Faltam engenheiros nos órgãos
públicos, diz presidente do Confea

30/05/2014 - 13:48

"Hoje não faltam engenheiros no país. Faltam nos órgãos públicos", garantiu o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) José Tadeu da Silva durante o 4º Seminário de Engenharia de Empreendimentos, realizado na Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) na manhã desta sexta-feira (30). O evento foi organizado pelo Laboratório de Empreendimentos (Labore). Segundo o presidente do Conselho, existe escassez desses profissionais, mas em áreas pontuais como as de petróleo e de gás, mais precisamente de mineração. "Todos os profissionais que se formam na engenharia com especialização nessa área são absorvidos de imediato pelo mercado de trabalho", comentou. José Tadeu ainda disse, em entrevista ao Portal da Unicamp, que tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) um projeto que tipifica a carreira do engenheiro como carreira típica de Estado, o que em sua opinião trará vantagens para quem optar por ela. Leia a entrevista. 

Portal Unicamp - Como está a situação do engenheiro no país?
José Tadeu - Fala-se muito da falta de engenheiros. Em outra gestão, falava-se de um PIB (Produto Interno Bruto) da ordem de no mínimo 4% ao ano. E alguns otimistas chegaram a falar em 7%. Para uma visão mais pessimista, no caso de 4%, deveríamos ter uma necessidade de 300 a 340 mil engenheiros no Brasil. Formamos por ano no país, nas carteiras emitidas nos 27 CREAs, 40 mil carteiras de engenheiros que se inscrevem para o exercício profissional. Em três anos, emitimos 120 mil carteiras. Para uma demanda de 300 mil, certamente iriam faltar engenheiros. Só que essas projeções não ocorreram. Os economistas projetaram 4% ou até mais, mas nós sabemos que o PIB não chega a 2%. Neste ano, que estava previsto em 1,69, já foi informado que vai chegar no máximo a 1,62. E todo exercício profissional da engenharia está relacionado ao PIB. Setenta por cento dele passa pelo nosso conhecimento. O que o engenheiro faz? Ele transforma recursos naturais em bens para a população sem causar danos ao meio ambiente. Essa é a definição da palavra engenharia. Quer dizer que estamos sempre utilizando o nosso saber científico e tecnológico para transformar a natureza e garantir qualidade de vida à população. Isso envolve o PIB. Não tem outro jeito de fazer a não ser pela engenharia. Se formamos 120 mil em três anos, e o PIB não foi de 4%, consequentemente os engenheiros que nós formamos é suficiente para atender a demanda do país. Temos escassez de profissionais engenheiros, mas pontuais.

Portal Unicamp - Em que áreas?
José Tadeu - Na área de petróleo, na área de gás, mais precisamente mineral. Todos os profissionais que se formam na engenharia com especialização nessa área são absorvidos de imediato pelo mercado de trabalho.

Portal Unicamp - Quais as ações que o Confea pretende assumir para garantir novo ânimo para essas áreas?
José Tadeu - O que fica claro para nós é que o Brasil precisa de infraestrutura em função das décadas perdidas do século 20. No século 21, o Brasil passou a ser a sexta maior potência econômica do mundo e precisa investir nas infraestruturas que ele não tem. Não temos transporte. O transporte está um caos. O metrô, que começou a ser feito na década de 1970, junto com o México, não cresceu o quanto podia. Basta olhar para o México, que tem quase 250 km de metrô, diferente de nós, que não temos 70 km de metro. Também não temos transporte coletivo, os aeroportos estão um caos e os nossos portos pior ainda.

Portal Unicamp - Mas tudo isso por causa da engenharia?
José Tadeu - Sim, por falta de investimento do governo. Quando ele investe em infraestrutura, e precisa investir nisso porque não tem, automaticamente aumenta o mercado e a demanda de engenheiros no mercado.

Portal Unicamp - Então no momento a perspectiva é boa para os engenheiros?
José Tadeu - Sem dúvida. Pelo menos é o que mostra o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo. Mas a nossa preocupação agora é a Copa o Mundo, uma "desculpa" para o governo investir em infraestrutura. Dizem que precisamos de transporte porque temos que receber um grande contingente de pessoas. Não é só transporte. Estádio também é serviço de engenheiro. As arenas que foram construídas por eles. Mas como vamos conseguir chegar às arenas? Do jeito que o mundo todo chega ao Brasil. Isso também envolve hospitais, rede hoteleira e tudo o que está em seu exercício profissional. A demanda é grande. O Brasil tem recurso. Precisa investir. Das obras projetadas para a Copa, de infraestrutura, inclusive os aeroportos, uma boa parte não será inaugurada. Faltaram 70% para concluir. O governo disse que tem os recursos garantidos no PAC e que vai continuar as obras. É o que esperamos.

Portal Unicamp - E os salários do engenheiro?
José Tadeu - Nós temos um piso salarial estabelecido na lei federal nº 4.950 A, que estabelece o salário mínimo da engenharia. Mas estamos com um projeto que trabalhamos no ano passado, e nesse ano no Congresso, que já passou na Câmara, foi para o Senado, passou pelas comissões e está na CCJ. Ele tipifica a carreira do engenheiro como carreira típica de Estado. Automaticamente, o governo deverá criar outras leis para fazer o plano de carreiras e salários do profissional nos órgãos públicos.


Portal Unicamp - O que isso implica?

José Tadeu - Hoje não faltam engenheiros no país. Faltam nos órgãos públicos. Países desenvolvidos como os EUA, a Alemanha e a própria China agora, que investiram muito em educação e C&T&i, a máquina pública lá é ocupada 80% por engenheiros. No Brasil, isso não chega a 10%. Então há uma falta muito grande na carreira de Estado para poder atender essa demanda na infraestrutura porque o Brasil não vai crescer nem progredir se não tiver engenharia. E, para ter engenharia, há necessidade de tipificar. Esse projeto está em terminativo na CCJ, já com o relato favorável do senador Romero Jucá. Deve ser aprovada na semana que vem e vai à sanção pela presidente Dilma, e aí vai entrar a tipificação da carreira de Estado, porque hoje só está nessa carreira o pessoal do Direito, e a engenharia não. E ela é tão importante quanto a área do Direito. Digo isso como engenheiro civil e advogado. Isso irá atrair demanda, porque os órgãos públicos em países que crescem [e o engenheiro é a cara do desenvolvimento do progresso do país] não é só desenvolvimento de potência econômica, é também social e ambiental. E essa tríade passa pelo notório saber técnico e científico da engenharia, passa pelas geociências, não é pelo Direito e nem pela Medicina. Para isso, o Brasil precisa dotar a máquina pública de profissionais da engenharia, aumentando os10% atuais. Nos países desenvolvidos, que atingiram o topo do planeta, 80% são profissionais. Então veja a demanda que vai ter de profissionais para a máquina pública com esse projeto que está tipificando a carreira de Estado, que consequentemente é uma valorização profissional da engenharia. Hoje as grandes cabeças dentro da engenharia se formam ou vão para a iniciativa privada, que ganha muito mais. No entanto, a maioria vai para fora do Brasil. Os melhores profissionais estão atuando fora. Tenho certeza de que os primeiros alunos da Unicamp, quando se formam, já têm demanda para o exterior. É o panorama que vemos.