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CRISE

Manifesto pede rigor
nas investigações



Manifesto produzido por um grupo de intelectuais da Unicamp exige rigor nas investigações sobre a corrupção, “inclusive aquelas que apontem em direção à Presidência da República e possam redundar na instauração de um processo de impeachment [contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva]”. Intitulado Pela investigação rigorosa da corrupção, pela punição dos envolvidos e pela democracia, o documento foi subscrito por cerca de 150 intelectuais de todo o país, a maioria dos quais professores universitários. Estão entre os signatários: Francisco de Oliveira (USP), Muniz Ferreira (UFBa), Leda Paulani (USP), Carlos Eduardo Carvalho (PUC-SP), Reinaldo Carcanholo (UFES), Mário Maestri (UPF), Paulo Arantes (USP) e Laymert Garcia dos Santos (Unicamp).

Segundo um dos idealizadores do documento, professor Armando Boito (IFCH/Unicamp), “o manifesto aponta os limites da democracia brasileira, o vínculo dessa democracia restrita com o modelo econômico excludente e defende a apuração rigorosa e sem contemplação da corrupção com a punição de todos os culpados, considerando que isso faz parte da luta pela ampliação da democracia no Brasil. As investigações devem ir até o fim”. O próprio Boito promoverá o lançamento simbólico do manifesto no dia 20 próximo (terça-feira), no Auditório I do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, durante o debate “A esquerda e a crise política do governo Lula: que crise é essa”, do qual participarão também os economistas Plínio de Arruda Sampaio Jr. e Ricardo Carneiro, ambos docentes do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, e o jornalista Altamiro Borges (Revista Debate Sindical). O debate começa às 14 horas. Leia a íntegra do manifesto.

Pela investigação rigorosa
da corrupção, pela punição
dos envolvidos e pela democracia


A crise atual revelou os limites da democracia brasileira, e as manobras em curso, que visam poupar os corruptos, podem estreitá-la ainda mais.

Depois de muitos anos de luta contra uma violenta ditadura militar, chegamos a um regime democrático esquálido, que não rompeu claramente com o passado ditatorial. Sob forma nova, permanecem alguns dos instrumentos espúrios da ditadura, dos quais são exemplos o açambarcamento da função legislativa pelo Executivo, a multiplicação de foros privilegiados para julgar mandatários e burocratas, a ação subterrânea das forças de segurança militarizadas no seio do Estado, a ausência da plena liberdade de organização para os trabalhadores e a prática de tortura e do assassinato pelos órgãos policiais. Desenvolveram-se também, sem nenhum freio, alguns dos instrumentos pelos quais o poder econômico e as instituições do Estado podem distorcer os mecanismos de expressão da vontade popular, como a intervenção direta dos organismos econômicos internacionais na definição da política econômica do Estado brasileiro, o monopólio exercido por um reduzido número de grandes grupos econômicos sobre os meios de comunicação, o sistema de financiamento de campanhas eleitorais que nada mais é que um sistema para comprar candidatos e candidaturas, a conversão dos votos de deputados e senadores em mercadoria que é negociada quase que à luz do dia com vultosos recursos de origem escusa, a total falta de controle dos representantes pelos supostos representados e a consolidação de um presidencialismo que se parece com o poder imperial. Esse tipo de democracia tem sido útil para preservar o modelo econômico neoliberal, mas não para atender os interesses da maioria da população brasileira.

Depois de conquistarem o voto popular na eleição de 2002, o Governo Lula e o PT, sob a direção do Campo Majoritário, aderiram àquelas práticas. Chegamos a uma situação em que, dentre os grandes partidos políticos, ninguém pode atirar a primeira pedra. Desde que surgiram as denúncias sobre a compra de deputados para que votassem com o governo, o PT e o Governo Lula têm dificultado as investigações, enquanto o PFL e o PSDB agem sob medida com o único objetivo de usar eleitoralmente as denúncias, zelando para que a corrupção praticada por tucanos e pefelistas permaneça ignorada e não apurada.

Há também os interesses econômicos aos quais estão ligados o PFL e o PSDB. Esses partidos sacrificam as investigações quando elas apontam na direção do Ministério da Fazenda, de modo a preservar a política econômica do governo com a qual concordam. Não estão empenhados, de fato, em levar a investigação até o fim e em todas as direções; não estão empenhados em preservar e em ampliar o pouco de democracia política que conquistamos no Brasil. Colher depoimentos espetaculares sem proceder a investigações rigorosas pode ser um caminho para simular que se está investigando e, ao mesmo tempo, viabilizar um grande acordo que salve quase todos – o governo, a oposição liberal e até mesmo os deputados cujos nomes estão na lista de sacadores das contas de Marcos Valério.

É esse acordo contra a democracia que não podemos aceitar! Investigação pela metade e punições meramente protocolares estimularão a continuidade da ação dissolvente do poder econômico sobre a democracia brasileira e reforçarão a autonomia e a presunção de impunidade de parlamentares, de mandatários do poder executivo, de juízes e de burocratas do Estado. Campanhas eleitorais e deputados continuarão sendo comprados, a política continuará sendo meio para o enriquecimento pessoal e a democracia representativa, uma falsa representação da vontade da maioria. Passado o momento espetacular da crise, regressaríamos à normalidade de nossa democracia estiolada pela herança da ditadura, pela corrupção do poder econômico e pela arrogância dos políticos profissionais e dos burocratas.

Exigimos que as investigações prossigam até o fim, inclusive aquelas que apontem em direção à Presidência da República e possam redundar na instauração de um processo de impeachment.

Todos os culpados, corruptos e corruptores, devem ser punidos – inclusive os bancos e empresas, nacionais e estrangeiras, que financiaram essa ultrajante operação de compra de votos e apoio político.

É hora de lutar pela preservação das conquistas democráticas e pela criação e ampliação dos mecanismos de controle popular sobre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. A luta contra a corrupção e pela ampliação da democracia é parte da luta contra o modelo econômico neoliberal e pela melhoria das condições de vida da população brasileira.

Setembro de 2005

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