| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 370 - 3 a 9 de setembro de 2007
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Novo secretário estadual de Ensino Superior afirma
que "não fazia sentido" manter Fapesp e universidades separadas

‘Ao abrigo da poesia’,
Vogt defende autonomia

CLAYTON LEVY

Carlos Vogt, secretário estadual de Ensino Superior, durante encontro no Conselho Universitário da Unicamp: "Buscaremos o interlocutor acadêmico" (Foto: Antonio Scarpinetti)Ex-reitor da Unicamp, poeta e lingüista, Carlos Vogt revelou o tom que pretende adotar à frente da Secretaria de Ensino Superior, após ocupar por cinco anos a presidência da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Minha gestão estará ao abrigo da poesia”, disse no último dia 28, durante um encontro com os membros do Conselho Universitário da Unicamp. Num ambiente marcado pela informalidade, Vogt falou durante duas horas. Expôs seus planos como titular da pasta recém-empossado e respondeu a perguntas da platéia. Dizendo-se “em casa”, transitou por temas variados, mas dedicou boa parte da conversa à questão da autonomia universitária, tema que dominou o primeiro semestre justamente em razão da criação da nova secretaria pelo governador José Serra.

Acompanhado pelo reitor José Tadeu Jorge, o secretário lembrou sua vinculação histórica com o a autonomia, tendo participado, inclusive, da formulação do projeto enquanto vice-reitor da Unicamp. “A autonomia não é apenas um objetivo em si, mas também a condição fundamental para se atingir os objetivos do ensino superior público”, enfatizou, garantindo que a nova secretaria vai trabalhar em conjunto com as universidades. Leia os principais trechos da entrevista concedida por Vogt após o encontro em Campinas.

Jornal da Unicamp – A criação da Secretaria de Ensino Superior, em janeiro deste ano, provocou discussões acaloradas em torno da autonomia universitária. Em sua opinião, a autonomia universitária, tal como está colocado hoje, apresenta ou não alguma fragilidade?

Vogt – Na verdade, todo esse processo crítico pelo qual a Secretaria de Ensino Superior passou durante o primeiro semestre, teve uma conseqüência extremamente positiva em relação à autonomia das universidades, que foi a promulgação pelo governador José Serra, em maio, de um decreto declaratório explicitando o princípio da autonomia. Esse decreto constituiu-se num documento fundamental de garantia desse princípio, que estava assentado sobre um decreto de 1989, mas que deixava margem a várias interpretações. Ao explicitar o conceito, as condições e o exercício da autonomia, o decreto se constituiu num documento de referência para o seu pleno exercício nas instituições universitárias. Portanto, feitas as contas, o processo acabou resultando em algo positivo para as universidades.

Secretário prega ação conjunta com universidades

JU – Embora o decreto declatório acene com essa garantia, estaria em seus planos, enquanto titular da Secretaria de Ensino Superior, avaliar e propor outras ações capazes de oferecer maior perenidade à autonomia universitária?

Vogt – Claro que a aspiração da comunidade universitária é que a autonomia se transformasse num princípio constitucional ou pelo menos em lei estadual. Mas há questões com as quais podemos nos deparar e que podem representar limitações, em razão de determinados dispositivos presentes na Constituição Federal. A questão da vinculação é uma delas. Entretanto, isso não impede que nós todos – comunidade universitária e Secretária de Ensino Superior – tentemos caminhar no sentido de encontrar condições que proporcionem cada vez mais solidez à autonomia das universidades.

JU – Nesse início de mandato o senhor demonstra estar interessado numa aproximação com as universidades. Que tipo de interlocutores o senhor está buscando nas unidades?

Vogt – Uma secretaria de Ensino Superior que não estabelecesse um diálogo consistente e contínuo com as universidades estaria fugindo de suas atribuições. Penso que essa interlocução é fundamental e ela se fará pela ordem institucional, com as reitorias, com seus dirigentes em diferentes instâncias, com os pesquisadores no que diz respeito aos projetos. Na verdade, buscaremos o interlocutor acadêmico.

JU – Quais são as perspectivas para ampliação de vagas no ensino superior público no estado de São Paulo?

Vogt – Do ponto de vista do programa de expansão do ensino superior, usando inclusive a metodologia de ensino a distância, são perspectivas muito positivas no que diz respeito à capacidade de atendimento. O que precisamos é montar um sistema capaz de funcionar adequadamente na gestão desse empreendimento que é de alta complexidade. Isso supõe a participação ativa e efetiva das universidades. Não se trata de criar outra instituição. Trata-se, na verdade, de se desenvolver um programa consorciado com as universidades de maneira a procurarmos juntos utilizar a capacidade de atendimento por demanda.

JU – Quando o senhor fala de ensino à distância, está se referindo à criação de uma universidade aberta e virtual, por meio de uma parceria entre a TV Cultura e as Universidades públicas, conforme já foi anunciado como uma de suas primeiras medidas à frente da Secretaria. Como vai ser essa parceria?

Vogt – A TV Cultura seria um veículo importante. Caberia a ela disponibilizar o sinal aberto. Já as universidade (USP, Unesp, Unicamp, Unifesp e UFSCar) teriam um papel chave do ponto de vista da solidez institucional e na própria produção dos conteúdos das aulas e dos programas. O projeto contaria ainda com a participação da Secretaria de Educação, responsável pelo ensino fundamental e médio, e da Fapesp. O governo se comprometeu com esse projeto, que foi inclusive um dos motivos para que eu aceitasse o cargo. Tudo isso será discutido com o sistema universitário.

JU – Outra medida anunciada pelo senhor foi a vinculação da Fapesp à Secretaria de Ensino Superior e não mais à Secretaria de Desenvolvimento. A agência é uma das principais fomentadoras de pesquisa no país. Qual o objetivo dessa mudança?

Vogt – Na verdade, trata-se uma medida do governador, que resultou dos entendimentos que tivemos dentro do próprio governo, inclusive com a participação da Secretaria de Desenvolvimento. O resultado dessa mudança é que agora teremos na mesma secretaria a Fapesp e as universidades. Estas instituições sempre trabalharam juntas e não fazia sentido mantê-las separadas. Portanto, trata-se de uma aproximação que já vinha sendo desejada. Agora, a Secretaria poderá elaborar uma visão mais organizada do ensino superior, que é muito complexo pela qualidade e qualidade da produção científica. Além disso, as três universidades públicas de São Paulo utilizam 60% dos recursos da Fapesp destinados ao fomento à pesquisa.

Isso não quer dizer, porém, que a Fapesp irá atender somente as universidades. Ao contrário, trata-se de um sistema mais complexo, que tem além das três universidades estaduais as universidades federais presentes no estado de São Paulo, bem como os institutos de pesquisa e todo o sistema comunitário. Como trabalha com projetos, a Fapesp considera o mérito dos trabalhos. O fato de 60% dos recursos serem absorvidos pelas três universidades estaduais significa apenas que estas três instituições têm uma massa crítica maior e, portanto, capaz de produzir também uma demanda mais qualificada. Mas a idéia é que possamos contribuir para qualificar o sistema como um todo. Sem esquecer, claro, que a Fapesp, de uns anos para cá, vem trabalhando em programas de fomento à pesquisa tecnológica e à inovação, envolvendo parcerias entre universidades e empresas. A Secretaria de Ensino Superior, dentro do seu papel, continuará incentivando e apoiando esses programas.

JU – Durante o encontro com os membros do Conselho Universitário da Unicamp (ocorrido no dia 28 de agosto), o senhor disse que sua gestão à frente da Secretaria de Ensino Superior estará ao abrigo da poesia. Como poeta e como gestor, o que isso significa?

Vogt – (Risos). Significa tratar de tudo. Mas nesse caso em particular, tratar das universidades, da pesquisa, do desenvolvimento social e econômico tem de ter uma inscrição poética no sentido amplo da expressão. Algo que traduza o meu compromisso com a visão crítica sistemática e continuada das ações. Não é pensar apenas nos resultados, não é ter uma atitude finalista simplesmente, mas considerar sempre as formas através das quais esses resultados se produzem, de maneira que, além dos números, você tenha garantida a qualidade do processo, que é também a garantia para a formação integral do ser humano que estamos buscando. Portanto, é essa a minha preocupação, enquanto poeta e gestor.

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