolvida pelo Nepp derruba mitosTrabalho infantil em Campinas, sob a coordenação do sociólogo Geraldo Di Giovanni, professor do Instituto de Economia (IE) e coordenador do Nepp, faz parte da "Coleção Pesquisas", editada pelo IE. Foi lançado no último dia 23, no Salão Vermelho da Prefeitura e traz em 259 páginas gráficos, metodologias e conclusões do trabalho que envolveram 12 pesquisadores em 40 dias de trabalho de campo, realizado no final do ano passado. O grupo abordou 252 crianças em 13 pontos de concentração na região central de Campinas. Levantou, ainda, informações de onde, como e com quem vivem, visitando suas casas.

Das crianças alcançadas pelo trabalho do Nepp, 171 moram em Campinas, o grupo-alvo, o que representa 67,9% da amostragem. Hortolândia e Monte Mor, cidades da Região Metropolitana, mandam suas crianças para as ruas de Campinas na ordem de 18,7% e 9,5 %, respectivamente. Quase a metade (42,3%) vende balas nas grandes avenidas, vindo a seguir outros serviços na rua, entre eles a distribuição de panfletos. As crianças e adolescentes, entretanto, não permanecem muito tempo nos "locais de trabalho". De acordo com o levantamento, 18,1% admitiram trabalhar todos os dias. Um ou dois dias trabalhados juntos representam quase a metade do levantamento. Em média as crianças permanecem meio período na rua e meio na escola. Nas salas de aula está o maior problema. Apenas 21 crianças (16,7%) se encontram na série ideal. As demais estão em defasagem, que vão de um a cinco anos.

"Parece que tem muita criança na rua", comenta Giovanni. "Não é bem isso. Elas se mexem muito, parecendo o ataque do São Caetano", compara. Mas essa movimentação constante não representa muito em dinheiro. 51 das 171 crianças pesquisadas revelaram que recebem entre 6 e 10 reais por dia e outras 35, entre 11 e 15 reais. São 48 famílias que, mesmo com a ajuda do trabalho infantil, sobrevivem com meio e um salário mínimo. Outras 31 conseguem entre 1/4 e meio salário. As crianças trabalhadoras colaboram nesse bolo. 30,1% são responsáveis por 5% da renda familiar e outros 20,4% levam 10 a 20% da renda do trabalho nas ruas. Apenas um entre quatro pais ou responsáveis pela família tem carteira assinada. Por fim a amostragem do Nepp esclarece como é feita a migração para Campinas. 17,2 % dos pais nasceram na cidade, mas a maioria (82,8%) vem de fora. São 38,8% do Estado de São Paulo e 29,4% divididos por Minas Gerais e Paraná.

Estudo ancorou programa

O trabalho da Unicamp foi fundamental para que a Prefeitura de Campinas pudesse encaminhar ajuda para 67 das 171 crianças pesquisadas pelo Nepp e que moram em Campinas. De acordo com a psicóloga Ana Vitória Galvão Bacchetto, da Prefeitura e técnica do Programa de Erradicação no Trabalho Infantil (Peti), o governo municipal repassa verbas federais de 40 reais por criança atendida e complementa o valor, totalizando 180 reais por família. A ajuda financeira vem sendo entregue às famílias desde maio deste ano.

Para ter direito ao benefício, as crianças precisam estar estudando e participar da jornada ampliada, que é realizada em cinco núcleos comunitários de crianças e adolescentes mantidos pela Prefeitura e em outras 12 Organizações não-governamentais (Ongs). Apesar de receber do governo federal apenas 10 reais para manter as crianças no Peti, a Prefeitura complementa as escolas e Ongs do programa com 150 reais por criança e 75 por família atendida. Ana Vitória informa que 70% das crianças atendidas pelo Peti têm freqüência muito boa na jornada ampliada.