Laboratório produz fibra muscular in vitro
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Prof. Augusto Luchessi e alunas Karina Pereira, Letícia Tamborlin e Isadora Almeida, do Laboratório de Biotecnologia da FCA. |
O Laboratório de Biotecnologia (Biotec) da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, inaugurado em dezembro de 2012, estabeleceu recentemente um modelo de cultura de células in vitro que permite redução expressiva do número de animais utilizados em alguns projetos científicos. O estudo foi coordenado pelo Professor Dr. Augusto Luchessi, responsável pelo Biotec, e contou com a participação das alunas Karina Pereira, Letícia Tamborlin, Isadora Almeida, Letícia Meneguello e do do pós-doutorando André Proença.
Mioblastos (células que dão origem às fibras musculares) foram cultivados e passaram por um processo de diferenciação originando miotubos, ou seja, células que mimetizam fibras musculares. Esse processo normalmente acontece no corpo do ser vivo durante a regeneração do tecido muscular, mas foi reproduzido pelo laboratório em modelo in vitro. Este trabalho foi realizado a partir de uma linhagem permanente de mioblastos, preparadas a partir de uma amostra de músculo animal e conservadas em nitrogênio liquido. Após a diferenciação em miotubos, as células podem ser utilizadas nos estágios iniciais de certas pesquisas científicas, reduzindo a utilização de animais.
Augusto Ducati Luchessi, professor da Faculdade e coordenador do laboratório, explica que as células cultivadas in vitro não são idênticas as de um músculo real, mas que seu comportamento bioquímico assemelha-se à fibra muscular de maneira a justificar sua utilização em alguns estudos. "Dependendo do experimento, é possível substituir o uso de animais por este tipo de célula. É uma maneira de controlar ou diminuir o uso de animais em experimentos", pondera.
Certas pesquisas na área de diabetes, como as que o laboratório pretende realizar, avaliam o efeito da insulina no músculo esquelético – com o modelo in vitro é possível analisar a ação do hormônio ou qualquer outro composto de interesse exclusivamente nestas células musculares, sem a interferência de outras células, tecidos ou órgãos do organismo. "Assim elimina-se o risco de um erro de interpretação dos resultados, pois quando o experimento é realizado no organismo teremos que lidar com a possibilidade do resultado observado ser derivado de uma ação indireta do composto, ou seja, como consequência da ação em outra parte do corpo e não no músculo”, explica Luchessi. Entretanto, outros estudos visam exatamente entender a ação global de determinados compostos no organismo, inviabilizando os ensaios exclusivamente in vitro.
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Análise da linhagem celular L6 em diferenciação por microscopia de fluorescência. Marcação dos filamentos de actina com faloidina - FITC (verde) e do núcleo com DAPI (azul). Nas imagens superiores estão demostradas células no oitavo dia de diferenciação (8dDIF) e nas inferiores células com 10 dias de diferenciação (10dDIF), ambas com 100 e 400 vezes de aumento. |
Redução no número de animais em pesquisas
Imagine a seguinte situação: um pesquisador precisa avaliar um conjunto de vinte compostos para rastrear quais deles estimulam a síntese proteica muscular em ratos, com o objetivo de aplicação futura da técnica em atletas ou alguém que esteja sofrendo de caquexia (perda severa de massa muscular devido a um processo tumoral) ou sarcopenia (perda de massa muscular associada ao processo de envelhecimento).
Considerando que cada um dos vinte compostos seriam avaliados com cinco concentrações diferentes, seriam cem testes. Então é preciso considerar o tempo do tratamento: vamos supor que o pesquisador precise analisar cinco tempos diferentes – seriam utilizados, portanto, quinhentos animais. Como o experimento é realizado normalmente três vezes com o objetivo de confirmar os resultados, o número final seria três vezes maior.
"Aí está a importância do modelo estabelecido no laboratório: todo este estágio de rastreamento pode ser feito in vitro. Vamos supor que o pesquisador descubra que somente dois compostos (do total de vinte), realmente estimulam a síntese proteica. Agora sim, é preciso passar para o modelo in vivo, mas teríamos um número bem inferior de animais, totalizando cento e cinquenta. É uma diminuição bastante considerável", pondera Luchessi.
Ele afirma também que os cientistas, de maneira geral, estão sempre buscando maneiras de diminuir ao máximo o uso de animais em pesquisas. "Desconheço alguém que não se aflija com o uso de animais em pesquisas, mas ainda é impossível substituí-los totalmente por métodos alternativos. Todos sofrem - pesquisadores, professores e alunos. Mas a ciência ainda depende do uso de animais em experimentos para se desenvolver".
Parcerias internas e externas
O Laboratório de Biotecnologia da FCA está aberto para parcerias científicas com outros laboratórios da própria faculdade ou de outras universidades, assim como com a indústria farmacêutica ou de suplementos, normalmente interessadas em avaliar parâmetros bioquímicos relacionados com a eficácia de diferentes compostos no tecido muscular. Além do desenvolvimento de novos compostos ou formulações Luchessi afirma que o laboratório tem interesse, por exemplo, de prestar serviços de controle de qualidade, avaliando a eficácia de fármacos ou suplementos no modelo in vitro estabelecido em seu laboratório. Por fim, Luchessi menciona urgência para o estabelecimento de uma parceria com um pesquisador que atue na área de Síntese Orgânica para que seja providenciado a síntese de uma molécula não disponível comercialmente e de interesse para suas pesquisas.
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O laboratório de biotecnologia (Biotec) está aberto a parcerias com outros laboratórios ou indústria farmacêutica |