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Tese propõe práticas de preservação em áreas de expansão urbana

Engenheira agrônoma desenvolve tabela de aptidão do solo e cria ‘selo verde de conservação’

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As características de uso e ocupação do solo em franjas urbano-rurais e o aumento da urbanização mostram que, para que haja uma gestão responsável, tais áreas devem ser destinadas à proteção e à recuperação ambiental, por meio de políticas participativas e de incentivo aos proprietários. Foi o que concluiu a engenheira agrônoma Thais Guarda Prado Avancini em sua tese de doutorado defendida na Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC). Esta constatação partiu da observação do município de Louveira, interior do Estado de São Paulo.

Segundo ela, verifica-se uma forte expansão de loteamentos residenciais nestas áreas, e a conservação do solo não segue a preceitos tão rígidos quanto em áreas apenas de uso rural, visto que o produtor precisa da terra para produzir. Mas as práticas de conservação do solo em Louveira, devido ao aumento da urbanização, também vêm diminuindo. “Com isso, corre-se inclusive o risco de diminuir a vazão de rios por causa do assoreamento.”

A pesquisadora expôs que a visão do solo nas áreas rurais muda de panorama com a urbanização. Com a disseminação desses loteamentos, perde-se muito solo, vegetação e, consequentemente, água. E a escolha de Louveira por Thais envolveu uma conjunção de todos esses fatores, além de motivações sociais, ambientais e de conservação. O trabalho de campo durou um ano.

Foto: Perri
Thais Guarda Prado Avancini, autora da tese: ferramentas para avaliação de áreas e para nortear o planejamento do empreendimento e seu código de obras

Ela comentou que Louveira vem sofrendo alterações na paisagem rural-urbana, devido principalmente à expansão imobiliária, já que está no centro logístico da região – com muitos galpões para distribuição logística – e situada estrategicamente à beira da Rodovia Anhanguera.

A população desse município em 2017 era de 45.922 mil habitantes, contra 37.125 mil em 2010. De acordo com a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), o grau de urbanização do município, no ano passado, era de 97,35%. Atualmente, a área urbana ocupa cerca de 34 quilômetros quadrados, representando cerca de 60% da sua área total.

Orientada pelo docente da FEC André Munhoz de Argollo Ferrão, a engenheira investiu na prevenção dos impactos ambientais. E o seu estudo trouxe como contribuição o desenvolvimento de uma tabela de aptidão do solo para áreas urbanas e a criação do Selo Solo Verde de Conservação do Solo e Preservação da Vegetação.

Conforme a pesquisadora, em obras civis, práticas de conservação de solo são quase inexistentes e, como são necessárias movimentações de terra, provenientes de cortes e de aterros, fica claro que esses trabalhos causam uma série de impactos ao meio físico e biótico, alterando as características do solo e da cobertura vegetal local.

Na área agrícola, já é utilizado um sistema de classificação de aptidão de uso, capaz de apontar se aquela terra está apta a receber determinada cultura, levando em conta a susceptibilidade à erosão. Justamente com base nesse mapa e nos mapas de zoneamento urbano, Thais criou o selo. A integração dos conceitos de capacidade de uso das terras à aptidão para uso urbano trouxe como resultado a elaboração da Tabela de Aptidão do Solo para Uso Urbano.


Análise holística

A autora do estudo utilizou dados do “Diagnóstico agroambiental para gestão dos recursos hídricos do município de Louveira-SP”, elaborado pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e cedido pelo professor Jener Fernando Leite de Moraes, seu orientador no mestrado.

As duas ferramentas criadas pela pesquisadora foram aplicadas à tabela de aptidão e ela constatou que, se o selo solo verde fosse usado antes do processo, ou no licenciamento, ele poderia induzir o planejamento daquele loteamento, diminuindo perda de solo, de vegetação e de água.

Com isso, quando o licenciamento é entregue ao órgão licenciador (o Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais do Estado de São Paulo - Graprohab), este já é capaz de visualizar as potencialidades e os problemas ligados ao solo e à vegetação. Isso não era feito anteriormente, pois ações no sentido de diminuir a perda de solo não são muito difundidas no meio civil.

Thais revelou que, em São Paulo, já vigora uma lei de conservação de solo rural desde 1988. Nela se afirma que o solo agrícola é patrimônio da humanidade. “Só que, quando um empreendedor começa a movimentá-lo, o cuidado dele é ínfimo perto do que tem o produtor rural. Logo, a conservação é fundamental.”

Reprodução
Fonte: CETESB (2016), elaborado por SMA/CPLA (2016)

A intenção da engenheira é que essa certificação, além de auxiliar na preservação ambiental, possa servir ao empreendedor como estratégia de “marketing verde” para o empreendimento. Outra proposta seria a obtenção de incentivos financeiros, redução de impostos e linhas de créditos específicos, com taxas coerentes para empreendimentos certificados.

O Selo Solo Verde e a Tabela de Aptidão de Uso de Terra, juntos, devem direcionar as obras urbanas, que são enquadradas em uma determinada categoria e mostram se estão aptas a receber essa implantação. Também apontam o que é preciso para melhorar em relação à conservação do solo e da vegetação.

“A utilização de tais ferramentas para avaliação de áreas, para a implantação de novo loteamento no município, poderá nortear o planejamento do empreendimento e até mesmo de seu código de obras, racionalizando o uso do solo”, informou.

 

Responsabilidade

Thais aplicou o selo em três loteamentos de Louveira. Um deles, com terrenos de 1.800 metros quadrados, foi certificado na classificação mais baixa (ouro, prata e bronze), mas não deixou de receber o selo. Os outros dois loteamentos não obtiveram classificação porque as técnicas de conservação eram quase inexistentes.

O Selo Solo Verde, contou, segue metodologia de avaliação por meio de soma de pontos baseada na certificação LEEDTM – Leadership in Energy & Environmental Design, selo criado pelo U.S. Green Building Council, com grande reconhecimento internacional e utilizado em mais de 130 países. “O que mais prezo no novo selo são os itens de conservação do solo e de vegetação.”

Na opinião da pesquisadora, o conhecimento da capacidade de uso das terras poderá nortear as áreas propostas para compensação ambiental, áreas verdes, áreas prioritárias para recuperação ambiental ou reflorestamento, entre outras. “Vemos que loteamentos licenciados não possuem conectividade entre fragmentos vegetais, comprometendo os corredores de fauna e diminuindo seu valor ambiental.”

Reprodução
Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE (2017). Acesso em: 07 de setembro de 2017.)

Para trabalhar com a área ambiental, acentuou ela, é preciso olhar cada situação de maneira holística. Enxergar só uma informação ambiental é insuficiente. É necessário focar em todas as variáveis ambientais como topografia, tipo do solo, proximidade de áreas de preservação ambiental, área de manancial e seu entorno.

Além disso, é preciso entender os impactos dessa urbanização tão drástica e do aumento da impermeabilização do solo. Observar essas características permite trabalhar e planejar dentro de certas regras que deverão ser seguidas ao longo da obra.

Em breve, Thais pretende lançar uma cartilha a fim de conscientizar o empreendedor sobre esse tema. Tal abordagem vem do anseio da autora em dar evidência ao assunto, já que ela também trabalha em licenciamentos de loteamentos urbanos.

“Procuramos fazer nossa parte e talvez ainda possamos salvar a água, o solo e proteger a vegetação. Afinal, está tudo interligado. O solo que perdemos por erosão hídrica vai acabar num rio que abastece a nossa casa. Então a conservação também é nossa responsabilidade”, acredita Thais.

 

 

Imagem de capa JU-online
Área de plantio de uva no município de Louveira, onde foi desenvolvida a pesquisa | Reprodução

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