Projeto reduziu mortes de bebês por asfixia e tem potencial para ser aplicado em outras regiões do país
A mortalidade infantil no Brasil ainda mantém índices distantes daqueles apresentados por países desenvolvidos. De cada mil bebês nascidos vivos, 12 vêm a óbito. O mesmo ocorre com a mortalidade neonatal. No Brasil, em 2013, a mortalidade neonatal correspondeu a 69% dos óbitos infantis, dos quais 76% ocorreram entre 0 e 6 dias após o nascimento. Uma das causas é a asfixia perinatal.
“A asfixia é uma causa de óbito que pode ser prevenida, uma vez que 98% dos partos no Brasil ocorrem em maternidades e 88% são atendidos por médicos”, acredita Renato Oliveira de Lima, especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria. Ele é autor da tese de doutorado “Análise do impacto do Programa de Reanimação Neonatal da Sociedade Brasileira de Pediatria nos resultados neonatais da mesorregião do Sudoeste Piauiense”, defendida na Faculdade de Ciências Médicas (FCM), sob orientação do também pediatra Sérgio Tadeu Martins Marba.
Em 2018, durante 100 dias, Renato Lima treinou 431 profissionais de saúde entre médicos, enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem, fisioterapeutas e profissionais envolvidos no transporte de recém-nascidos dos municípios de Floriano, São Raimundo Nonato, Bom Jesus, Uruçui e Corrente que compõem o sudoeste do Piauí. Foram oferecidos 106 cursos nas cinco cidades e realizadas 700 capacitações no total.
O projeto comprovou uma melhora significativa nos resultados neonatais nesta região do Piauí. Foi registrada uma redução de 72,60% de mortes em locais de nascimento.“Este projeto poderá servir de modelo para outras regiões menos favorecidas do país, sobretudo na região Norte e Nordeste, cujos índices de mortalidade neonatal ainda atingem níveis muito elevados”, comenta Renato.
Sobre o treinamento
Para a realização dos treinamentos, foi utilizada a metodologia do Programa de Reanimação Neonatal (PRN) da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) em três modalidades de curso: reanimação do recém-nascido maior ou igual a 34 semanas para médicos e profissionais de saúde não médicos; reanimação do recém-nascido menor de 34 semanas e transporte do recém-nascido de alto risco.
Os cursos tiveram carga horária de oito horas, com um modelo teórico-prático de ensino para seis e oito profissionais de saúde por turma. Alguns dos profissionais de saúde fizeram mais de um curso. A certificação foi conferida pela SBP àqueles que obtiveram rendimento igual ou superior a 80% e cuja avaliação se deu por modelo de pré e pós-teste com avaliações contendo 25 questões de múltipla escolha.
Durante a pesquisa, o especialista analisou, de forma descritiva, a estruturação dos locais de nascimento, o conhecimento dos profissionais de saúde sobre reanimação e a retenção de conhecimento, o número de instrutores locais, as transferências entre hospitais de recém-nascidos e os resultados neonatais antes e depois de 12 meses da intervenção inicial.
Como estratégia relacionada à prática de cuidados imediatos que devem ser realizados dentro do primeiro minuto de vida do recém-nascido, foi sugerido pelo pesquisador que as mesas utilizadas para a organização dos materiais nos locais de nascimento fossem forradas com toalhas amarelo-ouro. “Fiz isso como forma de enfatizar a importância da garantia de uma adequada transição da vida intrauterina à vida extrauterina nos primeiros 60 segundos de vida, ou seja, a garantia do Minuto de Ouro”, explica Renato.
Resultados obtidos
Durante os 12 meses que sucederam a intervenção, as cinco regionais de saúde reanimaram 479 recém-nascidos, dos quais 414 (86,43%) foram maiores ou iguais a 34 semanas e 65 (13,57%) foram prematuros menores de 34 semanas. O município de Floriano registrou a maior redução (90,91%) e o município de Bom Jesus registrou a menor redução (40%). A redução de mortes em locais de nascimento da Mesorregião sudoeste contribuiu para que fosse registrado um aumento de admissões de recém-nascidos em unidades de terapia intensiva neonatal.
Os resultados obtidos mostraram que houve melhora estrutural nos locais de nascimento da região avaliada, com retenção adequada do conhecimento sobre reanimação neonatal, formação de novos instrutores, aumento de RN transferidos, com impacto na mortalidade e no número de crianças reanimadas nos hospitais avaliados.