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Por unanimidade, Unicamp aprova adoção de Cotas Trans

As vagas serão disponibilizadas no Edital Enem para pessoas que se autodeclaram trans, travestis ou não-binárias

A proposta levada ao Consu foi resultado da articulação entre movimentos sociais, como o Ateliê TransMoras e o Núcleo de Consciência Trans (NCT), discentes da Unicamp e a Reitoria; comemoração após a aprovação das cotas trans
A proposta levada ao Consu foi resultado da articulação entre movimentos sociais, como o Ateliê TransMoras e o Núcleo de Consciência Trans, discentes da Unicamp e a Reitoria; comemoração após a aprovação da proposta

Por unanimidade, o Conselho Universitário da Unicamp (Consu) aprovou, na tarde desta terça-feira (1), a instituição do sistema de reserva de vagas em cursos de graduação para pessoas que se autodeclaram trans, travestis ou não-binárias. As vagas serão disponibilizadas no Edital Enem-Unicamp e vão permitir a participação tanto de candidatos de escolas públicas quanto privadas.

O modelo prevê que os cursos com até 30 vagas regulares deverão ofertar, no mínimo, uma como vaga regular ou adicional para essa população. A modalidade fica a critério da congregação da Unidade. No caso de vaga extra, não haverá necessidade de preenchimento obrigatório.

Já os cursos com 30 ou mais vagas deverão ofertar duas vagas, podendo ser regulares ou adicionais. Quando não forem adicionais, essas vagas serão subtraídas das vagas de ampla concorrência existentes no sistema Enem-Unicamp. O modelo define ainda que metade das vagas serão distribuídas atendendo aos critérios das cotas para pretos, pardos e indígenas (PPI).

O processo de seleção dos candidatos inclui autodeclaração na inscrição, com base no preconizado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, haverá exigência de um relato de vida, modelo já utilizado em outras Instituições de Ensino Superior (IES). Esse relato será submetido a uma comissão de verificação.

Segundo dados da Comissão Permanente para os Vestibulares (Comvest), no Vestibular 2025 da Unicamp, houve 279 candidatos inscritos com nome social. Destes, 40 foram convocados. Os cursos mais procurados foram Artes Visuais, Ciências Biológicas e Medicina.

Após cinco anos da abertura das primeiras vagas, será realizada uma análise dos resultados da política.

A proposta levada ao Consu foi resultado da articulação entre movimentos sociais, como o Ateliê TransMoras e o Núcleo de Consciência Trans (NCT), discentes da Unicamp e a Reitoria, a partir de acordo firmado na greve discente de 2023. “Trata-se de mais um momento histórico para nossa Universidade”, disse o professor José Alves Neto, coordenador da Comvest e integrante do  Grupo de Trabalho (GT) que formulou a proposta. Segundo ele, dos 15 integrantes do GT, sete são pessoas que se definem como trans.

O coordenador da Comvest e integrante do  Grupo de Trabalho (GT) que formulou a proposta, José Alves Neto: políticas de ações afirmativas
O coordenador da Comvest e integrante do  Grupo de Trabalho (GT) que formulou a proposta, José Alves Neto: políticas de ações afirmativas

De acordo com o grupo, a proposta alinha-se às políticas de ações afirmativas implementadas nos últimos anos na Universidade e com sua política de direitos humanos. Segundo o GT, a ação justifica-se também a partir dos dados relacionados à situação de exclusão do ensino superior enfrentada pela população de pessoas trans no Brasil, decorrente da condição de violência enfrentada por esse grupo social. Hoje, 13 universidades federais ou estaduais contam com esse tipo de sistema de acesso à graduação.

Mulher trans, negra e estudante de Ciência Sociais da Unicamp, Luara Souza lembrou de pessoas trans que morreram em consequência da violência e da intolerância. Citou casos de suicídios e assassinatos que, segundo ela, foram consequência direta do que chamou de “transfobia estrutural” no Brasil.

Representante discente no Consu, Rayan Gabriel Rodrigues disse que a implementação das cotas deve ser encarada como parte de um processo de reparação. “As cotas abrem portas, e a Unicamp já transacionou”, disse.

A professora Ana Bentes leu um manifesto do Grupo Unicamp em Movimento. “O país e o mundo vivem uma encruzilhada civilizatória”, diz o documento. “Por todos os lados, a intolerância e a violência como método político e opressão se espalham. E temos visto isto de perto”, acrescentou ela, referindo-se ao ataque sofrido pela Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) na segunda quinzena de março, quando extremistas de direita invadiram e vandalizaram o Instituto. “Mas nossa Universidade tem histórico e orgulho em sua luta pela democracia”, alertou.

Representante discente no Consu, Rayan Gabriel Rodrigues (no destaque à esquerda) e a estudante de Ciência Sociais, Luara Souza durante comemoração da aprovação das cotas
Representante discente no Consu, Rayan Gabriel Rodrigues (no destaque à esquerda) e a estudante de Ciência Sociais, Luara Souza durante comemoração da aprovação das cotas

Diversidade de gênero

O relatório do GT informa que o tamanho dessa população ainda não é conhecido por meio de dados oficiais no Brasil. Um estudo de 2021, com uma amostra representativa da população adulta brasileira, apontou que cerca de 1,9% se identificou como tendo diversidade de gênero. Desses, 0,69% identificaram-se como transgêneros, enquanto 1,19% identificaram-se como pessoas de gênero não-binário.

Assim, com base na população adulta brasileira à época da coleta de dados, estima-se que cerca de 1,09 milhão de brasileiros podem se identificar como transgêneros e 1,88 milhão como pessoas de gênero não-binário, totalizando quase 3 milhões de pessoas com diversidade de gênero no país.

O GT informa ainda que estudos realizados em eventos de Orgulho LGBT em diversas capitais do país, ao longo dos anos 2000, indicam que 95% das pessoas trans disseram ter vivido pelo menos uma situação de discriminação ou agressão motivada por sua identidade de gênero.

Ainda, estudo transversal com 602 travestis e pessoas transexuais em sete municípios do estado de São Paulo, entre 2014 e 2015, citado no GT, identificou que a maioria tinha cor da pele preta ou parda e idade entre 25 e 39 anos; até o Ensino Médio completo e renda individual de até dois salários-mínimos; cerca de 1/4 dessa população já foi presa e em torno de 1/4 fazia tratamento para HIV.

Por unanimidade, Unicamp aprova adoção de Cotas Trans
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