CIS-Guanabara sedia parceria entre Unicamp e PUC-Campinas
Érica Pereira, 29 anos, é moradora da ocupação urbana Joana d’Arc, em Campinas. Mãe de seis filhos (o caçula tem 3 anos e o mais velho, 14), viúva do primeiro marido e divorciada do segundo, ela foi uma das primeiras pessoas a se instalar na região onde estava o antigo VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), na Estação Anhanguera, ao lado da rodovia que leva o mesmo nome. Para sustentar os filhos, sempre fez de tudo um pouco. Trabalhando como manicure a domicílio, nunca perdia a oportunidade de oferecer às clientes doces e bolo gelado, que preparava em casa nas horas vagas. “Mas essa fase acabou. Hoje sou uma artesã e é desse trabalho que tiro o sustento da minha família. Depois das oficinas de artesanato que fiz no CIS-Guanabara, posso dizer com orgulho: sou uma empreendedora”, comemora. A oficina a que ela se refere é uma etapa do projeto de extensão “A cidadania feminina em ocupações urbanas: mulheres em ação politizando a cidade”, sediado na PUC-Campinas, que escolheu o CIS-Guanabara como parceiro para o desenvolvimento das atividades. Essa parceria entre Unicamp e PUC-Campinas é um dos inúmeros exemplos de ação extensionista e que se insere nas prioridades da atual gestão da Universidade Estadual de Campinas.
A oficina de artesanato do CIS-Guanabara é uma etapa desse projeto de extensão coordenado pela socióloga Stela Cristina de Godoi, da PUC-Campinas. Trata-se de um trabalho que propõe ações socioeducativas sobre o tema dos direitos sociais das mulheres e seu protagonismo no acesso às políticas públicas para a redução da pobreza e desigualdade no Brasil. “Queremos que essas mulheres se reconheçam como sujeito de direito, se apropriem de suas próprias potencialidades e, neste processo, também se fortaleçam enquanto um grupo organizado para a geração de renda por meio do trabalho associativo”, afirma.
A socióloga esclarece que o trabalho é mais abrangente, pois há uma preocupação de conscientização que perpassa as diferentes etapas do projeto. São realizadas oficinas para a discussão dos direitos e políticas públicas voltadas às mulheres em que se busca problematizar os temas elencados pelas participantes. “Em meio ao trabalho associativo, desenvolvido coletivamente no espaço da própria ocupação, criamos um tempo em que as mulheres puderam dividir com outras companheiras os dilemas outrora vividos solitariamente em suas rotinas domésticas”, afirma. Stela elenca aspectos que vão aflorando durante o desenvolvimento das atividades. “Notamos, por meio dos espaços de escuta criados pelo projeto, que apesar da experiência de violação de direitos que vivenciam como ‘população sem domicílio’, são mulheres muito fortes e não vítimas passivas da história”. A socióloga complementa que o estímulo ao trabalho artesanal associativo para a geração de renda, em especial aquele que permeia as oficinas de artesanato promovidas pelo CIS-Guanabara, contribui para o fortalecimento do Espaço das Joanas, localizado na ocupação urbana onde vivem.
Do estabelecimento dessa parceria entre a PUC-Campinas e a Unicamp, via CIS-Guanabara, segundo Stela, pode-se observar que a reação de algumas integrantes do grupo vai além do aprendizado de novas técnicas de trabalho artesanal. A socióloga afirma que dentro de um ambiente muito estruturado, a experiência de transitar por outros espaços e se descobrir membro da sociedade para fora da ocupação foi muito rico para as participantes. Ela lembra que no primeiro dia de oficina, Érica Pereira demonstrou interesse em conhecer a história da Estação Guanabara. “É muito interessante pensar os sentidos que essa curiosidade pelo patrimônio histórico aflore na trajetória de uma mulher, migrante, moradora da periferia e que reconhece o valor do passado para a edificação da sociedade”.
Embora interessada em informações de caráter histórico do prédio da Estação Guanabara, Érica não perdeu o foco. Tinha muita clareza do que pretendia assimilar dos ensinamentos transmitidos durante as oficinas no CIS-Guanabara. “Eu já tinha alguma noção de técnicas de artesanato, mas foi aqui que encontrei espaço para criar, inovar, aprender coisas diferentes”, afirma. Ela admite que não tinha noção do valor que deveria atribuir aos produtos. “No começo, vendi muito artesanato com prejuízo”, lamenta. “Hoje sei quanto vale o material e, principalmente, o meu tempo destinado à produção. Fiquei tão estimulada que tudo que aprendo aqui eu levo para as mulheres da ocupação.” Stela, coordenadora do projeto, acrescenta que cuida para “que o trabalho artesanal associativo seja tanto uma finalidade, no sentido da geração de renda, como um meio de reflexão e organização coletiva, que caminhe na contramão da lógica competitiva que orienta os produtores e consumidores no grande mercado”.
Érica e outras mulheres do grupo de artesãs da Ocupação Joan D’Arc mostraram suas criações recentemente na Feira de Artesanato no Swiss Park e no CIS-Guanabara, no final de setembro, onde foi realizada a segunda edição da Feira Cultural, promovida pela Associação dos Artesãos de Campinas em parceria com a Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac-Unicamp).