Em função da pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), responsável pela Covid-19, muitas instituições, dentre elas escolas, universidades, academias, estádios, ginásios esportivos e empresas, interromperam suas atividades e, consequentemente, as instalações sanitárias como banheiros (vasos), pias, chuveiros, etc., deixaram de ser utilizadas.
Tal situação começa a preocupar as autoridades responsáveis pela administração destes edifícios e, também, autoridades da saúde. Dado tais ambientes estarem tanto tempo sem uso, acreditamos começarão logo, logo a ser ocupados, em função da retomada gradual das atividades presenciais. Várias questões surgem. Dentre elas destacamos as instalações hidráulicas ̶ deixadas sem uso, consequentemente sem fluxo de água, desde o fechamento dos prédios. A falta de limpeza e ausência de sanitizantes, ocorrida na maioria das vezes, poderia criar uma situação altamente propícia ao desenvolvimento de microorganismos patogênicos, como vêm chamando atenção vários especialistas.
Situação fica aparentemente mais crítica quando introduzimos nestas considerações o trabalho do grupo de pesquisadores da Universidade de Yangzhou, na China, que relatou recentemente que, o uso da descarga em banheiros públicos, pode vir a liberar nuvens de aerossóis carregados de vírus e, os mesmos, podem ser inalados pelo usuário. Assim, segundo estes pesquisadores, banheiros públicos podem se constituir como locais perigosos para alguém potencialmente vir a se infectar com um vírus, mormente durante a pandemia da COVID-19. Assim, a transmissão do vírus a partir das fezes e na urina sendo possível ̶ o uso de máscara é absolutamente mandatório (1,2). Neste contexto, ressalte-se ainda o comentário apresentado na revista Clinical Infectious Diseases, e co-assinado por 239 cientistas de todo o mundo, pedindo às autoridades de saúde que reconheçam que a COVID-19 pode ser transmitida por transmissão aérea. Os cientistas pedem : "medidas de mitigação maiores para controlar a propagação do vírus no ar em ambientes fechados".
Voltando à questão inicial da retomada, os reservatórios de água e suas canalizações ̶ sobretudo em situações em que não se tem o uso continuado ou processos de descarga regulares ̶ , se constituem no local ideal para o desenvolvimento da bactéria Legionella pneumophila, notamente conhecida como fatal e responsável pela chamada Doença do Legionário : uma forma grave, agressiva e, às vezes fatal de pneumonia. Essa bactéria pode, em princípio, se espalhar pelo simples ato do acionar a descarga, ou mesmo abrir uma torneira, dado os banheiros, via de regra, não terem ventilação natural adequada!
Algumas instituições, dentre elas a Universidade de Pittsburg, nos Estados Unidos, acabam de receber financiamento da National Science Foundation para um estudo interdisciplinar envolvendo esses problemas (in)diretos causados pela pandemia. Segundo Sarah Haig, professora de engenharia civil e ambiental e participante do projeto: "Normalmente, a água potável que abastece os edifícios contém um resíduo desinfetante, tal como o cloro, para ajudar a prevenir e reduzir o crescimento microbiano". "No entanto, as mudanças na química da água, devido as instalações e operação do edifício, como os longos períodos sem uso de água (estagnação) recentemente observados em todo o mundo durante a pandemia COVID-19, terão consequências inesperadas na qualidade das águas usadas nas instalações hidráulico-sanitárias prediais" .
Os aspectos comentados nesta matéria visaram levantar algumas questões paralelas, associadas à volta presencial às atividades, e ao mesmo tempo apontar para o fato que a pandemia ainda está fortemente presente em nosso meio. Fica claro que existem muitos outros componentes, tão importantes quanto a questão sanitária, ligados à economia, ao social, ao político. Nesta retomada, precisamos com todas estas variáveis fazer face à alta complexidade deste processo. Trata-se de uma trágica situação de emergência!
Lembrete final : Nunca use água sanitária (à base de hipoclorito de sódio) e desinfetantes (à base de amônia) "juntos e misturados" na limpeza de qualquer ambiente doméstico ou profissional. Do contato destes dois produtos ocorre a liberação de gases (cloroaminas) que, uma vez inalados, podem trazer problemas à saúde, dentre eles, sérias intoxicações.
Saiba mais:
Ji-Xiang Wang , Yun-Yun Li , Xiang-Dong Liu and Xiang Cao, Virus transmission from urinals, Physics of Fluids 32, 081703 (2020).
Yun-yun Li , Ji-Xiang Wang and Xi Chen, Can a toilet promote virus transmission? From a fluid dynamics perspective, Physics of Fluids 32, 065107 (2020).
Lidia Morawska and Donald K. Milton, It is time to address airborne transmission of COVID-19, Clinical Infectious Diseases, ciaa939 (2020).
Legionnaires' Disease and Pontiac Fever: Causes and Transmission . CDC. 9 de março de 2016. Consultado em 06 de setembro de 2020.
Nota do editor do Jornal da Unicamp : O uso e a manutenção adequados dos banheiros na Unicamp estão previstos no Plano de Retorno Gradual.
Observação : Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Unicamp.