O que é ser de esquerda no
século XXI, segundo o filósofo Ruy Fausto
21/03/2012 - 12:00
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Ruy Fausto, professor emérito da USP e um dos principais filósofos políticos do país, foi o convidado para a primeira palestra promovida pelo Grupo de Estudos do Contemporâneo, que integra o Centro de Estudos Avançados (CEAv) da Unicamp. O grupo reúne pesquisadores de várias especialidades das Artes, Ciências e Humanidades, interessados em entender os empregos da noção de crise no contemporâneo como forma privilegiada de debater os impasses, desafios e perspectivas, no plano histórico e teórico, das sociedades humanas no século XXI.
“O que é ser de esquerda na segunda década do século XXI”, foi justamente a questão colocada por Ruy Fausto para desenvolver o tema “Esquerda, democracia, sobrevivência”, na tarde desta quarta-feira, no auditório da Biblioteca Central Cesar Lattes. Em artigo na revista eletrônica editada pelo filósofo, Fevereiro, ele lembra que “as noções de ‘esquerda’ e de ‘direita’ se impuseram, desde a Revolução Francesa, como denominações que dividem o campo das opções políticas. A distinção extravasou, no espaço, o cenário francês, e atravessou, no tempo, os séculos XIX e XX, chegando até os nossos dias”.
Tanto no artigo, como na palestra, Ruy Fausto adotou como ponto de partida um livro de Norberto Bobbio (“Destra e Sinistra, ragioni e significati di uma distinzione politica”) que define a esquerda pela ideia de igualdade: “É de esquerda quem privilegia a igualdade diante da desigualdade. De direita, quem vai na direção oposta”. “Acho que é um bom caminho, mas que depois se complica”, disse antes da palestra. “Vai surgir o fenômeno do totalitarismo e pode-se dizer que uma das suas variantes é de esquerda. Alguns dos grandes monstros da história são de esquerda. Então, o que fazemos? Ou dizemos que não somos de esquerda, ou desistimos da esquerda, ou descobrimos que a coisa complicou.”
Ruy Fausto argumenta que surgiu uma nova distinção entre esquerda e direita, apesar do lugar comum – “anunciado às vezes por setores da direita, nacional ou europeia, principalmente em tempo de eleições” – de que esta diferença desapareceu. “É uma ideia é ilusória. Acho que continua sendo importante ser de esquerda, é uma condição necessária para ter uma posição lúcida. Mas, ao mesmo tempo, é uma condição muito insuficiente, na medida em que se pode ter um sujeito monstruoso, pior que um sujeito de direita.”
O professor emérito observa que à dualidade esquerda/direita seria preciso acrescentar a polaridade totalitários/antitotalitários. “Daí temos que abrir uma nova gaveta, com quatro possibilidades: esquerda totalitária e esquerda democrática, e direita totalitária e direita democrática – o que chamei no artigo de Fevereiro de ‘quadrado político’. É bom fixar isso, pois as pessoas, sem ter muita ideia do que seja, falam agora em ser ‘mais à esquerda’. Temos uma outra dimensão: não é o problema da igualdade e sim o da liberdade que está em questão.”
Segundo Ruy Fausto, a distinção entre esquerda e direita ficou ainda mais complicada nos últimos tempos, com o surgimento da luta ecológica. “Existe uma discussão entre os verdes sobre aquilo que é esquerda e aquilo que é direita. E, finalmente, vamos ter um sistema tríplice, com três pares”, concluiu o filósofo, para em seguida aprofundar suas reflexões junto ao público.