CLAYTON
LEVY
|
A
senadora Heloísa Helena, que participou de
debate sobre a reforma da previdência no auditório
da Adunicamp: “Batalha ainda não está perdida” |
Ameaçada
de expulsão pelo Partido dos Trabalhadores
por ser contra a reforma da previdência,
a senadora Heloísa Helena (PT-AL) está
pronta para enfrentar o governo e grande parte
de seus correligionários no Senado Federal,
onde a matéria deverá ser votada
até o final de setembro. Para ela, embora
a proposta governista tenha sido aprovada com
facilidade na Câmara dos Deputados, a
batalha ainda não está perdida
e alguns pontos poderão ser alterados,
dependendo da correlação de forças
na Casa. Sejam quais forem essas correlações,
Heloísa Helena já adianta que lutará
para mudar aspectos importantes para o funcionalismo
público, como a regra de transição
e a paridade das aposentadorias.
Apesar
de algumas lideranças do governo terem
alardeado para a opinião pública
que nada irá mudar, existem muitos senadores
que estão dispostos a fazer as modificações
necessárias, garantiu a senadora,
que na última sexta-feira atraiu um público
que lotou o auditório da Associação
dos Docentes da Unicamp (Adunicamp) para debater
a reforma. O que nós tentaremos fazer
é garantir os votos necessários
para alterar essa cantilena enfadonha que é
a proposta de reforma apresentada pelo governo,
disse.
A senadora
disse que pretende apresentar emendas para pontos
que afetam trabalhadores da iniciativa privada
e do setor público. Um ponto que preocupa
a parlamentar é a regra de transição
para servidores públicos. Precisamos
impedir que aqueles que já têm seus
direitos assegurados sejam obrigados a trabalhar
mais sete anos para não sofrer uma perda
de até 35% nos seus salários.
Outro ponto criticado pela senadora é a
taxação de inativos.
Inclusão
Heloísa Helena também defende mudanças
nos pontos que afetam os trabalhadores da iniciativa
privada. Vamos apresentar propostas concretas
para a inclusão dos 44 milhões de
excluídos no País, disse.
Segundo ela, um grande número de pessoas
entra mais cedo no mercado de trabalho em condições
desumanas e não têm acesso ao direito
previdenciário. Quando têm,
em função da reforma na previdência,
serão obrigados a trabalhar mais dez anos
para não ter um corte de até 45%
em sua aposentadoria, criticou.
Por ter sido excluída
da Comissão de Justiça, Heloísa
Helena precisará obter a assinatura de
22 senadores para apresentar cada emenda. Por
essa razão, a senadora adotou uma estratégia
cautelosa. Só vou apresentar as minhas
emendas com as respectivas assinaturas na última
hora permitida pelo regimento, disse. Segundo
ela, isso tem como objetivo evitar que o governo
faça pressão sobre os parlamentares.
Temos a experiência de casos em que,
mesmo depois de terem assinado determinadas proposições,
eles retiram suas assinaturas e a proposição
cai.
A vitória do governo na Câmara dos
Deputados não arrefeceu o ânimo da
senadora, que desde o início se posicionou
contra a reforma. Como o Senado é
uma casa mais conservadora, os movimentos sociais
acham que, se a matéria foi aprovada pela
Câmara, a causa já está perdida.
Acho que não deve ser assim, defende.
A partida está zerada; podemos ganhar
ou perder, diz. Em sua opinião, os
senadores têm o dever constitucional de
promover o debate sobre o tema. Se o Senado
se predispõe a comportar-se como um medíocre
anexo arquitetônico do Palácio do
Planalto, então é melhor fechar
as portas.
Embora admita que na atual
correlação de forças o governo
leve uma certa vantagem, Heloísa Helena
ainda tem esperanças de convencer um número
suficiente de parlamentares para promover mudanças
no texto. Mas, ainda uma vez, ela prefere agir
com cautela. Não podemos sinalizar
os senadores que a gente acha que poderão
votar pelas alterações, porque senão
o governo sai na frente com um poder de pressão
muito maior e acaba tirando o possível
voto que nós teremos, argumenta.
Ela garante, porém, que já existem
parlamentares no Senado que já teriam demonstrado
a possibilidade de votar algumas alterações.
Na base governista,
muitos votam no cabresto, mas há alguns
em quem temos notado uma mudança, mesmo
entre a chamada base aliada, disse. Segundo
ela, esses parlamentares estariam sensíveis
a mudanças como, por exemplo, a retirada
da taxação para inativos. Ao mesmo
tempo, Heloísa Helena receia que muitos
parlamentares podem sinalizar com votos a favor
das alterações simplesmente como
um instrumento de barganha para conseguirem o
que efetivamente querem. É assim
que funciona.
Fiel ao estilo que a consagrou
entre os movimentos populares e de trabalhadores,
Heloísa Helena defende uma ampla mobilização
popular para alterar os pontos que considera negativos
na reforma. No Senado isso fica mais fácil
do que na Câmara, porque cada estado tem
apenas três senadores, acredita. É
mais fácil infernizar a vida de três
pessoas do que de toda uma bancada de deputados
federais, completa.
A senadora defende uma pressão
específica do eleitorado sobre os três
senadores de seus respectivos estados. Devemos
chamá-los para que eles façam o
debate no terreno do eleitorado, porque o debate
no tapete azul do Senado é muito fácil,
diz. Temos de fazer uma mobilização
organizada, firme e diária. Para
Heloísa Helena, existem muitos parlamentares
que pressionados por suas consciências
ou por seus eleitores, poderão trabalhar
as alterações necessárias.
Ao criticar a proposta do
governo, Heloísa Helena diz que um grande
volume de recursos será transferido para
o mercado financeiro. Já aumentou
em mais de 70% a venda de seguros privados de
aposentadoria por causa da instabilidade jurídica
criada em torno do tema, disse. As
seguradoras já estão ganhando só
com a instabilidade jurídica que o governo
está promovendo com a reforma da previdência.
Emoção
Ao falar sobre sua provável expulsão
do PT, a senadora não escondeu a emoção.
Depois de chamar o partido de santo ofício,
numa alusão aos tribunais da Inquisição
na Idade Média, ela agradeceu perante o
público aos correligionários que
assumiram sua defesa. Infelizmente, o nosso
partido, que nasceu fazendo a condenação
ao centralismo burocrático e, ao longo
de nossa história, sempre condenou com
veemência os partidos que se transformavam
em correias de transmissão de seus respectivos
governos, agora está fazendo o mesmo,
disse. O governo está em disputa
e o PT está em disputa.
A senadora garante, porém,
que se for expulsa não deixará a
militância política. Vou lutar
muito para que isso não aconteça,
mas, se acontecer, não vou morrer de saudades,
garante.