| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 336 - 11 a 17 de setembro de 2006
Leia nesta edição
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Hospital Sumaré vira modelo
para o serviço público de saúde

O diretor-superintendente Lair Zambon: “O mérito maior é dos funcionários” (Fotos: Antoninho Perri)No início de agosto, o Hospital Estadual Sumaré (HES), administrado pela Unicamp, foi contemplado pela Organização Nacional de Acreditação (ONA), instituição credenciada pelo Ministério da Saúde, com o certificado de Acreditação Hospitalar Nível 3, a mais alta classificação para uma unidade do gênero. Na prática, a distinção colocou o HES como um dos três melhores hospitais públicos do país, num universo de dez unidades creditadas, sendo sete delas particulares. A obtenção da certificação é resultado de um processo iniciado há quatro anos, durante o qual foram empreendidos esforços no sentido de qualificar o corpo de colaboradores, incrementar a infra-estrutura e aperfeiçoar os instrumentos e mecanismos de gestão, entre outras ações. “Trata-se de um feito inédito para uma unidade que atende exclusivamente pelo SUS, mas com as mesmas ferramentas e resultados de um hospital privado de alto padrão”, afirma o diretor-superintendente do HES, o médico pneumologista Lair Zambon.

De acordo com Zambon, alcançar o atual padrão de excelência não foi tarefa fácil. Ele admite que ninguém poderia garantir por antecipação que o projeto-piloto definido para a unidade daria certo. “Por isso, buscamos tornar a equipe mais coesa, direcionada a estruturar o hospital em etapas”, explica. A opção mostrou-se acertada. Outra tacada precisa foi o modelo de gestão adotado. O HES trabalha com demandas estabelecidas e pactuadas entre os cinco municípios da microrregião na qual está inserido (Hortolândia, Monte Mor, Nova Odessa, Santa Bárbara D’Oeste e Sumaré) e a Secretaria de Estado da Saúde. Assim, o repasse de recursos está condicionado ao cumprimento das metas propostas.

Esta forma de contrato, que evita que o hospital se preocupe em privilegiar procedimentos de melhor remuneração, divide o orçamento (R$ 52,2 milhões em 2005) em dois segmentos: um que representa 90% do valor total, diretamente vinculado à produtividade, e outro que corresponde aos 10% restantes, relacionado com indicadores de qualidade, como nível de satisfação do usuário e baixas taxas de infecção hospitalar. “O interessante é que se não houver o cumprimento dessas metas, somos penalizados no orçamento. Até hoje, felizmente, isso nunca ocorreu”, informa Zambon. Na entrevista que segue, o diretor-superintendente do HES fornece mais detalhes sobre o hospital, que tem despertado o interesse de outros estados e que deverá servir de modelo aos programas de financiamento em saúde do Banco Mundial para a América Latina.

Unidade ganha distinção máxima e atrai atenção de outros Estados e do Banco Mundial

Jornal da Unicamp – O que representa a obtenção da Certificação de Acreditação por parte do HES?
Lair Zambon – Significa caminhar na contramão do pessimismo que envolve o país e do conceito negativo que a maioria da população tem do serviço público. É um feito inédito de uma unidade 100% SUS, mas com as mesmas ferramentas, resultados e qualidades de um hospital privado de alto padrão.

JU – Na prática, a classificação coloca o HES entre os três melhores hospitais públicos do país. Como a unidade alcançou esse patamar? De quem é o mérito?
Zambon – Colocar em prática mudanças e superar desafios não foram tarefas fáceis. Não sabíamos quais seriam os resultados de um projeto-piloto como o nosso. Por isso, buscamos tornar a equipe mais coesa, mais afinada e mais direcionada a estruturar o Hospital Estadual Sumaré em etapas. O respaldo da Secretaria de Estado da Saúde, da Unicamp e da Faculdade de Ciências Médicas foi crucial para a conquista de todos esses resultados. Entretanto, o mérito maior deve ser creditado, sem exceção, aos funcionários do hospital.

Tempo para os  brinquedos: serviços de um hospital  privado de alto padrãoJU – Um dos grandes diferenciais do HES está na forma como ele é gerido. O que ele tem que a maioria dos hospitais não tem?
Zambon – O hospital tem um orçamento contratualizado, ou seja, trabalha com demandas estabelecidas e pactuadas entre os municípios da microrregião em que está inserido e a Secretaria de Estado da Saúde. O financiamento é condicionado ao cumprimento destas metas, que obedece a lógica das demandas. Com isso evitamos uma preocupação constante na busca pelos procedimentos de melhor remuneração, ou seja, fazemos o que a população de fato precisa. Esta forma de contrato de gestão divide o orçamento em dois componentes: um que representa 90% do valor total, que está relacionado com a produtividade, e outros 10%, relacionados com indicadores de qualidade, como índice de satisfação do usuário, baixas taxas de infecção hospitalar, tempo de espera para procedimentos etc. O interessante é que se não houver o cumprimento destas metas – produção e qualidade –, somos penalizados no orçamento. Até hoje, felizmente, isso nunca ocorreu.

JU – O HES constitui uma exceção dentro de sistema público de saúde brasileiro. O que falta para que o sistema como um todo avance em direção ao estágio onde está o HES?
Zambon – Não acho que o HES seja exceção. Outros hospitais que estão trabalhando nesta mesma lógica também têm conseguido fazer uma boa assistência médica. Acho inclusive que este modelo deve ser usado no aprimoramento do SUS. O que me chama a atenção no HES é o respeito dos funcionários aos usuários, o que pode ser um diferencial deste sucesso. Buscar enxergar cada paciente muito além da doença, valorizando-o como ser único e complexo que é, inclusive em suas diferenças e peculiaridades, talvez seja uma filosofia a ser seguida.

JU – Em relação aos problemas do sistema público de saúde, quais deles, na sua opinião, mereceriam prioridade de enfrentamento?
Zambon – Esta é uma pergunta difícil, principalmente porque não sou especialista em saúde publica. Na minha visão falta financiamento, bom senso, vontade política e sobra corrupção. É muito claro que o financiamento atual do SUS é insuficiente, e o que vemos Brasil afora é que mesmo com o pouco que se tem, se gasta mal, valorizando procedimentos que muitas vezes foram produtos de lobbies. A inovação deste modelo de gestão que o HES trabalha é diferente porque contempla as necessidades da região em que o hospital está inserido. É diferente porque é comparado mensalmente com outros hospitais, em termos de custos e produção. Finalmente, é diferente porque é auditado constantemente pelo Tribunal de Contas e porque o seu orçamento é publicado no Diário Oficial.

JU – Como fazer para manter o alto grau de excelência alcançado pelo hospital?
Zambon – Em primeiro lugar, garantir um orçamento suficientemente adequado, lógico e justo. Em segundo lugar, manter os ideais sobre os quais o hospital foi construído.

JU – Um dos aspectos levados em consideração na classificação da ONA é o nível de satisfação dos usuários. No caso do HES, ele supera os 90%. Isso significa que a população entendeu a proposta do hospital?
Zambon – Sabemos como essa missão é difícil. Afinal, para uma população carente de serviços de saúde, fica difícil ver um hospital como este, que é diferente do que existe Brasil afora, em que a maioria trabalha com o sistema de portas abertas. Sabemos que boa parte da população ainda não entende. Porém, cada vez mais – e podemos sentir isso através dos questionários distribuídos aos pacientes – estamos conscientes de que o fator de propagação da lógica de funcionamento está se espalhando entre as famílias de usuários, pois muitos funcionários que moram nos municípios da microrregião são abordados sobre essa lógica de funcionamento. Aos poucos os usuários estão compreendendo nosso funcionamento.

JU – O Banco Mundial demonstrou a intenção de usar o HES como modelo para avaliar aspectos da saúde no país. Como o senhor analisa essa possibilidade?
Zambon – O Banco Mundial estudou este modelo de gestão da Secretaria de Estado da Saúde, que é o das Organizações Sociais (OSS). Concluiu que os hospitais administrados na mesma lógica do HES têm uma produção 46% maior e um custo 25% menor quando comparado com hospitais semelhantes sob administração direta. Até onde eu sei, linhas de financiamento para a área da saúde do Banco Mundial para a América Latina deverão ser baseadas neste modelo.

JU – Outros estados vêm cogitando utilizar o HES como modelo para ações na área da saúde?
Zambon – Sim. A partir desse projeto, que está se multiplicando em escala nacional e modificando conceitos arraigados sobre qualidade dos serviços públicos de saúde, estamos percebendo que os bons resultados demonstram que é possível oferecer assistência hospitalar de alto nível ao usuário do SUS. Já visitaram o hospital representantes dos estados de Minas Gerais, Maranhão e Pará. Na semana passada também recebemos o secretário de Estado da Saúde de Goiás.

JU – Desde a inauguração do hospital, alguns indicadores importantes, como o relacionado à mortalidade infantil, vêm caindo na região. Trata-se de um reflexo direto do atendimento prestado pela unidade?
Zambon – Provavelmente tem ajudado muito, já que os números demonstram essa realidade. Nesses anos à frente deste projeto, tenho visto uma melhora da participação dos municípios. Muito dessa melhora devemos ao Núcleo de Saúde Pública do hospital, que faz o elo de interação com os municípios. Todas as metas de produção são pactuadas mensalmente em reuniões entre este Núcleo e os secretários de Saúde destes municípios, com mediação da DIR 12 [Direção Regional de Saúde]. É uma reunião onde “se lava a roupa suja”, mas ao final tudo dá certo.

JU – Quais as perspectivas para o HES nos próximos anos?
Zambon – A manutenção do Nível 3 da Acreditação Hospitalar e continuidade do processo de melhoria são os grandes desafios a serem enfrentados nos próximos anos. Por isso preparar o hospital para o futuro vai exigir investimentos contínuos em diversas frentes, com destaque para a qualificação do capital humano e incremento da tecnologia da informação. São ações imprescindíveis para o crescimento continuado, mantendo os índices atuais de qualidade e respeito ao paciente. Na área da assistência e ensino, temos projetos em fase de finalização para uma maior interação com a rede pública, por meio do pólo de capacitação e da área de ensino da FCM. Também estamos avançando em relação ao último nível do Projeto Canguru [conjunto de ações que aceleram a recuperação de crianças prematuras], cirurgia bariátrica, aumento da produção de cirurgias ambulatoriais e a conclusão da nova área da UTI pediátrica. Ainda no campo da assistência, estamos avaliando e trabalhando com a possibilidade da compra de um novo tomógrafo de ultima geração, para criação de um centro de diagnóstico de imagem, principalmente nas áreas vascular e de oncologia. Mas ainda é um sonho! No campo da tecnologia, demos um grande salto de qualidade com a implantação do sistema de informática e gestão hospitalar MV 2000i (tecnologia Oracle), que foi instalado no hospital em parceria com a empresa. O sistema permite visualizar todo o hospital nas áreas de gestão hospitalar, gestão do paciente, gestão clínica, diagnóstico e terapia, gestão de materiais, faturamento SUS, gestão financeira, serviços de apoio e os novos serviços internet, através de mais de 20 módulos integrados. Outro grande diferencial tecnológico do HES está sendo a adoção do sistema PACS [Picture Archival Computer System]. O PACS permite capturar, armazenar e distribuir imagens de raios-x, tomografias, ultra-sons e ecocardiogramas, o que gera redução de custos com filmes, otimiza o fluxo de trabalho e permite um diagnóstico rápido e preciso de qualquer área do hospital. O sistema estará totalmente operacional em setembro. Finalmente, para o encerramento deste ano temos previsão de funcionamento da usina de co-geração de energia através do gás natural, resultado de uma parceria entre o HES, Unicamp e CPFL.

COMO É O ATENDIMENTO

O HES não é a porta de entrada do sistema de saúde regional. Trata-se de uma unidade integradora da rede de serviços públicos de saúde dos cinco municípios da microrregião (Hortolândia, Monte Mor, Nova Odessa, Santa Bárbara D’Oeste e Sumaré). Sua missão é oferecer atendimento hospitalar em nível secundário e eventualmente terciário para uma população de mais de 600 mil habitantes.

O HES é um hospital do governo estadual, administrado pela Unicamp e mantido com recursos SUS.

O hospital oferece consultas ambulatoriais, internação, internação em caráter de urgência ou emergência e exames simples e especializados de alto custo, como raio-x contrastado, endoscopia, ultra-sonografia e tomografia computadorizada. O acesso da população ao serviço é coordenado pelos municípios que integram a área de cobertura do HES. Ou seja, quem agenda tudo para utilização dos serviços do hospital são os médicos das referidas cidades.

O HES dispõe de uma estrutura chamada de Serviço de Urgência Referenciada. Ou seja, o paciente só é encaminhado ao hospital se o seu caso for considerado complexo e somente depois de ter passado pelo posto de saúde e a unidade de Pronto Atendimento da sua cidade.

As vagas para internação em caráter de urgência ou emergência são gerenciadas pela central de regulação de vagas da DIR 12. As exceções são para os casos encaminhados pelo serviço de resgate do Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Polícia Rodoviária e concessionárias das rodovias.

A obrigação de fornecer serviços hospitalares de pronto atendimento é dos municípios, conforme determina a Constituição Federal. Todos os atendimentos desse nível (primário) devem ser realizados em postos de saúde ou no hospital do município.

Fonte: HES

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