Para muitas pessoas, sombra, água fresca e o calor do Sol são a melhor maneira de aproveitar as férias de verão. Mas utilizar esse momento para promover o enriquecimento intelectual e a troca construtiva de ideias pode fazer toda a diferença no futuro profissional de muitos estudantes. É por isso que várias instituições aproveitam a oportunidade para oferecerem cursos voltados a alunos de graduação e pós-graduação que queiram aprimorar seus conhecimentos. Na Unicamp não é diferente, e diversas iniciativas do tipo são realizadas todos os anos com o intuito de fomentar a formação continuada dos estudantes universitários.
Exemplo disso é a Escola de Verão do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW), que, desde segunda-feira (5/2), está recebendo estudantes da fase final do curso de graduação em física e áreas afins para promover um intercâmbio entre alunos e professores. Ao longo dos dias, os participantes do programa poderão integrar atividades como minicursos em tópicos avançados, palestras e visitas programadas a laboratórios, tudo com o intuito principal de preparar os estudantes para os cursos de pós-graduação e mostrar a importância dessas pesquisas para a área de ciência e tecnologia.
De acordo com o docente do IFGW Jonathas de Paula Siqueira, um dos coordenadores do evento, o encontro inclui também a apresentação de pôsteres de alunos de iniciação científica e da pós-graduação, além de uma visita guiada ao Sirius, o acelerador de partículas do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), localizado em Campinas. “Vários pesquisadores do Sirius são orientadores do nosso programa de pós, então a visita acaba sendo também uma divulgação. O que fica mais claro para os alunos é a possibilidade de seguir carreira acadêmica e o funcionamento do processo de pesquisa. O principal efeito da Escola de Verão é aumentar a divulgação de informações sobre as nossas linhas de pesquisa”, comenta.
Maratona de Programação
Outra Escola de Verão promovida pela Unicamp é a Brazilian ICPC Summer School, organizada anualmente pelo Instituto de Computação (IC) da Unicamp com o objetivo de preparar os alunos para a International Collegiate Programming Contest (ICPC), uma maratona de atividades voltada a estudantes universitários de todo o mundo. Trata-se de uma competição de cinco horas de duração, na qual equipes formadas por três alunos devem resolver diversos problemas computacionais. Vence quem resolver o maior número de questões no menor tempo.
Nas últimas duas semanas, os alunos selecionados participaram de 50 horas de simulados, acompanharam aulas teóricas com especialistas mundiais em programação competitiva e assistiram a palestras ministradas pelas empresas de tecnologia que patrocinaram o encontro. Segundo os organizadores desse evento, os professores Rafael Schouery, do IC, e Carlos Eduardo Ferreira, da Universidade de São Paulo (USP), a competição é uma oportunidade para os alunos aplicarem seus conhecimentos de programação na solução de problemas reais de computação, além de demonstrarem saber trabalhar em equipe.
“A competição é disputada por times que compartilham um único computador na tarefa. Assim, os alunos devem mostrar que sabem colaborar na solução de problemas e que sabem elaborar soluções sem o uso da máquina. E, na minha opinião, o principal item, demonstrar que gostam de desafios. Além disso, toda a competição usa a língua inglesa e, assim, os estudantes também treinam um tipo de uso bastante avançado desse idioma”, comenta Ferreira, destacando o networking que os alunos realizam com os professores e demais participantes da Escola de Verão. “Daqui a 20 anos, quando eles estiverem abrindo uma empresa, vão convidar uns aos outros para participarem de seus projetos”, argumenta.
Essa também é a opinião do aluno de ciência da computação da Unicamp Ian Matheus Tavares e Silva, que integra um dos times classificados para participar da etapa mundial da competição, a ocorrer em abril, no Egito. Para ele, o mais interessante da Escola de Verão foi a possibilidade de interagir com os outros estudantes vindos de países como Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai. “A gente sempre revê os amigos aqui. A gente sai depois da aula e conversa sobre as provas. Essa convivência é muito importante”, afirma. “E também realizamos muitos exercícios para ter ideias e descobrir algoritmos novos, porque isso pode ser importante em uma final”, esclarece.
Ao todo, 170 estudantes foram selecionados para participarem da Escola de Verão, que terminou nesta sexta-feira. Como forma de incentivar a participação feminina, todas as 34 alunas presentes tiveram isenção da taxa de inscrição, e aquelas que não tiveram incentivo de suas instituições também receberam auxílio financeiro para se deslocarem até a Unicamp. Entre essas estudantes estavam Larissa Gomes, aluna de ciência da computação da Unicamp que está classificada para a fase brasileira da competição, e as estudantes da Universidade de Brasília (UNB) Maria Eduarda de Holanda, Natália Pereira e Maria Eduarda Carvalho Santos, classificadas para a fase latino-americana da competição, que ocorrerá no México.
Enquanto Gomes está em seu último ano de competição – ela irá se formar neste ano e está iniciando um estágio na Microsoft, conquistado com os conhecimentos sobre solução de problemas adquiridos na maratona –, as estudantes de Brasília têm planos de chegar a níveis mais altos. Elas começaram a competir em conjunto há cerca de dois anos, mas, por causa da pandemia, os treinos eram feitos de maneira online e de forma bem menos imersiva, o que, segundo acreditam, impediu, até agora, conquistas ainda maiores. Foi com a Escola de Verão do ano passado que elas começaram a treinar de maneira presencial e mais frequente, o que ajudou a mudar a dinâmica do time.
“Aqui a gente está se preparando para um nível de competição bem mais elevado do que aquele com que a gente está acostumada”, ressalta Maria Eduarda Carvalho. “É bem desafiador e interessante ver que ainda existe muita coisa para a gente aprender, novas maneiras de resolver problemas, novas técnicas para aplicar nas questões e obter um resultado. Nós realmente queremos fazer o nosso melhor e deixar orgulhosas as meninas do país. Acima de tudo, esperamos que elas vejam a gente competindo e descubram que programação [computacional] é legal e que também gostariam de competir”, acrescenta.
Acampamento de Matemática
Na última sexta-feira também terminou o Acampamento de Verão do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (Imecc) da Unicamp. O encontro envolveu três semanas de estudo intensivo com estudantes do final da graduação ou início do mestrado e teve como objetivo apresentar conceitos novos aos participantes, além de divulgar as pesquisas realizadas na unidade e atrair novos estudantes. Segundo o docente Giuliano Angelo Zugliani, um dos responsáveis pela organização do acampamento, os problemas propostos são mais avançados do que aqueles com que os alunos estão acostumados, mas a meta não é solucioná-los e, sim, introduzir novas formas de pensar, mostrando aos alunos o que eles vão vivenciar no futuro. “Isso é importante para o amadurecimento deles como pesquisadores”, comenta.
Dentro do acampamento, Zugliani supervisionou um projeto sobre topologia e dinâmica, realizado em parceria com a docente Ketty Rezende e o pós-doutorando Murilo Zigart. Zigart pesquisa sistemas dinâmicos e topológicos com foco em variedades com singularidades e participou do projeto como uma forma de divulgar seu trabalho. “Produzir algo que tem uma única singularidade é bem interessante. A aplicação ocorre dentro de uma área que a gente chama de topologia computacional, ligada a reconhecimento de imagens, por exemplo tomografias e coisas do tipo”, explica o pesquisador.
Para participar do projeto, foram selecionados alunos de matemática de diversas universidades do país, como André Rasera, do bacharelado da Unicamp, e Victória Rocha, da licenciatura da Universidade Federal Fluminense (UFF). Ambos afirmam ter sido essa uma experiência bastante diferente daquelas com que estão acostumados, visto que, devido às demandas do curso de graduação, não sobra tempo no dia a dia para passar horas dedicando-se a apenas um problema de pesquisa, como ocorre no acampamento.
Além disso, ressalta Rocha, como o seu curso é voltado à formação de professores, ela, até aquele momento, não havia tido um contato tão intenso com a área de pesquisa em matemática. “Isso está sendo ao mesmo tempo desafiador, muito bom e fascinante, porque eu gosto da matemática e vê-la nesse novo contexto, em que ficamos tardes e tardes debatendo um mesmo tema, significou conhecer outras áreas capazes de despertar meu interesse no futuro”, constata.
O acampamento de verão do Imecc também desenvolveu outros dois projetos, voltados ao estudo da temática de geometria algébrica e à sondagem em aritmética no ensino fundamental. Este último, supervisionado pelos docentes Marcelo Firer, da Unicamp, e Rita Santos Guimarães, da Universidade Federal do ABC (UFABC), nasceu de um projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) no âmbito do Programa de Pesquisa em Educação Básica (Proeduca). Seu objetivo foi elaborar um instrumento para que as professoras dos primeiros anos do ensino fundamental avaliem o desenvolvimento dos seus alunos na matemática, identificando as necessidades de aprendizado de cada um.
“Propomos ao acampamento produzir esse instrumento”, revela Guimarães. “Para isso, a gente chamou tanto o pessoal de licenciatura em matemática quanto o de pedagogia. Na primeira semana, a gente estudou a aritmética dos anos iniciais com os alunos da licenciatura. A partir disso, eles se dividiram em duplas e cada uma delas trabalhou em uma série dos cinco primeiros anos do ensino fundamental”, explica.
De acordo com Thiago de Oliveira, aluno da licenciatura em matemática na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o curso de graduação não é voltado para a docência nos primeiros anos do ensino fundamental – foco dos pedagogos –, o que significa que, em geral, esses profissionais estudam apenas o conteúdo a partir do sexto ano, quando já há uma estrutura de professores de matemática capazes de assumir as turmas. “Então, para mim, foi uma experiência enriquecedora ter contato com uma área com a qual eu não teria se não existisse um projeto assim. Quando a gente chega a uma sala de aula, o aluno já está ou já deveria estar com o conhecimento sobre aritmética formado. Então essa foi uma outra experiência de formação de professores”, conclui.
Como esse tipo de instrumento de avaliação precisa de uma validação, os planos, após o fim do acampamento, são de utilizá-lo com um público-alvo, algo que deve ocorrer em uma escola parceira da Unicamp no Proeduca. “Depois que o acampamento terminar, a gente vai continuar refinando o instrumento para que ele possa de fato ser usado. Pretendemos que, em março, a nossa escola parceira use esse instrumento. Nós vamos dar uma finalizada nessa ferramenta, as professoras vão aplicá-la e nós vamos utilizar esse primeiro uso como etapa de validação”, finaliza Guimarães.
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