Artigo de cientistas é
publicado pela revista Blood
06/08/2012 - 12:10
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Artigo escrito por três cientistas da Unicamp, Camila Bononi Almeida, Nicola Conran e Fernando Ferreira Costa, este último reitor da Universidade, acaba de ser publicado na versão eletrônica da revista científica Blood, a mais importante do mundo na área da hematologia. O texto, que também é assinado por quatro pesquisadores estrangeiros, Christoph Scheiermann, Jung-Eun Jang, Collete Prophete e Paul S. Frenette, é resultado de uma linha de pesquisa desenvolvida no Hemocentro da UNICAMP, com experimentos realizados no Albert Einstein College of Medicine, de Nova York. O estudo obteve, entre outros resultados, evidências de que a droga denominada hidroxiureia, já utilizada no tratamento crônico da anemia falciforme, também pode ser usada na etapa aguda da doença. Brevemente, o artigo será publicado na versão impressa da Blood.
O trabalho que gerou o artigo faz parte de uma linha de pesquisa do Hemocentro, criada a partir da dissertação de mestrado de Camila e que teve continuidade com o seu doutorado. De acordo com ela, a hidroxiureia já é uma droga comercialmente disponível, que vem sendo empregada no tratamento crônico da anemia falciforme, com o objetivo de aumentar a quantidade de hemoglobina fetal dos pacientes. “Acreditava-se que a droga somente começava a apresentar efeitos positivos após no mínimo três meses de uso contínuo. Os testes que fizemos com camundongos portadores da doença apontaram, porém, que ela também traz resultados positivos quando utilizada de maneira aguda, o que não havia sido cogitado anteriormente”, explica.
Dito de maneira simplificada, o que a droga faz é reduzir o processo inflamatório, melhorando consequentemente os mecanismos de vaso-oclusão, que causa danos aos tecidos e muita dor. A vaso-oclusão ocorre quando há o acúmulo de células na parede interna dos vasos sanguíneos, o que acarreta a diminuição do fluxo do sangue. “Esses resultados abrem a possibilidade de que a hidroxiureia também possa vir a ser utilizada nos momentos de crises dos pacientes. Nesse quadro, até o momento, não há muito que se possa fazer além de administrar analgésicos e hidratar os portadores da doença”, detalha Nicola Conran.
A pesquisadora adverte, porém, que antes de a droga ter uma nova indicação de uso, ainda serão necessárias pesquisas em seres humanos, para confirmar a eficácia da sua utilização. “Temos protocolos clínico e ético que precisam ser cumpridos. Estes deverão ser os nossos próximos passos”, acrescenta Nicola. Além dessa evidência, o estudo que deu origem ao artigo publicado pela Blood constatou, ainda, a possibilidade de administrar drogas inibidoras de uma classe de enzimas batizada de PDE9, que pertence à mesma família de drogas do sidenafil (Viagra), em associação com a hidroxiureia. O objetivo da combinação é potencializar os efeitos desta última.
O emprego dos inibidores de PDE9 com essa intenção, observa Camila, também tem um aspecto original, visto que o fármaco tem sido proposto para aplicação para o tratamento do Mal de Alzheimer. Embora o artigo tenha sido disponibilizado no último dia 25 de julho, conforme as pesquisadoras do Hemocentro, ele já começa a repercutir no interior da comunidade científica. “Vale ressaltar que a ideia de utilizar as duas drogas juntas gerou um pedido de patente, que já foi registrado pela Inova [Agência de Inovação Inova Unicamp]”, informa Nicola.
A doença
A anemia falciforme é uma doença hereditária e incurável, provocada por uma alteração genética na hemoglobina que leva à deformação das hemácias (glóbulos vermelhos), o que confere a elas a forma de foice ou meia-lua após a redução na quantidade de oxigênio. A hemoglobina, molécula que dá cor vermelha ao sangue, tem a função de transportar o oxigênio dos pulmões aos tecidos. Para poder passar por todos os vasos sanguíneos, mesmo os mais finos, as hemácias são arredondadas e elásticas, mas a alteração ocorrida na hemoglobina, em pacientes falciformes, faz com que essas células se deformem, tornando-se mais rígidas ou endurecidas, com tendência a formar grupos que podem obstruir os pequenos vasos sanguíneos, dificultando a circulação do sangue. Isso pode gerar lesões em variados órgãos do corpo.
A detecção da anemia falciforme é feita por meio do exame eletroforese de hemoglobina ou exame de DNA. O diagnóstico proporcionado pelo teste do pezinho, logo após o nascimento, é muito importante para que os portadores da doença tenham acompanhamento médico precoce. A enfermidade acomete com maior frequência os afrodescendentes. Calcula-se que no Brasil nasçam, a cada ano, entre 650 e 1.000 crianças portadoras da enfermidade.