Segundo dissertação defendida no IG-Unicamp, processos de mineralização no depósito Peteca foram distintos e ocorreram em períodos diferentes
Pesquisa desenvolvida para a dissertação de mestrado da geóloga Vanessa de Almeida Pimenta, defendida no Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, sob a orientação da professora Maria José Maluf de Mesquita, trouxe novas contribuições para o entendimento acerca da formação de minérios que compõem a reserva do depósito do Peteca, localizado na porção leste da Província Aurífera de Alta Floresta (PAAF), no Estado do Mato Grosso. O setor leste da PAAF apresenta depósitos com ouro, cobre, molibdênio, chumbo e zinco. De acordo com o estudo, os principais minérios presentes no Peteca, ouro e cobre, resultam de dois processos diferentes de mineralização, que ocorreram em períodos distintos. “Ao entendermos melhor esses aspectos, nós reunimos evidências que podem ajudar, por exemplo, na identificação e caracterização de novos depósitos de minerais”, explica a autora do trabalho.
Vanessa classificou os dois processos no Peteca como Sistema de Cisalhamento-Hidrotermal e Sistema Magmático-Hidrotermal. O primeiro está relacionado com a formação do ouro e o segundo, com a do cobre. Os termos soam excessivamente técnicos, mas a pesquisadora fornece explicações para compreendê-los. Segundo ela, ao longo de centenas de milhões de anos ocorreram diversos processos nas rochas, tais como deformações e alterações hidrotermais [ação de percolação de fluidos de acordo com condições de temperatura, pressão e química] no local. A combinação desses acontecimentos contribuiu para a formação do depósito. “Analisando essas deformações, foi possível identificar os dois sistemas. Um sucedeu o outro, o que gerou condições para a formação primeiramente do ouro e posteriormente do cobre”, detalha Vanessa.
No Sistema de Cisalhamento-Hidrotermal, prossegue a geóloga, a rocha original, denominada protólito, sofreu vários processos de deformação, paralelamente às alterações hidrotermais oriundas desses mesmos processos. “A combinação desses fatores deu origem a rochas que classificamos como rochas de cisalhamento. A continuação destes processos, por uma questão evolutiva, propiciou a precipitação do ouro dentro de pirita (sulfeto de ferro) em veio de quartzo”, pontua a autora da dissertação. Na sequência desse ciclo, teve início outro, o Sistema Magmático-Hidrotermal. “Após a mineralização do ouro, os processos de deformação por cisalhamento pararam. E passou a ocorrer somente a ação de alterações hidrotermais em outras condições físico-químicas, que favoreceram a formação de minerais [sulfetos] com cobre, o que não havia ocorrido no ciclo anterior”, completa.
Vanessa observa, ainda, que no Sistema de Cisalhamento-Hidrotermal, relacionado ao ouro, as alterações hidrotermais estão orientadas, reforçando o indicativo de influência das deformações. Já no Sistema Magmático-Hidrotermal, relativo ao cobre, as alterações hidrotermais não estão orientadas, o que evidenciando a diferença entre um sistema e outro. Decifrar esses intrincados processos de mineralização, reafirma a pesquisadora, é importante porque metais como o ouro podem ser formados em diversos tipos de depósitos “Com estudos desse tipo, nós podemos orientar de forma mais precisa os locais para a prospecção de novos depósitos”.
Embora o Peteca seja um dos depósitos mais estudados cientificamente entre os que compõem o setor leste da PAAF, ele ainda merece novas investigações, assim como outros importantes depósitos da região. “Nós sabemos que as primeiras reservas minerais de Alta Floresta foram descobertas na década de 1970. Na década de 1980, ocorreu um boom na exploração. Em seguida, houve um declínio e, posteriormente, uma retomada das atividades. Somente a porção leste da província de Alta Floresta, que tem aproximadamente 500 quilômetros de extensão, concentra centenas de depósitos de ouro, cobre e outros minérios”, relata.
Sustentabilidade
Uma das questões que têm preocupado diferentes segmentos da sociedade, a comunidade científica em particular, refere-se à incorporação do conceito de sustentabilidade por parte da indústria da mineração. Questões ligadas ao tema serão debatidas durante o “Workshop Mineração Sustentável” que será realizado entre os dias 20 e 24 de maio, em Peixoto de Azevedo (MT), um dos municípios que compõem a Província de Alta Floresta. Na ocasião, pesquisadores, autoridades públicas e representantes de mineradoras, entre outros atores, discutirão em torno das demandas necessárias para a constituição de uma mineração sustentável. As áreas temáticas abordarão economia, meio ambiente, educação, geologia, saúde e ação social. A comissão organizadora do evento está sendo coordenada pela professora Maria José Maluf de Mesquita. O evento é resultado de um projeto de parceria entre a Unicamp e Universidade de Cardiff (Inglaterra).
Segundo Vanessa, iniciativas como essa são de fundamental importância porque reafirmam a necessidade de se considerar a atividade mineradora dentro de um contexto mais amplo, que contempla também dimensões socioculturais, econômicas, ambientais e humanas. A geóloga entende que episódios recentes como os rompimentos das barragens da Vale reforçam a necessidade de uma mudança de paradigma na forma como o setor atua. “Penso que estamos caminhando nessa direção, mas ainda precisamos aprimorar algumas ações, principalmente em relação à segurança e à fiscalização das atividades nas áreas de exploração e explotação”.