Os resultados foram constatados em células-tronco tumorais cultivadas em laboratório e em camundongos.
Estudo publicado na Nature Communications, com a participação de pesquisadores do Centro de Química Medicinal (CQMED) da Unicamp, avança na busca de novas terapias para o tratamento de glioblastoma. O glioblastoma é um tipo de câncer cerebral altamente agressivo e afeta adultos e crianças. Apenas 10% dos pacientes sobrevivem mais de cinco anos. É um tumor raro e esporádico, mas é o mais comum entre os cânceres cerebrais. A dificuldade de se encontrar tratamentos é atribuída à presença de células-tronco tumorais que impulsiona o crescimento do glioblastoma e confere resistência aos tratamentos. Por esta razão, as células tronco tumorais são importantes alvos para o tratamento deste câncer.
No estudo, pesquisadores encontraram pequenas moléculas capazes de inibir tanto a proliferação de células-tronco tumorais de pacientes (cultivadas em laboratório) quanto do glioblastoma implantado em camundongos. Os resultados da pesquisa abrem novos caminhos para parcerias com hospitais e indústrias farmacêuticas para a execução das etapas clínicas e para ajudar a compreender cada vez mais o funcionamento desta doença tão letal.
Neste artigo, os cientistas realizaram uma varredura de moléculas em busca daquelas capazes de inibir o crescimento de células tronco tumorais em laboratório. Duas moléculas tiveram resultados mais promissores, a GSK591 e a LLY-283. Estas moléculas atuam na enzima previamente associada ao glioblastoma, a arginina metiltransferase 5 (PRMT5). A PRMT5 é responsável pela organização da produção de proteínas no interior da célula, em um evento chamado de splicing alternativo de RNA.
Os pesquisadores cultivaram, em laboratório, células-tronco tumorais de pacientes com glioblastoma e, em seguida, aplicaram as moléculas inibidoras. O resultado foi a desaceleração do número de células de câncer. Esta constatação é particularmente importante, sobretudo por se tratar das células que conferem maior resistência e avanço do tumor. Em seguida, parte destas células cultivadas foi implantada em camundongos, e após algumas semanas, os cientistas iniciaram o tratamento dos animais com os inibidores químicos. Além de maior sobrevida dos camundongos, os cientistas verificaram a estagnação do tumor, e a maior permeabilidade cerebral da molécula LLY.
Neste estudo, os pesquisadores do CQMED contribuíram com a análise de bioinformática de um grande volume de dados oriundos de cerca de 30 de pacientes para conseguir extrair as informações biológicas relevantes para o estudo. “Analisamos ao todo quase 300 mil eventos de splicing. É preciso saber quais deles são resultantes do efeito da molécula”, explica Felipe Ciamponi autor do artigo que durante seu mestrado permaneceu três meses no grupo do Structural Genomics Consortium de Toronto (Canadá), onde iniciou o processamento dos dados.
A contribuição brasileira definiu um mapa de eventos de splicing que permitiu entender como ocorria a inibição da proteína PRMT5 na célula. Este mapeamento apontou uma das causas da multiplicação de células no câncer. A inibição da PRMT5 impediu que as células tumorais se reproduzissem na mesma velocidade.
“Certamente percorremos etapas importantes para guiar a descoberta de um novo fármaco, e é preciso seguir estudando os mecanismos celulares que envolvem a proteína PRMT5 em paralelo com o entendimento da química destas moléculas”, explica Katlin Massirer, uma das coordenadoras do estudo e pesquisadora principal do CQMED e do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG), ambos na Unicamp.
“Os resultados nos deixaram muito otimistas, sobretudo por se tratar de um câncer extremamente agressivo, e difícil de ser tratado. Estes inibidores químicos abrem um caminho que parece promissor”, finaliza Ciamponi.
As próximas etapas consistem em entender detalhadamente o efeito destas moléculas sobre o câncer e criar modificações químicas das moléculas tornando-as mais estáveis e permeáveis ao cérebro, para que possam guiar um estudo pré-clínico.
O estudo foi liderado pelo Structural Genomics Consortium (SGC) de Toronto com a participação de instituições canadenses, americanas e dos pesquisadores do CQMED, com o apoio da Fapesp.