MANUEL ALVES FILHO
Três anos depois de ser criada, a Sinfônica Jovem de Campinas Unicamp está ultimando os ensaios para a gravação, ainda em setembro, do seu primeiro CD. O álbum, previsto para ser lançado em novembro, trará obras do compositor alemão naturalizado brasileiro Ernest Mahle, que reside em Piracicaba, cidade localizada a 70 quilômetros de Campinas. Entre as composições selecionadas está a peça “Festa no Céu”, baseada em um conto do escritor Monteiro Lobato, que será narrada pelo ator Heyttor Barsallini. O projeto do disco foi financiado pela Petrobras. De acordo com a maestrina e diretora artística da orquestra, Simone Menezes, a gravação do CD constitui uma etapa importante no processo de consolidação da Sinfônica Jovem. A escolha do compositor, afirma, é uma homenagem à história de vida de Ernest Mahle.
Em junho último, a orquestra realizou no teatro interno do Centro de Convivência Cultural de Campinas um concerto com as obras que serão gravadas. O espetáculo foi considerado um sucesso tanto pelo público quanto pela crítica. O próprio compositor, avaliando o trabalho após a apresentação, deu o seguinte depoimento: “é um prazer ter a minha obra gravada pela Orquestra Jovem. A qualidade do trabalho da maestrina é excelente, e só há elogios para se fazer à Orquestra”. Conforme Simone, a manifestação do compositor é uma certificação da qualidade do trabalho da Sinfônica Jovem. “É um grande estímulo para a carreira de todos os componentes da orquestra”, diz a maestrina.
Mahle não é o único a reservar elogios ao desempenho dos jovens músicos. De maneira geral, as críticas têm sido sempre favoráveis após cada concerto. O professor de violino Esdras Rodrigues, do Departamento de Música da Unicamp, afirmou recentemente que a performance do grupo assemelha-se à de uma orquestra profissional. Mas que não se pense que esse estágio é atingido facilmente. Ao contrário, a principal característica desses instrumentistas é a disciplina. Para conquistar destaque na carreira eles cumprem uma rotina de longos ensaios.
Além disso, estudam diariamente para conservar a qualidade do trabalho. “Nossos músicos são jovens que têm entre 15 e 25 anos e que estão se preparando para ingressar no mercado de trabalho. Nesta etapa, eles experimentam um desenvolvimento musical muito rápido, o que exige que sejam muito disciplinados”, explica Simone. Uma das funções da Sinfônica Jovem, prossegue a maestrina, é justamente essa: atuar na formação de músicos profissionais. Mas a orquestra tem uma outra missão, que é a de ajudar a criar um novo público para a música clássica. “Tudo o que se apresenta como diferente tem que ser introduzido de forma progressiva. Com a música sinfônica também é assim”, compara.
De acordo com Simone Menezes, os concertos da orquestra têm o objetivo didático de dar ao público uma visão mais abrangente do papel da música erudita na história da humanidade. Cada obra faz referência a um período, episódio ou realidade diferente. O público acaba descobrindo, por exemplo, o que é o barroco e em que contexto ele surgiu e se desenvolveu. As manifestações dos espectadores, acrescenta a maestrina, diferem de país para país, mas são sempre calorosas e/ou emocionais. Ela relata um episódio ocorrido com ela em Portugal, este ano. Simone regia um concerto numa catedral no mesmo dia em que foi anunciada a morte do papa João Paulo II. “A orquestra apresentava o ‘Prelúdio das Bachianas nº4’, de Villa Lobos, uma obra bastante melancólica. Ao final da peça, a comoção levou o público a permanecer em silêncio ao invés de se manifestar com o costumeiro aplauso. Foi possível notar na expressão das pessoas o alto grau de envolvimento com a música”.
Espaço acadêmico - A Sinfônica Jovem de Campinas - Unicamp foi criada em abril de 2002 com o objetivo de incentivar a formação de um novo público para a música clássica e proporcionar mais oportunidades aos jovens da região que desejam ingressar neste segmento. A orquestra, que já se apresentou em importantes espaços culturais da região, reúne 55 músicos com idade entre 15 e 25 anos, originados tanto da Universidade quanto de outras cidades e instituições do interior do Estado de São Paulo. Todos os integrantes recebem uma bolsa, obtida por meio de apoios e patrocínios da Unicamp e Petrobras. A Sinfônica está sob regência de Simone Menezes e mantém vínculo com o Núcleo de Integração e Difusão Cultural (Nidic) da Unicamp. Os ensaios ocorrem às terças e quintas-feiras, das 17h30 às 19h30, no Espaço Cultural Casa do Lago, no campus de Barão Geraldo.
Compositor fugiu dos horrores do nazismo
Ernest Mahle, hoje com 75 anos, nasceu na Alemanha, mas se transferiu para o Brasil fugindo dos horrores da Segunda Guerra. Radicado em Piracicaba há aproximadamente 40 anos, naturalizou-se brasileiro e criou a Escola de Música daquela cidade. O compositor foi influenciado pela obra de Bartók, cuja música emprega elementos do folclore e do modalismo. Ainda hoje, Mahle segue como diretor artístico, regente e professor da escola que fundou. Entre os discos gravados com a sua obra destacam-se: Obra Completa para Violino e Piano, CD SonoPress-Rimo, Trio para Flauta, CD Rioarte RD006, Carimbó: Suíte sobre Melodias Paraenses, CD A Música e o Pará, Suíte Nordestina, CD Música Brasileira I.
Maestrina graduou-se em
regência pela Unicamp
Natural de Brasília, Simone Menezes estudou piano e flauta. Graduou-se em regência pela Unicamp em 2002. Desenvolveu estudos de pós-graduação na área de análise de música do século 20. Tem estudado desde então com Henrique Gregori, Osvaldo Ferreira (Portugal) e Johannes Schalaefli (Suíça). Atuou como regente de diversos grupos, tais como Coral Municipal de Campinas, Coral do Centro Cultural Brasil-Estados Unidos, Orquestra Sinfônica da Unicamp, Orquestra da Ópera da Oficina de Música de Curitiba, Orquestra do 34° Festival de Inverno de Campos do Jordão, Orquestra Sinfônica da Póvoa (Portugal) e Karls University Symphonic Orchestra (República Tcheca). Lecionou harmonia por quatro anos no curso de música da Faculdade Teológica Batista de Campinas e, em 2003, venceu o Concurso de Regência da Unicamp, onde assumiu uma das vagas de maestrina da Universidade. Foi maestrina assistente da Orquestra Sinfônica da USP (OSUSP) na temporada de 2004. Tem atuado como diretora artística e maestrina da Orquestra Sinfônica Jovem da Unicamp desde 2002. Atualmente estuda com o maestro John Neschling. Na Unicamp, além das atividades com a orquestra, desenvolve diversos projetos musicais, como o Festival Internacional de Música da Unicamp. Também se dedica à pesquisa e gravação de obras de compositores contemporâneos brasileiros.
|