Ao receber sua primeira turma ingressante pela Lei de Cotas PCD (pessoa com deficiência), a Unicamp, por meio do Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA2), prepara uma série de atividades com o intuito de refletir sobre a acessibilidade.
Entre os dias 10 e 15 de março, durante a Semana de Acessibilidade, o EA2, ligado à Pró-Reitoria de Graduação (PGR), debaterá, com professores, coordenadores de cursos e diretores de unidades, questões como a estrutura institucional de acessibilidade; as experiências no desenvolvimento dessas estruturas; as metodologias inclusivas; e as barreiras físicas e atitudinais que precisam ser superadas a fim de que a Universidade ofereça um espaço plenamente inclusivo, equitativo e acolhedor.

A Unicamp conta atualmente com cerca de 160 estudantes PCD matriculados na graduação, dos quais 120 contam com assistência do Programa de Atendimento Educacional Especializado para Estudantes com Deficiência (Paee). Esses números, no entanto, devem aumentar em 2025, com a chegada de mais de 70 ingressantes PCD de graduação – 30 desses entraram na Unicamp por meio da lei de cotas. Todos poderão solicitar adesão ao Paee.
“Os eventos programados para a semana desempenharão um papel fundamental na troca de experiências sobre os aspectos éticos, políticos e práticos da inclusão de pessoas com deficiência no ensino superior”, disse o pró-reitor de Graduação, professor Ivan Toro.
“A acessibilidade afetiva emerge, assim, como um ponto de partida essencial para promover a verdadeira inclusão dentro das universidades públicas, sendo indispensável para garantir que todos os alunos, com ou sem deficiência, se sintam respeitados e integrados ao contexto acadêmico”, acrescentou.
Coordenador do EA2, o professor Arnaldo Pinto Júnior afirmou que o grande desafio da Universidade neste momento consiste em sensibilizar a comunidade e levar ao sistema educacional culturas de formação que efetivamente abarquem perspectivas de inclusão. E essa, segundo o coordenador, é uma tarefa coletiva, que precisa envolver professores, servidores e estudantes.
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O assessor de coordenação do EA2, professor Sílvio Roberto Consonni, disse que esse trabalho de sensibilização vem sendo realizado por meio de discussões em eventos e do desenvolvimento de práticas com a Diretoria Executiva de Apoio e Permanência Estudantil (Deape), com a Diretoria de Direitos Humanos (DeDH), com a Prefeitura do Campus e com o Laboratório de Acessibilidade (Labaces) do Sistema de Bibliotecas da Unicamp (SBU).
Para os professores, esse processo formativo envolvendo a comunidade pode gerar, inclusive, adequações nos currículos.
“A forma como trabalhávamos no dia a dia com os conhecimentos nos anos 1980/90 era uma. A forma com que os estudantes que estão chegando agora, com 17, 18, 19 anos, é outra”, pondera o professor Pinto Júnior. “Eles leem o mundo de forma diferente e se relacionam com os conhecimentos de forma diferente. Não se trata de inverter o currículo. Não é isso. Não precisamos tirar o que tem. Mas é preciso colocar coisas novas.”
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Mecanismos de inclusão
Consonni avalia que as metas a partir de agora são as de aprimorar os mecanismos de inclusão, porque o direito à educação já está garantido em lei.
“Importante destacar que a Lei Brasileira de Inclusão, de 2015, prevê o direito à educação da pessoa com deficiência. Portanto, nós, como instituição educacional, temos o dever de garantir o desenvolvimento de habilidades e o talento de todas as pessoas, com ou sem deficiência”, argumentou.
Sem tabu
Segundo a professora Sônia Caldas Pessoa, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) – que participará de debates e palestras e que ministrá um curso na Semana de Acessibilidade da Unicamp –, a pauta PCD deve ser abordada e enfrentada pelas universidades sem impedimentos.
“Essa é uma questão que deve ser tratada sem tabu. Nós precisamos falar sobre esse assunto, com sinceridade, com naturalidade. Precisamos buscar um olhar cuidadoso para entender tanto o potencial das pessoas com deficiência quanto as nossas fragilidades e, dessas tensões do dia a dia, entender como podemos aprender a lidar melhor com esse assunto”, ensina.
Caldas conta que o curso Metodologias Inclusivas para Pessoas com Deficiência no Ensino Superior tem o objetivo de trabalhar a temática da metodologia a partir de práticas pedagógicas surgidas de experiências desenvolvidas nas diversas instâncias da Universidade. A professora diz que as práticas apresentadas no curso foram desenvolvidas em conjunto com pessoas com deficiência.
A docente da UFMG também ministrará uma palestra intitulada “Acessibilidade afetiva: discursos, experiências, estruturas institucionais, hospitalidade e barreiras atitudinais”.

“A acessibilidade afetiva compreende um conjunto de comportamentos, atitudes, decisões, modos de estar no mundo para acolher as pessoas com deficiência que estão convivendo conosco e que precisam ser olhadas com cuidado, ética e afetos”, afirmou. “As deficiências são inúmeras, múltiplas, e é preciso que a gente esteja atento às particularidades de cada uma delas.”
Para Caldas, os desafios ainda são enormes. A professora lembra que as universidades brasileiras, em geral, nasceram há muito tempo e que grande parte delas ainda precisa de adaptações físicas – como mobiliário, rampas, elevadores que sejam inclusivos para pessoas surdas, cegas, ou seja, de uma estrutura que garanta a mobilidade.
“Há, no entanto, um outro grande desafio, que está no campo discursivo, já que cotidianamente reproduzimos discursos que podem ter conotação preconceituosa, pejorativa, e que podem provocar vários danos sociais à pessoa com deficiência”, alerta Caldas.
“Portanto, é preciso que a gente trabalhe também discursivamente e entenda que ser uma pessoa com deficiência não significa ser menos, ser inferior ou não estar apto.”