Estudo resultou em artigo publicado na revista Scientific Reports (Nature)
Para investigar as possíveis maneiras de como o novo coronavírus causa a Covid-19 severa, pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp criaram um mapa celular de referência do pulmão humano saudável. Para criar esse mapa, os pesquisadores avaliaram a diversidade celular do pulmão por meio de inteligência artificial a partir de estudos de 130 mil células pulmonares sequenciadas individualmente.
A pesquisa resultou no artigo SARS-CoV-2 receptor is co-expressed with elements of the kinin–kallikrein, renin–angiotensin and coagulation systems in alveolar cells publicado na revista Scientific Reports (Nature). Essa é a primeira produção nacional que emprega o sequenciamento de células únicas, capaz de gerar atlas celulares de qualquer órgão humano. Também é a primeira evidência de associação entre esses três sistemas a nível molecular com as células-alvo da Covid-19.
“Ao poupar estas células em detrimento das demais, o novo coronavírus parece causar um desbalanço celular no pulmão que levaria a um aumento dos níveis de hormônios pró-inflamatórios – explicando, pela primeira vez, as características clínicas da doença. Esse resultados nos permitiram criar um modelo teórico da fisiopatologia da Covid-19, com grande potencial para pesquisas futuras que investiguem modos de atenuar a gravidade e a duração da doença", explica Davi Sidarta Oliveira, aluno do Programa Médico Pesquisador da Unicamp e autor da pesquisa realizada no Laboratório de Sinalização Celular do Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades (Cepid-OCRC) da Unicamp.
Após a confecção do atlas celular do pulmão humano, os pesquisadores voltaram sua atenção para as células contendo o receptor para a entrada do vírus: as células alveolares. Para a sua surpresa, eles descobriram que essas células, além de expressar o receptor do vírus, também expressam componentes chave para a regulação da inflamação aguda, da função cardiovascular e da coagulação.
“Assim, decidimos avaliá-las mais cuidadosamente, e fomos capazes de reconstruir a linhagem alveolar humana. As células alveolares são, constantemente, as repostas no pulmão sadio”, diz Davi.
Durante o desenvolvimento da pesquisa, uma nova surpresa: o receptor do vírus estava presente apenas em células alveolares tronco ou terminalmente diferenciadas – mas não nas células intermediárias, que, por sua vez, contêm componentes necessários e suficientes para desencadear uma resposta inflamatória aguda e com impacto na circulação e coagulação.
Uma das características da Covid-19 é a lesão pulmonar aguda, devido à inflamação exacerbada causada por disfunções no sistema cardiovascular e por eventos tromboembólicos – isto é, por alterações na coagulação sanguínea. Entretanto, pouco se sabe ainda sobre como a infecção viral leva a este quadro.
“Esse é o primeiro modelo a associar populações celulares específicas suscetíveis ou resistentes à infecção viral aos aspectos clínicos. O trabalho também chama a atenção por ser a primeira produção nacional utilizando esse tipo de tecnologia, cuja análise de dados é extremamente sofisticada quando comparado aos atuais métodos usados no País, inaugurando uma nova época de inovações na genética e biologia computacional brasileiras”, diz Davi.
Além de Davi Sidarta, também assinam o artigo os pesquisadores Carlos Poblete Jara, Adriano Ferruzzi, Munir Skaf, William Velander, Eliana Araújo e Licio Veloso.
Matéria original publicada no site da FCM da Unicamp.