Disponibilidade de carotenóides
é insuficiente em regiões metropolitanas
Pesquisa mostra que substâncias presentes em alimentos
não são ingeridas em níveis satisfatórios
MANUEL ALVES FILHO
A disponibilidade de carotenóides nas regiões metropolitanas brasileiras não é suficiente para garantir à população a ingestão em níveis "prudentes" dessas substâncias que estão associadas à prevenção de doenças cardiovasculares, problemas de visão e câncer. A constatação faz parte da dissertação de mestrado de Renata Maria Padovani, apresentada à Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp e orientada pelo professor Jaime Amaya-Fárfan. Para conduzir a sua pesquisa, a nutricionista levou em consideração o "consumo" de alimentos por faixa de recebimentos (renda) de moradores de nove regiões metropolitanas e mais dois municípios. Os dados foram fornecidos pela Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nos anos de 1995 e 1996.
Carotenóides são pigmentos amplamente distribuídos na natureza, responsáveis pelas cores laranja, amarela e vermelha das frutas, tubérculos, flores, invertebrados, pescados e pássaros. Os carotenóides de maior expressão na dieta são o beta-caroteno, alfa-caroteno, beta-criptoxantina, luteína e licopeno. Embora as frutas, legumes e verduras sejam abundantes no Brasil, esses alimentos não são adquiridos nas quantidades desejáveis pelas famílias brasileiras, conforme constatou o estudo realizado por Renata. Ela ressalta, porém, que disponibilidade e consumo são termos diferentes. Isso porque a POF leva em conta apenas os alimentos comprados no domicílio. São desconsideradas, portanto, a produção própria (horta doméstica, por exemplo) e as refeições feitas no trabalho ou em restaurantes.
"Embora a POF não forneça dados finos, ela é uma vasta fonte alternativa para a investigação de consumo alimentar da população", explica a autora da dissertação. De acordo com ela, o IBGE disponibilizou para os anos em questão o consumo anual per capita de aproximadamente 200 alimentos diferentes, em 16 mil domicílios de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Brasília, Goiânia, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. O trabalho de Renata foi acessar essas informações, completá-las, processá-las e depois efetuar e interpretar os cálculos do consumo per capita dia.
Com base em dados nacionais e do United States Department of Agriculture (USDA), a nutricionista chegou ao volume de carotenóides disponíveis para a população alvo do levantamento. "De maneira geral, foi possível constatar que a disponibilidade dessas substâncias é baixa em todas as regiões pesquisadas", afirma. Segundo o estudo, as ingestões "prudentes" de 3 a 6 mg de beta-caroteno, de pró-vitamínicos A (de 5,2 a 6 mg) e de carotenóides totais (de 9 a 18 mg) não puderam ser alcançadas em qualquer das localidades investigadas, independente da faixa de renda.
Renata identificou, ainda, que a disponibilidade de carotenóides aumenta conforme a renda das famílias em todas as regiões. "Nos níveis de renda mais altos, acima dos 30 salários mínimos, a disponibilidade de carotenóides fica próxima da verificada nos países desenvolvidos", diz. Isso caracteriza uma ironia, segundo ela, pois mesmo o Brasil sendo tão rico em fontes desses nutrientes, provavelmente a sua população consome aquém do que seria razoável.
Renata também relacionou os alimentos que mais contribuem para a disponibilidade de carotenóides nas regiões pesquisadas. São eles: cenoura, abóbora, manga e tomate, como fornecedores de beta-caroteno; abóbora e cenoura (alfa-caroteno); laranja pêra e mamão (beta-criptoxantina); tomate, massa de tomate, melancia e mamão (licopeno) e fubá de milho, couve, alface e laranja pêra (luteína). A pesquisadora acredita que a pequena disponibilidade de carotenóides está diretamente relacionada à baixa renda das famílias.
No Brasil, analisa a nutricionista, dá-se ênfase à satisfação das necessidades energéticas ao invés de toda a gama de necessidades nutricionais. O conceito baseia-se em estudos anteriores, que indicavam que uma vez supridas as necessidades energéticas, as necessidades de outros nutrientes seriam automaticamente satisfeitas. A tendência, no momento, é revisar os conceitos a respeito de recomendações nutricionais, tendo como base a redução do risco de doenças crônicas não-transmissíveis, ao invés de atentar para o combate aos sinais de deficiência. "A alimentação balanceada, segundo os novos conceitos, traria enormes ganhos para o País, como a prevenção global de doenças. Pessoas corretamente nutridas ficam menos tempo enfermas, recorrem menos a hospitais, consomem menos remédios e são mais produtivas", afirma.