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Do primeiro giz a uma vaga no ensino superior

Cursinho pré-vestibular da FCA abre portas para estudantes de baixa renda de Limeira

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Ilustra: LPAlgumas pessoas nascem com o direito à educação superior garantido, mas no Brasil, grande parte precisa esperar a fase adulta para saber se terá ou não condições de pisar uma sala de aula na graduação e parte da população jovem nem sempre considera a possibilidade de se profissionalizar. Dentro desta realidade, nasce o Colmeia, cursinho pré-vestibular da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, em Limeira, que em 2018 teve mais de 60 alunos aprovados em vestibulares de universidades brasileiras. Projeto de extensão da Unicamp, em parceria com a Prefeitura de Limeira, o Colmeia tem como proposta ampliar o acesso de estudantes de baixa renda, em instituições de ensino superior públicas e no Prouni. A preparação é voltada exclusivamente para alunos oriundos da rede pública de ensino.

“A proposta é trabalhar como uma colmeia, um trabalho coletivo, que tente respeitar as diferenças, viabilize a inclusão, tenha amorosidade e estimule a capacidade crítica”, explica a professora Josely Rimoli, idealizadora e coordenadora do cursinho ao lado professor Marcelo Maialle e o colégio gestor. O projeto começou em 2009 com um giz; em uma semana, tinha uma caixa completa e hoje tem 350 alunos por ano. De acordo com a professora, foi preciso abrir sala extra, em resposta à crescente demanda.

Num momento em que várias pesquisas apontam que o número de jovens brasileiros fora da sala de aula atinge a casa dos 50%, Josely e outras abelhas se juntam às centenas de cursinhos populares espalhados pelo Brasil para reverter as estatísticas e mais: mostrar à comunidade de Limeira, que a Universidade é um espaço a ser frequentado, seja como aluno ou como membro da comunidade.

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A professora Josely Rimoli, idealizadora e coordenadora do cursinho: “A proposta é trabalhar como uma colmeia, um trabalho coletivo”

Professora e pesquisadora da área de saúde coletiva na Unicamp, logo no primeiro vestibular da FCA, em 2009, Josely observou a baixa representatividade de jovens de Limeira. Na disciplina ética e cidadania, após a reflexão sobre as dificuldades de acesso de jovens de baixa renda ao ensino superior, um aluno sugeriu a criação de um cursinho pré-vestibular”. A docente apoiou a ideia, solicitou parcerias e obteve a aprovação de um projeto de Extensão.

“Em uma disciplina de Extensão Comunitária, em conjunto com a professora Marta Fuentes Rojes, realizamos um diagnóstico participativo sobre problemas sociais na região onde se localiza a FCA-Unicamp e a falta de atividades para adolescentes e jovens foi apontado como o maior problema regional”. De acordo com Josely, matricularam-se assistentes sociais, educadores e psicólogos, funcionários municipais, que colaboraram para obter autorização para utilizar um espaço físico público para o Colmeia.

Nos primeiros anos, entre as características favoráveis para atrair adolescentes e jovens para o cursinho está o fato de as aulas acontecerem no Centro Comunitário do Morro Azul, local frequentado por pessoas das comunidades ao redor do campus. Futuramente, muitos se tornaram alunos do Colmeia e hoje estão na graduação e alguns na pós-graduação.

Algumas relações continuam em salas de ensino superior ou pelo campus de Limeira, onde Josely leciona em vários cursos. “É uma satisfação encontrar um ex-aluno do Colmeia, em uma das disciplinas da graduação”, declara Josely. “Eu sei que posso encontrar a professora neste lugar e passo para cumprimentá-la”, diz Gustavo Andrade, aluno do primeiro ano do curso de administração pública da FCA e ex-aluno do Colmeia. E se a lembrança parte de outros cursos e outros campi, ela se alegra na mesma proporção: “Fico muito feliz em ver que tem alunos no Instituto de Artes, nas engenharias, na saúde, nas humanas. Muitos me procuram para contar que são professores em cursinho popular na cidade onde estudam”.


De um giz à lista de aprovados

O primeiro giz foi usado primeiramente num grupo de estudos, conforme Josely. “Éramos honestos. No começo era um grupo de estudos, até pelo número de alunos. Em 2013, foi instituído como cursinho pré-vestibular, Colmeia – jovens construindo seus projetos de futuro com apoio da Unicamp e da Prefeitura”. Não demorou muito para que a coordenadora topasse o desafio do professor da Faculdade de Educação da Unicamp, então secretário de Educação de Limeira, José Claudinei Lombardi, o “Zezo”, de ampliar de 50 para 200 vagas.

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Gustavo Andrade, estudante da Unicamp e ex-aluno do Colmeia: feliz por ter colegas em todas as áreas

Com a ampliação, aumentaram também as chances de Chauanna de Lima, Kelvin Lima, Gustavo Andrade e Nathalia Costacurta estudarem no Colmeia e hoje ocuparem uma cadeira na graduação da Unicamp. “Eu não tinha perspectiva. Todas as pessoas com as quais eu tinha contato cursavam faculdade particular, ninguém falava sobre Unicamp, a gente ficava naquele mundinho fechado porque a gente não tem acesso, principalmente quem é de baixa renda não sabe direito o que é a Unicamp. Comecei a procurar e vi no site da Prefeitura de Limeira que tinha o cursinho Colmeia; me cadastrei e passei na prova do meio do ano para fazer semi-intensivo em 2015”, declara Chauanna Lima, aluna segundo ano de midialogia na Unicamp.

A iniciativa também proporcionou a primeira experiência como professor a José Diego Gobbo Alves, que não fez graduação na Unicamp, mas, como pós-graduando em ciências sociais, pode participar da capacitação e outros jovens. “Aqui no Colmeia, cada dia é diferente para o professor. O cursinho não é só voltado para pré-vestibular. Apesar de ser nosso foco, ele é importante também para a gente pensar como esses alunos estão aprendendo, quais são os conhecimentos que existem e como a gente pode contribuir de forma reflexiva sobre a nossa realidade principalmente na geografia, que é uma disciplina que eu considero bem crítica sobre espaço, meio ambiente e as relações”.

A graduanda de Nutrição, Laura Galvão não estudou no Colmeia, mas se apressou em concorrer a uma vaga para atuar como monitora no cursinho assim que viu sua aprovação na Bolsa de Auxílio Social (BAS) do Serviço de Apoio ao Estudante. O motivo está em sua ligação com a natureza dos cursinhos populares. “Estudei num cursinho popular da Embraer, em São José dos Campos. Procurei o Colmeia porque é uma forma de fazer o que fizeram por mim.”

Chauanna também não abriu mão de trabalhar como bolsista no Colmeia. “Eu poderia optar por uma bolsa na área de Comunicação Social, mas não consigo viver longe do Colmeia”, enfatiza a aluna de midialogia, um dos mais concorridos da Unicamp.

Andrade atuava como modelo quando tomou a decisão de participar do processo seletivo do Colmeia, depois de ouvir um amigo falar sobre o projeto. “Eu não pensava em fazer graduação, mas soube que em Limeira tinha este cursinho. O que me atraiu para o Colmeia foi o intuito de eu passar no ensino superior, porém eu não me sentia qualificado suficiente; eu precisava estudar porque me formei em 2013”.

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Chauanna de Lima, aluna de Midialogia: novos horizontes

Nathalia Costacurta, aluna de Administração na FCA, declara que encontrou um mundo totalmente diferente no Colmeia. “Eu não tinha condições de participar de um cursinho particular e acredito que grande parte das pessoas que querem prestar uma universidade pública não tem este poder aquisitivo. Quando passei na prova do Colmeia, vi um mundo totalmente diferente, pude abrir minha mente, principalmente pelas pessoas que ali estavam presentes, me acompanhando.”

A Unicamp é presente na vida de Kelvin Lima, desde a infância, ou melhor, na vida do pai de Kelvin. Desde que a Universidade descobriu uma doença de difícil diagnóstico do pai, ele decidiu que se empenharia em ser aprovado no Vestibulinho para o Colégio Técnico de Limeira e da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA). Por meio do Colmeia, ele conseguiu ser aprovado no curso de engenharia de manufatura da referida faculdade. “Para mim, é a realização de um sonho. Agora, quero buscar intercâmbio e fazer pós-graduação.”

Apesar de comemorar seus feitos na universidade pública, Kelvin acredita que o Colmeia, assim como outros cursinhos populares têm papel fundamental na sociedade a partir do momento em que inserem ou reinserem jovens adultos em salas de aula de universidades tanto públicas quanto particulares. “Esta é a ideia do Colmeia, que as pessoas estudem, independente da faculdade.”

Para alguns, o projeto ainda é o fomentador de bons sonhos, de futuro promissor no aspecto da formação acadêmica e humana. Higor Santiago e Natália Rodrigues sabem disso e querem estar na graduação em algum lugar do país. “Quero ser engenheiro químico. Acho que o Colmeia pode me ajudar a passar numa universidade pública”, diz Santiago.

Natália pretende ser arquiteta e acredita que com empenho e o apoio dos professores do projeto, pode conquistar seu sonho. Segundo a aluna do cursinho, a renda familiar conta somente com o salário da mãe para pagar aluguel e a escola da irmã mais nova. “Se eu não estivesse no Colmeia, teria de estudar em casa ou procurar um cursinho particular, mas seria difícil para minha mãe pagar.”

Assim como na casa de Natália, os pais de Higor não possuem nível superior, apesar do incentivo para estudar. Incentivados pelo Colmeia, eles serão os primeiros a frequentarem um curso superior. Para Chauanna, uma das caraterísticas importantes em projetos de extensão como o Colmeia é formar espelhos na comunidade de Limeira e atrair a sociedade para o campus. “Eu acredito nos programas de ações afirmativas. Acho que é uma forma de realmente de ter um espelho porque muitas crianças e adolescentes que a gente tem contato diariamente não têm a noção da dimensão do que existe além do mundo delas. Às vezes, o menino não tem espelho no bairro.”

Foto: Reproudção
Laura Galvão, aluna de nutrição: oportunidade na monitoria

O professor Alves acredita que o Colmeia, assim como outros cursinhos populares, tem papel fundamental na sociedade a partir do momento em que inserem ou reinserem jovens adultos em salas de aula de universidades, tanto públicas quanto particulares. “O papel dos professores do cursinho é fazer com que esses alunos tenham oportunidade que não teriam sem o Colmeia de entrar em uma universidade pública ou privada também, porque não é demérito nenhum estudar em faculdade privada.

O crescimento dos monitores do Colmeia – alunos bolsistas da Unicamp – chama a atenção da assistente social do Serviço de Apoio ao Estudante Patrícia Zanetti. “É uma alegria receber um aluno da Unicamp no SAE e ele dizer: ‘Estudei no Colmeia’. Eles têm uma experiência não só de aprendizado, mas de um aprendizado social de parceria com a prefeitura, de parceria com a universidade. Os nossos bolsistas que atuam no Colmeia se dedicam muito e eles querem estar no Colmeia. Porque querem mudar esta história. E é uma história que vem mudando Limeira”. 

"Fomos constituindo um grupo com professores de diversos cursos da FCA, graduandos e pós-graduandos e, aos poucos, também agregamos estudantes da Faculdade de Tecnologia (FT) de Limeira, o que nos agrada muito, pois achamos que temos de unir as várias faculdades daqui. No nono ano, nós já consolidamos indicadores demonstrando que de fato o cursinho contribuí para o acesso no mercado de trabalho e no ingresso de nossos estudantes em boas universidades públicas e gratuitas”, arremata Josely.

Veja vídeo sobre o projeto

 

Imagem de capa JU-online
Sala de aula do Colmeia, cursinho pré-vestibular da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp | Foto: Divulgação

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