‘Não há universidade sem pensadores e sem tomadas de posições sobre os problemas sociais’, defende Jorge Bento
Professor da Universidade do Porto encerrou participação como cientista residente do IdEA com palestra na FCA
“Não há universidade sem pensadores e sem tomadas de posições sobre os problemas sociais. A universidade não premeia hoje pensar o desconhecido e o impensado. Ao invés, penaliza quem pensa. Está prisioneira do relativismo, do senso-comum e do niilismo e ausente da humanidade e da sociedade. Logo, está cometendo um crime contra si mesma.”
Com uma conversa sobre os rumos atuais da universidade e seu papel na sociedade, o professor português Jorge Olímpio Bento, da Universidade do Porto, encerrou sua participação no Programa “Cesar Lattes” do Cientista Residente, do Instituto de Estudos Avançados (IdEA) da Unicamp. O encontro, que foi acompanhado por docentes, alunos e funcionários, ocorreu no dia 25 de setembro na Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA).
Bento é um intelectual da área das ciências e pedagogia do esporte, defensor de uma abordagem que valoriza a função do esporte na formação de cidadãos, no fomento dos valores educacionais e do desenvolvimento humano. Seu trabalho busca estabelecer o esporte não apenas como prática física, mas como forma de promover a cultura e o conhecimento crítico sobre o mundo.
Em sua palestra na FCA, Bento falou sobre a importância da preservação do papel civilizatório das instituições de ensino superior em tempos de múltiplas crises – ambiental, econômica, política, ética, humanitária etc. Ele alertou para as ameaças do modelo neoliberal e da lógica capitalista à produção de conhecimento relevante para a transformação social e para a construção de futuros possíveis, nos quais estejam presentes mais justiça e igualdade social.
Ao final de sua fala, o professor deixou um recado para a comunidade universitária. “Entendo que devemos ter muito orgulho do nosso ofício, ou dos ofícios da nossa profissão. E um dos ofícios da nossa profissão é sermos intelectuais. Estamos em uma casa que é a casa da intelectualidade, da espiritualidade, da inteligência, da razão, e devemos estar comprometidos em preservar esse patrimônio. Preservá-lo e aumentá-lo para a humanidade, para a sociedade e para a comunidade.”
Segundo o professor, o desempenho desse ofício [intelectual] implica vigilância e disponibilidade para fazer propostas em defesa da universidade, da sociedade e da comunidade. “E esta casa, a Universidade, deve estar, tem que estar – ainda que talvez não fisicamente – no centro da cidade. Tem que estar na acrópole da sociedade. Tem que estar no centro da pólis, no lugar dos bancos, como uma catedral gótica, com seus vitrais flamejantes, iluminados com a luz do espírito, com a luz das nossas ideias, com a luz dos nossos ideais, com a luz das nossas utopias”.
Bento enfatiza a obrigação de defender a instituição e contribuir para que encontre pleno reconhecimento dentro da sociedade. “E, para isso, façam o favor de tentar ser felizes. Façam o favor de irradiar luz. Façam o favor de contagiar os outros. Façam o favor de caminhar de cara levantada, de braços ao alto e com os olhos fitos nas estrelas.”
Residência científica
A programação de Bento no IdEA contou com outras duas palestras, além de participação em aulas e interação com pesquisadores, professores e alunos. A primeira palestra foi “Lusofonia, bússola para outros futuros possíveis”, no dia 13 de setembro, no Auditório Raízes, da Diretoria Executiva de Direitos Humanos (DeDH). No dia 16, o docente português esteve na Faculdade de Educação Física (FEF) para a apresentação “Esporte, sociedade e futuro”, com foco no papel social do desporto e suas raízes históricas.
Graduado em educação física pelo Instituto Nacional de Educação Física de Lisboa (1972) e com doutorado em pedagogia pela Ernst-Moritz-Arndt-Universität de Greifswald, da Alemanha (1982), Bento ingressou como docente na Universidade do Porto em 1976, onde se aposentou depois de 40 anos de trabalho. No Porto, foi assessor de projetos de integração com os países lusófonos e pró-reitor de relações internacionais (1995-1998).
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