Universidade Estadual de Campinas
Faculdade de Engenharia de Alimentos
Departamento de Engenharia de Alimentos

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Relatório para o Programa PIBIC/CNPq

Análise ecossistêmica e emergética da produção
transgênica, convencional e orgânica de soja.


(Estudo de impacto sócio-ambiental)


Aluna: Mariana Miller (RA 981747 - CPF 290673078-58)
Orientador: Dr. Enrique Ortega


Faculdade de Engenharia de Alimentos
Cidade Universitária, Campinas, SP, 24 de julho de 2001.

Índice

  1. Introdução ................................................................................................ p. 3
  2. Resultados ................................................................................................ p. 3
  3. Discussão dos Resultados ........................................................................... p. 5
  4. 3.1 Insumos (materiais) 3.1.1 Herbicidas e Fertilizantes .................................................. p. 6
    3.1.2 Calcário e Inoculante ....................................................... p. 6
    3.1.3 Pesticidas ....................................................................... p. 6
    3.1.4 Esterco .......................................................................... p. 7
    3.2. Serviços
    3.2.1 Mão-de-obra .................................................................... p. 7
    3.2.2 Assistência técnica, Impostos e Taxas ................................ p. 7
    3.2.3 Transporte ....................................................................... p. 8
    3.2.4 Limpeza, Secagem e Estocagem ......................................... p. 8
    3.2.5 Tratamento de efluentes, médicos e de riscos ...................... p. 8
    3.3. Índices Emergéticos
    3.3.1 Transformidade (Tr) ......................................................... p. 9
    3.3.2 Taxa de Rendimento (EYR) ................................................ p. 9
    3.3.3 Taxa de Investimento (EIR) ................................................ p.10
    3.3.4 Taxa de Carga Ambiental (ELR) .......................................... p.10
    3.3.5 Porcentagem de Renovabilidade (% R) ................................. p.10
    3.3.6 Taxa de Intercâmbio Emergético (EER) ................................ p.11
  5. Considerações sobre dependência tecnológica .................................................... p.12
  6. Considerações sobre tamanho das propriedades .................................................. p.12
  7. Conclusões ..................................................................................................... p.15
  8. Referências Bibliográficas ................................................................................. p.16

1. Introdução

Devido à importância da soja na economia brasileira, foi realizada uma pesquisa sistêmica sobre os três principais métodos de produção de soja: a opção agroquímica convencional, a opção herbicidas - plantio direto e a opção orgânica. Foram confeccionadas planilhas de análise emergética (uma para cada sistema de produção) ( Ortega e Miller, 2000).

Estas planilhas contém dados de insumos utilizados em um hectare no período de um ano. Os dados foram obtidos em manuais como o Agrianual 1999 e 2000 (para as opções agroquímica convencional e herbicidas – plantio direto) e com a colaboração da Empresa Agrorgânica do Paraná (para a opção orgânica).

Para avaliar o impacto de cada uma das três opções, as planilhas foram ampliadas para todo o Brasil, ou seja, considerou-se que toda a área cultivada com soja no país (12,6 milhões de hectares) seria de um só tipo de produção. Desta forma, pode-se fazer uma análise geral das diferenças econômicas, sociais e ambientais originadas de cada sistema de produção.

Desta forma, foram construídos três cenários agrícolas que permitiram visualizar o impacto de cada um dos modos de produção de soja sobre os setores econômico, social e político.

As políticas públicas são os instrumentos que a sociedade tem para orientar e regular seu desenvolvimento. São intervenções que o governo faz para incentivar as ações desejáveis e restringir as negativas. Como exemplo de políticas públicas podem ser citadas:

  1. Taxas de juros diferenciada no financiamento de acordo com as características de cada sistema de produção (uso de insumos locais, geração de emprego, preservação da natureza, não poluição, etc.);
  2. Taxas de impostos diferenciada de acordo com as características de cada sistema de produção (sustentabilidade, autonomia política, etc.);
  3. Estabelecer acordos internacionais e nacionais para fixar preços mais justos ao produto agrícola;
  4. Promover a infra-estrutura de apoio ao tipo de produção mais desejado.

2. Resultados

A seguir, encontram-se duas tabelas (Tabela 1 e Tabela 2) onde são mostrados os resultados obtidos para os três tipos de produção de soja, incluindo os Índices Emergéticos.

Tabela 1. Fluxos de emergia – Produção Agroquímica, Plantio Direto e Orgânica.

Tabela 2. Índices emergéticos dos mesmos três modos de produção (FNP 2000 e Agrorgânica).

3. Discussão dos Resultados

3.1. Insumos

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

Itens

US$ mi/ano

Materiais

3177,46

4076,14

2241,60

Serviços

829,88

798,80

1215,90

Recursos da economia

4007,34

4874,94

3457,50

Tabela 3. Insumos para os três tipos de produção de soja (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Primeiramente, comparando-se os três sistemas de produção, é possível observar que seriam poupados anualmente 1,4 bilhão de dólares com o sistema orgânico quando considerados os gastos totais com a produção (fluxo monetário real) em relação ao sistema plantio direto e 800 milhões de dólares em relação à produção convencional. Apenas no setor de materiais são gastos US$ 0,9 e 1,8 bilhões a mais nos sistemas agroquímico e plantio direto (herbicidas), respectivamente, do que no sistema orgânico. Este dinheiro destina-se ao exterior do país, porque a maioria destes materiais é importado.

Analisando alguns itens separadamente:

3.1.1. Herbicidas e Fertilizantes

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

fert. nitrogenado

0,00

0,00

0,00

fert. fosfatado

340,20

567,00

756,00

fert. potássico

756,00

504,00

113,40

herbicidas

812,70

1568,70

0,00

Total

1908,90

2639,70

869,40

Tabela 4. Herbicidas e Fertilizantes para os três tipos de produção de soja (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Na opção agroquímica convencional são gastos anualmente quase US$ 2 bilhões com herbicidas e fertilizantes. Este valor representa 72% do gasto com os insumos materiais e 45% do custo total (materiais e serviços). Na opção herbicidas – plantio direto são US$ 2,6 bilhões, já que o custo com herbicidas (do próprio nome do sistema) é bem mais alto. Este valor representa 71% do gasto com todos os materiais e 51% do custo total. Estes valores, quando comparados aos custos da produção orgânica são muito maiores. São gastos US$ 869 milhões com fertilizantes (herbicidas são proibidos neste tipo de produção). Este valor representa apenas 34% do gasto com todos os materiais e 27% do custo total (materiais e serviços).

3.1.2. Calcário e Inoculante

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

calcário

264,60

264,60

0,00

Inoculante

294,16

234,28

130,16

Tabela 5. Calcário e Inoculante para os três tipos de Produção de soja (FNP, 2000).

A opção orgânica economiza quando se trata do uso de calcário pois não utiliza este insumo. Os dois outros sistemas (agroquímico e herbicidas – plantio direto) têm praticamente o mesmo gasto: US$ 264 milhões cada um, representando 6,34% do custo anual total. A opção orgânica também economiza quando se trata do uso de inoculante. São mais de US$ 8 milhões a menos do que nas opções agroquímica e herbicidas – plantio direto.

3.1.3. Pesticidas

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

Itens

 

US$ milhões /ano

 

Inseticida

294,16

234,28

130,16

formicidas

106,34

106,34

0,00

fungicidas

23,37

23,37

0,00

Tabela 6. Pesticidas para os três tipos de Produção de soja (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Pode-se dizer que gasta-se duas vezes mais (cerca de US$ 300 milhões, 7% do custo total) com inseticidas na opção agroquímica quando comparada à opção orgânica (US$ 130 milhões, 4% do custo total). Na opção herbicidas – plantio direto são gastos US$ 135 milhões, cerca de 5% do custo total da produção.

Da mesma forma que com o calcário, não há gastos com estes insumos na produção orgânica (eles não podem ser utilizados neste sistema). Já nos sistemas de plantio direto e agroquímico, os gastos com pesticidas giram em torno de US$ 130 milhões cada um (2% do custo total).

3.1.4. Esterco

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

esterco (20%U)

0,03

0,00

579,67

Tabela 7. Esterco para os três tipos de Produção de soja (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Há um gasto de US$ 690 milhões com esterco no sistema orgânico. A vantagem é que este insumo provém de fontes de energia renováveis locais e, se usado corretamente, não acarretará problemas futuros para a natureza.

3.2. Serviços

3.2.1. Mão-de-obra

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

m.obra simples

13,44

0,00

638,40

m.obra qualificada

23,52

5,88

0,00

m.o. administrativa

53,93

53,93

53,93

Tabela 8. Força de trabalho nos três tipos de produção (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

A porcentagem mais significativa dos gastos de um sistema de produção orgânico encontra-se na mão-de-obra simples; 20% do custo total da produção e 66% do valor despendido com serviços. Isso pode ser explicado pelo fato de que as propriedades orgânicas são, em sua maioria, pequenas e a mão-de-obra é de origem familiar.

São US$ 600 milhões gastos a mais na opção orgânica do que nas outras duas. Pode ser feita uma estimativa de quantos empregos poderiam ser gerados com este montante. Se um trabalhador rural ganhar US$ 100 por mês, serão US$ 1200 por ano; dividindo-se US$ 600 milhões por US$ 1200, tem-se 500.000 novos empregos na agricultura.

Os sistemas convencional (agroquímico) e herbicidas (plantio direto) fazem maior uso de tecnologia mecânica e, por isso, os gastos são principalmente com a mão-de-obra administrativa, já que não existe uma necessidade do trabalho manual na lavoura. Mesmo assim, nestes 2 sistemas de produção, apenas 2% do custo total é destinado a esse tipo de mão-de-obra, e na opção orgânica, a porcentagem é de 1,7; nos três casos, o valor é da ordem de US$ 54 milhões.

3.2.2. Assistência técnica, Impostos e Taxas

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

assist. técnica

35,91

35,91

126,00

impostos e taxas

171,11

171,11

0,00

Tabela 9. Assistência técnica para os três tipos de produção (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Cada um dos sistemas, agroquímica e herbicidas, utiliza aproximadamente 4% do custo total para o pagamento de impostos e taxas. O valor é cerca de US$ 171 milhões para cada sistema. Na produção orgânica, os mesmos 4 % do custo total (US$ 126 milhões) são gastos com assistência técnica. (E não há despesas com impostos e taxas). Com estas observações, é possível perceber que a agricultura orgânica despende maior quantidade de dinheiro com o trabalho humano, e por isso, estimula o crescimento e econômico e social do país.

3.2.3. Transporte

 

Agroquímica

Herbicidas

Orgânica

 Itens

 

US$ milhões /ano

 

transporte/armazenagem

86,18

86,18

86,18

Tabela 10. Custos com transporte para os três tipos de produção (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Todos os três sistemas de produção de soja despendem US$ 86 milhões com o transporte dos grãos no período de um ano. Isto representa 2% do custo total para a opção herbicidas, 2% para a opção agroquímica e 2,7% para a opção orgânica.

3.2.4. Limpeza, Secagem e Estocagem>

Foi considerado que a soja produzida pelas três opções tecnológicas receberiam o mesmo tipo de beneficiamento em instalações de terceiros.

3.2.5. Tratamento de efluentes e médicos/riscos

Os valores para estes dois últimos itens finais da tabela apresentada está considerada 0,00 (zero) porque, hoje em dia, ainda não são cobrados efetivamente estes "impostos" dos produtores. Isto deverá ser feito futuramente, a fim de preservar a natureza.

3.3 Índices Emergéticos

Nomenclatura utilizada:

R

Recursos Naturais Renováveis

N

Recursos Naturais Não Renováveis

I = R+N

(representa a natureza)

M

Materiais

S

Serviços

F = M+S

(representa a economia)

Y = I+F

(representa o total)

3.3.1. Transformidade (Tr)

Tr = Y / Ep = S EMERGIAS usadas / energia do produto = { S (Ji * Tri)} / Qp

Onde: Ji é o fluxo de EMERGIA de cada um dos itens avaliados;

Tri é a transformidade de cada um dos itens avaliados.

A transformidade solar de um produto ou serviço é a emergia solar requerida para produzir uma unidade daquele recurso. Ela é expressa em emergia e é uma medida da posição do produto em termos de hierarquia energética. Hierarquia energética: Muitos joules de um tipo de energia são necessários para um processo de transformação que produz 1 joule de outro tipo de energia. A qualidade do primeiro tipo de energia é menor que a do segundo tipo. Isto significa que, aumentando a qualidade da energia, aumenta-se também a quantidade de emergia necessária para produzir o recurso.

Então, quanto mais transformações de energia existem contribuindo em um processo, maior é a transformidade do mesmo, ou seja, maior trabalho, da natureza ou do homem, foi empregado na produção do bem. Por isso um valor de Tr menor, significa menos desgaste do meio ambiente como um todo.

Soja Sistema Agroquímico

Soja Sistema Plantio Direto

Soja Sistema Orgânico

 

Em sej/J

 

171275

242841

141115

Tabela 12. Transformidade dos sistemas analisados (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

A transformidade da opção orgânica é muito menor que a transformidade da opção plantio direto; isto significa que a eficiência do sistema orgânico é maior, já que requer menos EMERGIA para produzir uma mesma quantidade de energia. Já a transformidade da opção agroquímica tem valor um pouco maior que a transformidade da orgânica, portanto a eficiência do processo orgânico é levemente maior do que a eficiência do convencional.

3.3.2 Taxa de Rendimento (EYR) (EYR = Y/ F)

A razão de Rendimento emergético é a relação entre a emergia total incorporada na produção (Y) e a emergia dos insumos (F) retro-alimentados pelo sistema econômico externo. É um indicador da emergia líquida que o sistema gera, pois fornece uma medida da habilidade do processo para explorar recursos energéticos locais provenientes da natureza, sejam renováveis ou não. As taxas típicas dos produtos agrícolas variam de 1 até 4. O valor mínimo é a unidade, que ocorre quando a contribuição da natureza é nula (R+N = 0). A diferença do valor unitário mede a contribuição do meio ambiente.

Agroquímico

Plantio Direto

Orgânico

1,57

1,15

2,51

Tabela 13. Taxa de Rendimento dos sistemas analisados (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

O valor de EYR da opção plantio direto é muito próximo da unidade (1,15), ou seja, a utilização dos recursos naturais em relação aos recursos econômicos (materiais e serviços) é baixa; este sistema acaba sendo pouco capaz de retro-alimentar a produção já que a maioria dos insumos são não renováveis (ex.: herbicidas, combustíveis, fertilizantes, pesticidas, etc.). Para a opção agroquímica o valor é um pouco maior (1,57), refletindo uma participação maior dos recursos naturais neste tipo de produção. Já para a opção orgânica, verifica-se um valor mais alto (2,51). A contribuição da natureza é muito maior que nos casos anteriores e, então, a contribuição ao sistema econômico é possível (incorpora recursos naturais renováveis). Esta característica beneficia o meio ambiente na medida em que acontece o processo de reciclagem (com a retroalimentação ou "feedback").

3.3.3 Taxa de Investimento (EIR)

EIR = F / I = recursos comprados / recursos gratuitos = economia / natureza

Este índice mede o investimento da sociedade para produzir certo bem em relação à contribuição da natureza; avalia se o processo usa adequadamente os recursos alocados. Um índice baixo indica que o ambiente provê mais recursos para o processo que a economia (materiais e serviços) e por isso, os custos de produção são menores. De acordo com Odum, este índice mede a intensidade do desenvolvimento econômico. Odum menciona que, em países desenvolvidos, o EIR tende a ser 7 ou maior em virtude da agricultura intensiva.

Agroquímico

Plantio Direto

Orgânico

1,77

6,80

0,66

Tabela 14. Taxa de investimento dos sistemas analisados (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Com este índice é possível ter uma visão clara da grande diferença existente entre os três sistemas de produção no que diz respeito ao investimento externo. Para a opção herbicidas – plantio direto este valor é extremamente alto, caracterizando uma agricultura intensiva que utiliza uma quantidade muito maior de insumos da economia (comprados) do que da natureza ("gratuitos"). A opção agroquímica mais uma vez apresenta um valor intermediário; utiliza somente pouco mais de recursos econômicos quando comparados aos recursos naturais. Porém, a agricultura orgânica apresenta este índice menor que a unidade. Isto quer dizer que este sistema é capaz de utilizar mais recursos gratuitos (naturais) do que recursos comprados (da economia). Desta forma, o investimento externo é menor e o custo da produção também.

3.3.4 Taxa de Carga Ambiental (ELR) ELR = (N + F) / R

Mede a proporção de recursos não renováveis em relação aos renováveis para um dado processo produtivo; é um indicador da tensão que a atividade produtiva analisada produz no ecossistema.

Agroquímico

Plantio Direto

Orgânico

3,87

8,86

1,02

Tabela 15. Taxa de carga ambiental dos sistemas analisados (FNP 2000; Agrorgânica).

O sistema de plantio direto utiliza uma quantidade de emergia de recursos não renováveis muito maior que a quantidade proveniente dos recursos naturais renováveis (8,86). Isto sobrecarrega o ecossistema, causando um grande impacto no meio ambiente. Esta taxa é um pouco menor na opção convencional (agroquímica), significando que o impacto ambiental reduz-se em relação ao sistema anterior. Mas, na agricultura orgânica este índice tem um valor muito próximo de um. Este fato vem confirmar a grande utilização dos recursos naturais renováveis neste sistema de produção; praticamente se usa a mesma quantidade de emergia de fontes renováveis e de fontes não renováveis. O impacto ambiental é bastante reduzido.

3.3.5 Porcentagem de Renovabilidade (% R) % R = 100* (R / Y)

Indica a porcentagem de energia que é derivada de fontes renováveis. Os sistemas com alto valor deste índice são mais sustentáveis.

Agroquímico

Plantio Direto

Orgânico

20,51%

10,14 %

49,61%

Tabela 16. Porcentagem de Renovabilidade dos sistemas (FNP, 2000 e Empresa Agrorgânica).

Apenas 10% dos recursos naturais utilizados no sistema de plantio direto provém de fontes renováveis. Portanto, 90% são provenientes de fontes não renováveis e isto significa que este sistema é insustentável. No sistema agroquímico a porcentagem é um pouco maior (20%) e o grau de sustentabilidade aumenta em relação ao sistema anterior. Já na opção orgânica metade dos recursos naturais são de fonte renováveis, o que confere a esse sistema um alto índice de sustentabilidade (50%). Este índice seria ainda maior se tivéssemos considerado o esterco utilizado como recurso natural renovável ao invés de insumo da economia urbana.

3.3.6 Taxa de Intercâmbio Emergético (EER) EER = Y / emergia $ recebido

O benefício emergético do comprador pode ser medido pelo EER, que compara a emergia contida no produto (Y) com a emergia paga por ele ($).

Agroquímico

Plantio Direto

Orgânico

2,76

3,91

1,86

Tabela 17. Taxa de Intercâmbio Emergético dos sistemas analisados (FNP, 2000 e Agrorgânica).

Este índice confirma a maior eficiência do sistema de produção orgânico, visto que é o mais bem recompensado dos três sistemas. A relação (emergia contida no produto/emergia paga)

é a menor, ou seja, é a opção que mais recebe (em dinheiro) pela emergia que contém seus produtos. A natureza é beneficiada porque não está sendo simplesmente explorada, há um retorno (monetário) que será reinvestido. Para o sistema convencional (agroquímico) 2,76 vezes mais energia foi entregue ao comprador do que a emergia do pagamento do produto e no sistema de plantio direto são 3,91 vezes mais emergia. Isto significa que o trabalho da natureza não é levado em consideração, não há uma preocupação cm um retorno para o ecossistema.

3.3.7. Conclusões a respeito da Análise Ambiental

Diante dessas observações, feitas à partir de uma análise dos Índices Emergéticos, é possível apontar a alternativa de cultivo que melhor utiliza a natureza e o trabalho humano. De acordo com os mencionados Índices, a opção orgânica é a mais recomendada, já que possui a menor das transformidades (requer menos emergia para produzir a mesma quantidade de energia), possui o maior EYR (alta utilização de recursos naturais quando comparados aos materiais e serviços), o menor EIR (alta utilização dos recursos da natureza), o menor ELR (a carga ou impacto ambiental é pequena), a maior porcentagem de renovabilidade (maior sustentabilidade) e o menor EER (mais bem pago pela emergia cedida no produto). Em seguida vem a opção agroquímica, e em último lugar, a opção herbicidas - plantio direto. Essas duas utilizam mais recursos da economia (EYR e EIR altos); causam grande impacto no meio ambiente (alto ELR), possuem baixa sustentabilidade (baixa porcentagem de renovabilidade). Tudo isso sem mencionar a baixa utilização de mão-de-obra devido ao uso intenso da tecnologia, impedindo a permanência do agricultor no campo. Uma discussão social é apresentada a seguir.

4. Considerações à respeito da dependência tecnológica:

A integração mundial, promovido pelo processo de globalização, fanorece uma minoria privilegiada, ou seja, apenas uma pequena parte da população com alto poder aquisitivo tem acesso às novas tecnologias, enquanto a grande maioria continua excluída, ignora o que ocorre e não participa dos processos de decisão. Há uma sedução pelo avanço a qualquer preço, sem a preocupação com as necessidades da população, sem descartar as bases de sustentação ecológica deste processo, que torna-o extremamente exclusivista e, portanto, incorreto. Este tipo de desenvolvimento já acorreu outras vezes no Brasil e parece se repetir com a implantação do cultivo de soja transgênica . Haverá pequena disponibilidade de empregos e a tecnologia continuará dominada por poucos, e o que é pior, por empresas multinacionais fornecedoras de matérias-primas e insumos para a produção agrícola. É necessário aproveitar as inovações técnicas sem deixar que elas dividam a sociedade; também aumentar a produção dos bens necessários à toda a população sem destruir o patrimônio natural, sem poluir o meio ambiente e de forma tal que haja participação do povo nesses processos.

No que se refere aos tipos de produção desse estudo:

  1. No sistema de plantio direto (herbicidas) existirá uma dependência maior de insumos externos, como por exemplo das sementes transgênicas e de herbicidas. Desta forma, é estabelecida uma dependência do produtor e do próprio país a estes insumos, ou seja, aos países que detém essa tecnologia. Haverá uma grande evasão de divisas e o(s) país(es) em questão não terão um mínimo de autonomia.
  2. No sistema agroquímico convencional, existe uma dependência menor que a do sistema plantio direto dos insumos, porém, maior que o sistema orgânico, que o torna insustentável.
  3. O sistema orgânico utiliza menos recursos da economia e mais recursos naturais renováveis, e garante com isso a sua sustentabilidade, isto é, a sobrevivência do produtor ao longo do tempo e a preservação da biodiversidade.

5. Considerações à respeito do tamanho das propriedades:

Considerando uma propriedade com extensão de terra de 32,5 hectares (as propriedades produtoras de soja consideradas pequenas variam entre 15 e 50 ha) com produção orgânica (P1) , outra propriedade de extensão de 300 ha (considerada de tamanho médio) com produção de soja agroquímica (P2) e uma propriedade de 3000 ha (grande) que produz soja através do método de plantio direto (P3),tem-se:

Figura 1: Comparação entre o tamanho das propriedades e sua rentabilidade econômica (curva cor-de-rosa) e sua renovabilidade (ou sustentabilidade) (curva verde).


Figura 2: Comparação entre o tamanho das propriedades e a quantidade de pessoas empregadas por hectare.

O(s) pontos(s) fora da(s) curva(s) representam uma propriedade de tamanho médio (300 ha) com produção orgânica; essa situação é mais difícil de ocorrer, porém existe e deve ser considerada. A renovabilidade de uma pequena propriedade orgânica é mais que o dobro de uma propriedade média convencional e mais que o triplo da renovabilidade de uma grande propriedade com plantio direto. A renovabilidade por hectare também segue esse comportamento, ou seja, além de causar um impacto menor na natureza (aproveitando seus recursos de maneira mais construtiva), a pequena propriedade orgânica possui uma rentabilidade por hectare maior do que a rentabilidade/ha das propriedades médias e grandes. Essa diferença entre a pequena propriedade orgânica (P1) e a média convencional (P2) e a grande com plantio direto (P3) fica mais acentuada quando leva-se em consideração o número de pessoas empregadas por hectare em cada uma das propriedades.

De acordo com a figura 2, a diferença é muito grande entre as pequenas propriedades orgânicas, que necessitam de mão-de-obra para realização das práticas agrícolas, e as grandes propriedades altamente mecanizadas (P3, por exemplo), onde esse número tende a zero. Isso significa o afastamento do trabalhador rural da terra por falta de empregos (êxodo rural) e acarreta todos os problemas sociais mencionados no livro recente de Cristovam Buarque (2000), resumidos no anexo 1.

É possível calcular a rentabilidade de cada uma dessas propriedades rurais da seguinte maneira:

P1

P2

P3

Tamanho (ha)

32,5

300

3000

Produtividade (kg/ha.ano)

2000

2800

2800

Produção anual (kg/ano)

65000

840000

8400000

Preço (US$/kg)

0,29

0,22

0,22

Vendas (US$/ano)

18850,00

184800,00

1848000,00

Rentabilidade

1,14

0,89

0,73

Lucro (US$/ano)

21489

164472

1349040

Tabela 18. Rentabilidade das propriedades de 32,5 ha (P1), de 300 ha (P2) e de 3000 ha (P3).
Fontes: FNP, 2000 e Hoffman, 2000.


Figura 3. Rentabilidade das propriedades (comparação entre a extensão de terra e o lucro obtido).

Grandes propriedades têm um lucro maior porque, com uma área maior, a produção também o será; porém essa análise leva em consideração a propriedade como um todo. Quando feita para cada hectare cultivado com soja, a situação se inverte (Figura 2).

5.1. Distribuição das propriedades e dos modos de produção nos três principais estados produtores de soja no Brasil

Estado 

Área média (ha)

% Área

Área (ha)

Paraná

7,8

0,61

16775

 

17,4

14,29

392975

 

45,3

24,26

667150

 

124,2

14,45

397375

 

280,5

46,39

1275725

Subtotal 1

 

100,00

2750000

Rio Gde Sul

8,04

44,75

1364875

 

153,71

55,25

1685125

Subtotal 2

 

100,00

3050000

Mato Grosso

32,5

14,00

315000

 

300

22,00

495000

 

3000

64,00

1440000

Subtotal 3

 

100,00

2250000

Tabela 19. Distribuição das propriedades e dos modos de produção de soja em SP, RS e MT.
Fontes: Man Yu, 1993; Farias, 1996; Roessing, 1996.

Áreas

milhões ha

%

De 0 a 4 ha

0

0

De 5 a 50 ha

 

2,75

34,25

De 50 a 300 ha

 

3,85

47,87

De 300 ou mais

 

1,44

17,89

Total da Área

 

8,05

100,00

Tabela 20. Área cultivada com soja no Brasil (ha), levando-se em consideração PR, RS e MT.


Figura 4. Área cultivada com soja no Brasil (ha), levando-se em consideração PR, RS e MT.
Fontes: Man Yu, 1993; Farias, 1996; Roessing, 1996.

6. Conclusões

Com base em todas as informações anteriores é possível afirmar que a melhor opção a ser adotada no Brasil é a pequena propriedade com cultivo orgânico, que mantém o agricultor no campo, possibilita a ele (e à sua família) uma rentabilidade que garante um padrão de vida aceitável; possibilita também uma relação saudável para ambas as partes, homem e natureza, onde a utilização dos recursos é feita de maneira moderada e consciente, sem desperdícios e com reaproveitamento (reciclagem) de muitos materiais. Para isso é necessário que se estabeleça uma reforma agrária, na qual as grandes e médias propriedades improdutivas sejam transformadas em pequenas ou médias propriedades com cultivo orgânico (de soja ou de outros produtos para subsistência ou venda) onde as famílias possam morar, trabalhar e produzir bens (alimentos e outros) de forma sustentável.

Além de se favorecer a permanência do homem no campo, também é importante que se estimule a adoção do modo de produção orgânico através da diminuição de impostos (espécie de prêmio) pela preservação da natureza e reciclagem dos materiais. Outra atitude adequada é estabelecer a cobrança de uma sobretaxa para os produtores cujo modo de produção prejudica a natureza e põe em risco a qualidade de vida do planeta para as gerações futuras.

Observação: Do apêndice 9.2, tem-se que 90% das propriedades dos EUA variam de 30 e 300 ha, ou seja, não são necessárias grande extensões de terra para ter-se grandes produções com boa rentabilidade.

7. Referências Bibliográficas

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