Pesquisador usou, no estudo, um espectrômetro de massas de altíssima resolução
Os compostos orgânicos podem impactar os sistemas aquáticos. Daí a importância de suas caracterizações do ponto de vista qualitativo e quantitativo, com vistas a aumentar o conhecimento acerca dos compostos e processos que podem impactá-los tanto em relação à geração de dióxido de carbono como sobre suas influências na biodisponibilidade de substâncias tóxicas.
A essa tarefa se propôs o químico Jose Javier Meléndez Pérez, graduado pela Universidade Industrial de Santander, na Colômbia, em trabalho orientado pelo professor Marcos Nogueira Eberlin, do Departamento de Química Analítica do Instituto de Química (IQ) da Unicamp. O foco do trabalho do pesquisador foi a caracterização de compostos orgânicos dissolvidos em água de diferentes tipos de sistemas aquáticos do Estado de São Paulo (estuário, mar, rio, lagoa), alguns com pouco impacto humano – estuário de Cananéia e plataforma continental, próxima a Ubatuba – e outros mais impactados - rio Monjolinho, no município de São Carlos e a lagoa do Parque Hermógenes de Freitas Leitão Filho, junto ao campus da Unicamp.
Todo o conjunto de compostos orgânicos dissolvidos em água em sistemas aquáticos é designado genericamente pela sigla DOM (dissolved organic matter), independentemente de suas origens ou de como se formam. Eles podem decorrer de atividades humanas, como detergentes, fármacos e seus produtos de degradação, ou terem origens naturais, como ligninas, que provêm das plantas, ou ácidos graxos, originários de plantas e animais.
Os diversos constituintes da matéria orgânica dissolvida podem sofrer inúmeros processos de transformação interagindo com a biota - conjunto de seres animais e vegetais de uma região, com constituintes de sedimentos e sofrer degradações, entre muitas outras interações, que podem levar a mudanças nos sistemas biogeoquímicos. Assim, por exemplo, a ocorrência de um fator que levasse ao aumento drástico da degradação da matéria orgânica levaria à formação de dióxido de carbono, um dos principais responsáveis pelo efeito estufa e pelo aquecimento global. Portanto, a DOM é um importante componente do ciclo global do carbono e pequenas mudanças em seu tamanho e dinâmica de comportamento podem potencialmente impactar muitos dos sistemas biogeoquímicos da Terra, com consequências no aquecimento global e na vida aquática.
A pesquisa
Daí decorre a importância da caracterização da DOM do ponto de vista qualitativo e quantitativo, com vistas a aumentar o conhecimento acerca dos compostos e processos que podem impactar os sistemas aquáticos, tanto em relação à geração de dióxido de carbono como sua influência na biodisponibilidade de substâncias tóxicas.
O pesquisador explica que utilizou no estudo um espectrômetro de massas de altíssima resolução e justifica: “A DOM é uma mistura muito complexa e nenhuma técnica analítica permitiria conhecer totalmente sua composição. No entanto, a espectrometria de massas de altíssima resolução possibilita detectar e identificar simultaneamente uma grande gama desses constituintes, trabalho antecedido e complementado por outras técnicas como as cromatografias gasosa e líquida”.
Esse conjunto de análises permitiu identificar nos compostos orgânicos aquáticos substâncias de origem natural como ácidos graxos, derivados de ligninas e componentes orgânicos sulfurados, além de compostos de origem antrópica, como detergentes e seus produtos de degradação. Os experimentos revelaram que os constituintes da DOM sequestram sulfetos dos ambientes aquáticos, diminuindo a biodisponibilidade dessas substâncias, impedindo-os de exercerem suas atividades citotóxicas na biota.
O estudo mostrou também que um dos principais tipos de compostos encontrados na DOM, principalmente em ambientes não impactos, são os derivados de ligninas que podem vir a ser utilizados como matéria-prima para a obtenção de produtos de interesse comercial como bio-óleos ou solventes químicos.