O Cepagri e a divulgação de informações meteorológicas

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É muito difícil encontrar, atualmente, alguma atividade humana que não necessite da previsão do tempo e não a utilize com frequência para tomar decisões, das mais simples às complexas e estratégicas. Isto se deve à evolução significativa da meteorologia ocorrida nas décadas mais recentes, principalmente a partir da segunda metade dos anos 90, justificada por vários motivos. Dentre eles, podem ser mencionados o maior cuidado com a divulgação das previsões de tempo e clima e a ampliação da utilização dos dados e imagens adquiridos pelos satélites meteorológicos.

Em termos computacionais, a previsão do tempo é um desafio comparável às simulações do cérebro humano e da evolução do Universo primitivo, segundo artigo publicado em 2015 na revista Nature (Bauer et al., 2015). Entretanto, de nada adianta todo o esforço de utilização de supercomputadores, de emprego de modelos numéricos complexos, de assimilação de grandes quantidades de dados meteorológicos e de análises por previsores experientes no assunto se a divulgação das previsões não for bem-feita e não alcançar o maior número possível de interessados de forma precisa, ágil e didática. Uma divulgação malfeita, além de desperdiçar o sofisticado trabalho necessário para prever o tempo e o clima, ainda pode confundir os usuários e colocar em descrédito áreas do conhecimento tão importantes para a sociedade atual, como o são a meteorologia, a climatologia, a física, a computação, a matemática e o jornalismo, entre outras.

Se antes a previsão do tempo tinha elevado nível de incerteza e só aparecia no noticiário quando havia algum evento extremo, esse tipo de informação foi gradativamente ganhando espaço nos jornais impressos, programas das rádios e, principalmente, na televisão, expressa na duração dos boletins meteorológicos, horário em que eles são apresentados, pela elevada qualidade das animações e gráficos exibidos e pela presença de jornalistas especializados no assunto.

O advento da internet tem um papel fundamental na divulgação da previsão do tempo, pois deu a agilidade, a acessibilidade e a qualidade visual que essa área necessitava. É lógico que, no início da internet comercial no Brasil, o número de pessoas que tinha acesso à rede ainda era pequeno; mas ao tornar a informação meteorológica publicamente disponível, ela acabava chegando aos interessados, muitas vezes, de forma indireta. Era comum ver os dados e informações já disponíveis na internet afixados em murais, publicados nos jornais impressos ou transmitidos nas rádios ou na televisão. 
A Unicamp, por meio do seu sistema de Centros e Núcleos de Pesquisa Interdisciplinar representado pelo Cepagri (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura), tem uma participação fundamental na popularização da previsão meteorológica. A instituição foi uma das primeiras no Brasil a ter uma página na internet sobre meteorologia e climatologia.

A primeira página do Cepagri entrou em operação no dia 16 de maio de 1995, mesmo mês em que a Empresa Brasileira de Telecomunicações (Embratel) lançou definitivamente o serviço de internet comercial no Brasil. O objetivo da página era disponibilizar dados gerados rotineiramente no Centro. Dentre estas informações, destacam-se o boletim meteorológico, as imagens de satélites meteorológicos em parceria com o Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), as imagens de radares meteorológicos em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e mapas e dados de planejamento agrícola em parceria com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Todos esses dados eram atualizados diariamente ou várias vezes ao dia.

Havia um segundo bloco de informações que não eram atualizadas com tanta frequência por serem referentes à descrição do Centro, suas atividades de pesquisa, seu corpo técnico e administrativo e os respectivos contatos. Precedendo estes dois blocos de informações, eram apresentadas as condições agrometeorológicas de Campinas (temperatura, umidade relativa, pressão atmosférica, chuvas e velocidade e direção dos ventos), atualizadas a cada 10 minutos e contendo também os valores extremos do dia (máximas, mínimas e totais). Estes dados eram (e ainda são) adquiridos por uma estação meteorológica automática instalada no campus da Unicamp em Barão Geraldo. Este serviço sempre foi um diferencial da página do Cepagri, sendo de grande utilidade para a defesa civil e os órgãos de imprensa.

Um serviço que antes dependia de contato pessoal ou telefônico passou a ficar disponível para todos que tinham acesso à internet. Quando a página foi ao ar, imaginamos que os contatos telefônicos, pessoais e eletrônicos diminuiriam. Mas aconteceu exatamente o contrário: o número de usuários foi ampliado e, principalmente, diversificado de forma substancial. Antes da página, os contatos eram feitos principalmente por jornalistas, técnicos da defesa civil, pessoas ligadas ao agronegócio e por professores, alunos e pesquisadores da Universidade. De fato, neste período, as portas do Cepagri ficavam literalmente abertas para que as pessoas tivessem acesso aos boletins afixados nos murais e às imagens de satélites e de radares meteorológicos recebidas e exibidas automaticamente nos sistemas de aquisição existentes no Cepagri desde os anos 1980.

Os novos contatos eram principalmente para tirar dúvidas, já que a página na internet era algo novo para grande parte dos usuários e interessados. Ressalta-se que as imagens de satélites, hoje tão populares, eram praticamente de acesso restrito às instituições que tinham um equipamento de recepção e tratamento. Neste caso, é importante destacar que o Cepagri possui sistemas de aquisição de dados e imagens de satélites meteorológicos desde 1985, iniciando com a UAI-R (Unidade de Análise de Imagens – Remota) da Engespaço, desenvolvida pelo INPE. Este foi um dos nove sistemas instalados no Brasil e o último a ser desligado, em 1997, quando a unidade mestre do INPE parou de funcionar. O advento da internet viabilizou a recepção de imagens através da rede,  sem necessitar de linhas telefônicas e linhas de dados dedicadas, caras e lentas.

A propósito, o Cepagri já instalou outros três sistemas de recepção de imagens de satélites, com antenas próprias, no campus da Unicamp. O mais recente, instalado em outubro de 2018, recebe imagens e dados do satélite meteorológico de última geração GOES-16, tendo sido um dos dois primeiros instalados no Brasil, quase simultaneamente ao da Defesa Civil de Santa Catarina. Os dois sistemas anteriores recebiam imagens dos satélites meteorológicos da série AVHRR-NOAA (Advanced Very-High Resolution Radiometer – National Oceanic and Atmospheric Administration). Todos os dados recebidos estão armazenados no Cepagri e têm sido utilizados em trabalhos de pesquisa, dissertações e teses, gerando conhecimento e auxiliando na formação de recursos humanos de qualidade elevada em uma área estratégica para o país, o monitoramento da superfície terrestre. 
 

Composição com três imagens de satélite que mostram nuvens e um mapa do Brasil.
O Cepagri, por meio de seu site na Internet, teve uma participação fundamental na popularização da previsão meteorológica (Foto: Cepagri)

O número de acessos à página do Cepagri foi crescendo de forma gradativa e consistente, consolidando-a como uma referência na área, reconhecida com vários prêmios, principalmente nos primeiros anos após sua criação, quando eram comuns os concursos entre páginas na internet. Os acessos cresciam - e ainda crescem - significativamente antes ou após a ocorrência de algum evento extremo, o que aumentava ainda mais as consultas por telefone, eletrônicas e pessoalmente. Nos últimos anos, esses contatos pessoais diminuíram, porque há um maior conhecimento das informações sobre meteorologia e clima disponíveis no site do Cepagri.

O foco da página do Cepagri sempre foi disponibilizar dados relacionados com a meteorologia e a climatologia, principalmente para as áreas de agricultura, defesa civil e turismo, sem a necessidade de acessar páginas intermediárias até chegar às informações que realmente interessam aos usuários. Também houve um cuidado muito grande com a qualidade gráfica da página para que ela fosse visualmente agradável e moderna.

Outra inovação do site do Cepagri foi, desde o início, adotar uma linguagem acessível ao maior número de usuários. Um ponto relevante é que a página nunca parou de funcionar, tendo apenas interrupções breves para ajustes e resolução de problemas técnicos. Este sempre foi um grande desafio em uma unidade de pesquisa que não foi planejada para trabalhar de forma operacional e ininterrupta e que, por isso, nunca teve equipes de plantão preparadas e especializadas. Contou-se, sempre, com a dedicação, o empenho e o profissionalismo das pessoas envolvidas, que conheciam sua responsabilidade e a importância do trabalho que realizavam para a sociedade e para as demais atividades do Centro.

Ao longo da história do Cepagri foram criadas várias parcerias com instituições como o INPE (imagens de satélites meteorológicos), a Unesp (imagens de radares meteorológicos) e o IAC (monitoramento agrometeorológico). Algumas delas surgiram especificamente relacionadas ao desenvolvimento da página do Cepagri na internet. Neste caso, a principal parceria foi estabelecida em 2002, com a Embrapa Agricultura Digital (antiga Embrapa Informática Agropecuária), para desenvolvimento do sistema de monitoramento agrometeorológico Agritempo. Enquanto o foco da página do Cepagri é a Região Metropolitana de Campinas (RMC) e o estado de São Paulo, o Agritempo abrange todo o Brasil, disponibilizando produtos de monitoramento agrometeorológico e climático para cada estado do país. Logicamente, o desenvolvimento deste sistema tem aproveitado, desde o seu início, a longa experiência do Centro na prestação de serviços nas áreas de meteorologia e climatologia por meio da internet.

No caso específico do INPE, a política de fornecimento amplo e aberto de dados e informações meteorológicas e climáticas, adotada especialmente pelo Centro de Previsão de Tempo e Clima (CPTEC), têm auxiliado significativamente áreas como a agricultura, a defesa civil, o turismo, a geração de energia, a hidrologia, entre outras.

Além da página na internet, o Cepagri está presente também em mídias sociais como o Facebook, o YouTube, o Instagram e o Twitter, procurando acompanhar a evolução da comunicação para o bem-estar da sociedade e o desenvolvimento do país. Na página do Cepagri também são divulgadas as atividades realizadas pelo Centro em todas as suas áreas, fortalecendo suas linhas de pesquisa, abrindo novas e tornando o Cepagri mais conhecido e próximo da sociedade.

Isso se reflete na preocupação da população com as mudanças climáticas, especialmente com os eventos extremos e seus impactos, algo que temos percebido há vários anos e que tem motivado várias iniciativas no Centro. Outro exemplo é o processamento de séries temporais de imagens de satélites, especialmente os meteorológicos, um serviço de grande utilidade para o monitoramento agrícola de um país de dimensões continentais como o Brasil.
Passados 27 anos, é possível constatar a relevância da interação estabelecida com os mais variados tipos de usuários e da prestação de serviços realizada através da página do Cepagri na internet para o desenvolvimento das suas principais atividades, a pesquisa e a formação de recursos humanos de alto nível. Este tipo de iniciativa ilustra muito bem a importância do estabelecimento de uma relação estreita e equilibrada entre as atividades de extensão, pesquisa, e formação de recursos humanos nas instituições de ensino e pesquisa, como tem sido o caso do Cepagri.

 

Referência
Bauer, P.; Thorpe, A. & Brunet, G. The quiet revolution of numerical weather prediction. Nature 525, 47–55 (2015).

*Jurandir Zullo Júnior possui graduação em Matemática Aplicada (1985) e Engenharia Agrícola (1987), mestrado em Pesquisa Operacional (Departamento de Matemática Aplicada - 1990) e doutorado em Engenharia de Computação e Automação (Faculdade de Engenharia Elétrica - 1994), todos pela Unicamp. É pesquisador do Cepagri desde 1987, tendo sido diretor do Centro de agosto de 2002 a agosto de 2008.

Esse texto é um artigo de opinião e não reflete, necessariamente, a opinião da Unicamp.

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