Difícil de esquecer

01/09/2012 - 13:00

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Estudantes de Volta Redonda

Estudantes de Volta Redonda

Paula e Lorrayne

Paula e Lorrayne

Os professores Daniel e Márcio

Os professores Daniel e Márcio

Fábio não relata casos de bullying

Fábio não relata casos de bullying

Enxergar a Unicamp de Portas Abertas (UPA) do meio-fio. Sentada, fiquei por alguns minutos esperando nosso fotógrafo registrar a imagem do 'oceano' de jovens de todo o Brasil, sobre o prédio da Biblioteca Central Cesar Lattes. Vi passar vários grupos, frases comuns: é para lá, não, para cá; não sei, estou perdido; nunca vim aqui, vamos andando. A placa 'rota a pé' era seguida por pés confortáveis, acomodados em tênis (surrados de preferência). Um grande passeio para quem irá, um dia talvez, estudar na Unicamp.

E minha missão seria questioná-los sobre o bullying, essa forma de agredir o mais próximo, quando está próximo ou não, como eu viria a constatar. A internet parece ser hoje a maneira mais usual de constranger. Há casos em muitas escolas e na maioria deles, o desfecho é evasão daquele que foi agredido. E assustada, ouvi de um professor que hoje, quem é mais ridicularizado dentro da escola ou mesmo em sala de aula é o aluno... que quer estudar, e que é tratado como “nerd”.

Ok. Cinco meninas sentadas e distraídas. Eu me aproximo e começo a conversar. Elas são de Volta Redonda, Rio de Janeiro, e contam que, na escola delas, houve um caso recente de um aluno (ou mais) que criou um perfil falso em rede social para falar mal de um suposto casal homossexual. O perfil foi adicionado por todos e com o tempo acabou se transformando em uma página que elencava diariamente os “10 mais”: magros, gordos, encrenqueiros, barraqueiros, etc...

A piada de mau gosto só acabou quando os próprios alunos deixaram de achar graça e passaram a excluir o perfil. Até hoje não se sabe quem foi o autor. Daniela, de 17 anos, chegou a ser citada em uma das listas. “Eu não levei a sério”.

Para os alunos que foram entrevistados este é um ponto crucial. “Quando deixa de ser brincadeira e passa a ser bullying?” pergunto. “Depende do espírito esportivo da pessoa, se ela se sente incomodada ou não”, me respondem duas amigas, a Paula e a Lorrayne, que já fazem cursinho pré-vestibular em Rio Claro (SP). Paula se recorda de um caso, quando fazia ensino médio: “a menina era modelo e o pessoal considerava que ela era muito convencida. Certa vez, durante um desfile, foi vaiada por todos”. Depois disso Paula conta que a garota mudou de escola.

Lorrayne é mineira e por essa razão ouve muitas piadinhas na escola. “Eu não vejo como bullying, mas percebo que muita gente não gosta dos mineiros. Da mesma forma quando eu estudava em Minas havia duas paulistas na minha escola que também eram alvo de constrangimentos”.

Os alunos de um colégio particular em Araçatuba consideram “mal-entendido” o que houve com uma aluna negra em sua escola, segundo o que relatam. “Não sabemos direito o que houve, mas ela teria sido chamada de preta, e não gostou. A sala inteira levou uma ‘lição de moral’ e a menina saiu da escola”, diz Brenno.

A escola 'ética' e os professores
Boa parte das direções das escolas não faz nenhuma recomendação aos professores sobre como lidar com o bullying. “Não sei definir tecnicamente o que é”, avisa Márcio, que é professor de artes de uma escola pública de Campinas. Ele e o colega Daniel, professor de biologia da mesma escola, dizem que é difícil para o professor identificar quando há bullying porque o tempo que passam com cada turma é pequeno devido a carga horária da disciplina que ministram.

No entanto é muito fácil perceber, afirmam, quem é o aluno que mais sofre intimidação na escola: “o nerd”, são categóricos. O aluno estudioso, que se interessa pelas aulas, gosta de ler e presta muita atenção. O aluno que está na escola para aprender. “Acredito que hoje essa é uma das principais razões que cerceiam o aprendizado”, salienta Daniel.

Na dúvida, Márcio chama a questão para si: “trago para mim, digo que também fui um 'nerd', faço um espelho, tento inverter e trago a questão da autoridade”. A delicadeza para lidar com o assunto não é própria de muitos professores. Pesquisa divulgada no Jornal da Unicamp em 2009, e que repercutiu enormemente, apontava que há casos em que os próprios professores vitimizam estudantes, em uma parcela considerável.

“Está cheio por aí, cheio de professores que fazem isso", relata Luiza, professora de matemática em uma escola municipal de Taubaté. Não é o caso de onde ela leciona, por conta, em sua opinião, de uma seleção criteriosa dos docentes.

Escolho para terminar meu texto o estudante Fábio, de 17 anos. Despreocupado, falou de sua escola em Campinas. “Mudei para essa escola na metade do segundo ano e me receberam bem, é uma escola ética, todos conhecem seus limites, ninguém se acha melhor que ninguém”.