JU - Com 50 anos já completados, a Unicamp vê uma proporção expressiva de seus docentes e funcionários mais experientes chegarem à aposentadoria. Se a perda da expertise desses profissionais já traria reveses em qualquer circunstância, agora essa movimentação ocorre num momento em que condições econômicas dificultam a reposição de quadros. Como minimizar os danos?
Marcelo Knobel – Nosso programa traz uma análise aprofundada desta questão tão preocupante, com a responsabilidade de não fazer promessas que não poderão ser cumpridas. Vale ressaltar que essas medidas serão essencialmente de caráter administrativo e de gestão, e não estão previstas quaisquer reduções nos benefícios dos trabalhadores, nem corte no vale-alimentação, nem demissões, nem fechamento de órgãos. Entendemos que a manutenção das atividades-fim da Universidade e a valorização das pessoas que aqui trabalham são fundamentais para a defesa da Unicamp.
Trataremos o assunto da reposição de quadros procurando estruturar mecanismos adequados e sustentáveis, por meio do desenvolvimento de indicadores, utilizando critérios quantitativos, qualitativos, transparentes e públicos para que, na eventualidade das aposentadorias, não sejam criadas lacunas de conhecimento das atividades. As demandas das unidades e órgãos serão diferenciadas pelas necessidades, a partir de critérios transparentes acordados previamente, e serão discutidas revisões de normas que permitam reposição automática no futuro. Criaremos critérios de eficiência administrativa com desburocratização e informatização de processos, criação de serviços compartilhados, visando reduzir a demanda por reposições. Implantaremos boas práticas da administração pública na definição das estruturas gerenciais e do tamanho dos quadros. Mapearemos os processos de trabalho, iniciando ações de gestão de conhecimento, simplificando as atividades, padronizando informações, desburocratizando e possibilitando processos de trabalho mais transparentes e eficientes.
Daremos atenção especial à reposição e expansão do corpo docente e de funcionários na graduação, priorizando os cursos novos, os que oferecem disciplinas de serviço, as licenciaturas e as unidades em fase de consolidação, levando em conta as demandas formativas e projetos pedagógicos compatíveis com as exigências da atualidade.
A necessidade de reposição de quadros precisa ser conduzida dentro da perspectiva da realidade orçamentária. O comprometimento do orçamento com a folha salarial chegou, em 2016, a superar 100% do repasse do ICMS. Ao mesmo tempo em que a situação não permite reposições automáticas, temos aproximadamente 10% dos funcionários e 27% dos docentes recebendo abono permanência, o que implica dizer que poderão se aposentar a qualquer momento. Para eles, a reforma da Previdência pode ser um grande risco, a depender de como for formulada pelo Congresso. Os dados do Anuário Estatístico mostram que a participação da folha de aposentados cresce continuamente, e atingiu em 2015 um percentual de 31,21% da nossa folha de pagamentos. Mesmo se nenhuma aposentadoria fosse reposta, a despesa com pessoal cresceria até 2023. Isso ocorre porque há elementos na composição dos salários que crescem vegetativamente, e porque a maior parte dos quadros da Unicamp é estatutário e permanece em folha após a aposentadoria.
Repor os quadros de docentes, pesquisadores e funcionários de modo automático hoje é orçamentariamente insustentável. Por outro lado, não repor levará a um colapso das atividades, prejudicando enormemente as atividades-fim. Por isso, seremos extremamente cuidadosos no que se refere à reposição de quadros, pois entendemos que temos a responsabilidade de buscar a sustentabilidade financeira da Universidade sem prejudicar as áreas em situação crítica.
Luís Alberto Magna – O reequilíbrio financeiro e a retomada da capacidade de investimento da Unicamp, tratada em linhas gerais na questão anterior, são, sem dúvida, a garantia de que as reposições necessárias sejam adequadamente conduzidas. Importante salientar que tais reposições são críticas nas unidades; e que cada unidade tem suas particularidades e especificidades, além de estarem em momentos diferentes quanto aos seus planos de desenvolvimento e consolidação, daí a importância da plena autonomia de sua execução orçamentária, permitindo direcionar seus recursos para promoções ou reposições, mediante planejamento interno.
Gradativamente haverá uma natural, porém necessária, evolução do atual modelo de orçamento, baseado em série histórica, para um modelo de orçamento qualificado.
É esse o caminho pelo qual iniciamos a modernização da gestão da Unicamp em consonância com seus objetivos – ensino, pesquisa e atividades de extensão – baseada no conceito de inteligência estratégica, que se ajusta ao dinamismo de instituições como a nossa, permitindo, nessa qualificação, que se aplique plenamente um conceito daí derivado, o da certificação inteligente, que trata da estrutura e dos quadros necessários a cada momento, e que responde com agilidade a modificações circunstanciais ou conjunturais, tanto externas quanto internas. Importante ressaltar aqui o nosso lema: “Juntos até 2021”, com destaque para o “até”. Isso porque é parte essencial do nosso programa dotar a Unicamp de uma nova geração, qualificada para a sua administração.
O que é essa nova geração? Não somente os jovens, mas todos aqueles, dos diferentes segmentos de nossa comunidade, que tenham vocação e interesse em participar da administração universitária, função essencial e tão importante quanto as essencialmente acadêmicas. E para fazer isso é preciso quebrar, definitivamente, a cultura de grupos cujo interesse vai exatamente no sentido contrário, excluindo dessa oportunidade de qualificação setores importantes de nossa comunidade.
Leo Pini – A manutenção de um modelo centralizado de gestão, muito adequado ao momento inicial de nossa Universidade, passados 50 anos, dificulta tratar unidades com histórias diversas, idades diversas, realidades diversas. Por exemplo, a política de substituição integral de docentes e servidores não docentes, sem observar peculiaridades e prioridades locais, agravou, em muito, nossa situação econômica. Mais uma vez, faltou o olhar local para a tomada de decisão. Aliás, políticas de recursos humanos equivocadas para os servidores não docentes são uma constante na Unicamp; em outro exemplo, a substituição de avaliação e promoção agregadas por uma política de promoção dos servidores não docentes, sob o nome de isonomia, não se mostrou política adequada e nem aderente à nossa legislação. Isto gerou descontentamento, intranquilidade e, consequentemente, queda de rendimento. Políticas de reposição centralizadas, boas e corretas em sua intenção, mas míopes em função do contexto econômico, são outro bom exemplo da necessidade de alteração do modelo de gestão e não apenas do gestor.
Como minimizar os danos? Descentralizar o orçamento, cogestão nas unidades, transparência total. Quanto mais a comunidade local estiver informada, quanto mais participar desse processo de gestão e quanto mais fiscalizar as ações dos gestores, maiores serão as possibilidades de que sejam tomadas decisões corretas.
Antonio Fonseca – Hoje não temos mais a figura do professor convidado que havia no passado, e que atualmente poderia permanecer no quadro de docentes, sem se aposentar, e devolver para a sociedade o que de melhor ela lhe propiciou realizar durante décadas, seja no ensino, na pesquisa ou na extensão.
Deve-se lembrar que a relevância das atividades do professor convidado, o qual era convidado para trabalhar em algo mais específico, estava relacionada com o ensino, ou com a pesquisa ou ainda com a extensão e vinha do reconhecimento acadêmico evidenciado pelo pedido de seus pares.
A perda de tais docentes, pela falta de flexibilidade administrativa da Unicamp, é academicamente irreparável. Os servidores não docentes, com tempo para aposentar, foram, na atual gestão, estimulados a receber o Fundo de Garantia, deixarem o regime CLT e se aposentarem pelo Esunicamp. Ou o próximo reitor altera este quadro, ou continuaremos a caminhar para o abismo acadêmico e administrativo.
Rachel Meneguello – De fato, a Unicamp alcançou o inevitável marco demográfico em que boa parte de seus docentes e funcionários adquiriram o direito à aposentadoria. Esses docentes concentram uma capacidade de ensino, orientação e pesquisa construídos à base de anos de dedicação. O mesmo ocorre com os funcionários, que em distintos setores, na administração e no apoio ao ensino e à pesquisa, detêm a memória de procedimentos e processos que sustentam o funcionamento de atividades específicas, nas unidades e demais setores da Universidade.
Teremos de fato uma perda real se toda a expertise e o conhecimento que docentes e funcionários em fase de aposentadoria detêm não fizerem mais parte da dinâmica da produção em ensino, pesquisa e gestão. Eis aqui um dos dilemas do início dos próximos 50 anos: como planejar a instituição de forma a preservar nosso funcionamento e excelência frente à crise e redução de nossos quadros.
No caso dos docentes, se aqueles que, neste momento, podem se aposentar – pouco mais de 240 – efetivassem seus direitos, a perda em capacidade e competência acadêmica e científica seria inestimável, traduzida por exemplo em número de orientações e pesquisas. Mas, por outro lado, a política de reposição de quadros planejada no início da atual gestão, quando as perspectivas orçamentárias permitiam, possibilitam, hoje, minimizar os danos para a pesquisa e ensino. Foram contratados nos últimos quatro anos por volta de 450 novos docentes, equivalente a 1/5 de nosso quadro, permitindo, neste momento de crise, a manutenção do funcionamento regular das atividades dos cursos de graduação e pós-graduação e para a pesquisa.
É muito importante enfatizar este aspecto associado à reposição do quadro docente. Não somente porque ele aponta para algo que é primordial em nosso programa de gestão: a valorização dos recursos humanos, especialmente de nossa competência acumulada em ensino e pesquisa, como o ativo essencial a ser preservado neste momento de dificuldade porque passamos, mas também porque esta reposição já está permitindo uma transição mais suave do conhecimento acumulado, sob diversas formas, nas gerações mais antigas de pesquisadores para a nova geração de docentes recém-incorporada à Unicamp. Isto poderá ocorrer principalmente se soubermos incentivar os docentes que possam se aposentar a adiar seus planos por algum tempo a mais.
Essa mesma dinâmica será necessária entre os funcionários. Nesse caso, será necessário à instituição planejar uma política de médio e longo prazos que contemple, em tempos com maior perspectiva orçamentária, a reposição planejada de quadros, encaminhada ao lado da modernização de processos e qualificação de atividades.