Pesquisadores, ativistas e governo refletem
sobre participação e políticas públicas
30/04/2015 - 07:40
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“Reforma política e controles democráticos sobre o sistema político” foi o tema da primeira mesa-redonda desta quarta-feira, entrando no terceiro dia do II Encontro Internacional Participação, Democracia e Políticas Públicas, que prossegue até quinta no Centro de Convenções; paralelamente, acontecem os seminários temáticos, com a apresentação de mais de 200 trabalhos acadêmicos nas salas do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). O evento tem por objetivo estimular o intercâmbio entre pesquisadores e ativistas para aprofundar a reflexão sobre o campo da participação e das políticas públicas, bem como impulsionar ações para o avanço e ampliação da democracia no Brasil e no mundo.
O professor Wagner de Melo Romão, organizador do encontro, que veio para a Unicamp há um ano, ainda estava na Unesp de Araraquara quando lá foi realizada a primeira edição do evento. “Naquela ocasião, imaginávamos que a repercussão seria boa porque este debate sobre participação, políticas públicas e democracia é muito forte na ciência política e para além dela no Brasil. Mas tivemos 400 credenciados de todo o país e inclusive da América Latina (Argentina, Chile, Uruguai), que vieram apresentar trabalhos. E nos comprometemos com a segunda edição, já com uma comissão organizadora fortalecida por vários núcleos de pesquisa do país, e o local escolhido foi a Unicamp – a próxima será em Vitória, em 2017.”
Segundo Wagner Romão, a proposta básica é provocar a interconexão entre os campos de pesquisa da participação e de política públicas, que se desenvolviam em paralelo. “Além disso, provocamos também o contato com aqueles que chamamos de agentes, que estão na sociedade civil, nos movimentos sociais e no governo. O evento possui uma parte acadêmica intensa, que são os seminários temáticos da tarde, mas especialmente nessas mesas da manhã, procuramos cruzar o pessoal da academia com os ativistas e representantes governamentais.”
A conferência de abertura, na noite de segunda-feira, foi proferida por Gilberto Carvalho, ex-ministro da Secretaria Geral da Presidência da República e atual presidente do Conselho Nacional do Sesi (Serviço Social da Indústria). “Nos últimos anos, Gilberto Carvalho teve papel importante na tentativa de criar espaços de participação institucional dentro do Governo Federal, mediando aproximações com demandas dos movimentos sociais e sindicais”, explica o organizador do evento. “Ele falou sobre os desafios para quem está nesta posição no governo, onde há setores abertos a este contato com a sociedade civil e outros que defendem sua própria agenda de trabalho. Ele procurou mostrar esta tensão e também as perspectivas para o Brasil nesse campo.”
A primeira mesa
A primeira mesa da quarta-feira, coordenada por Ana Claudia Chaves Teixeira (Unicamp), teve como expositores o ativista José Antônio Moroni, do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política; o professor Claudio Gonçalves Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e colunista do jornal Valor Econômico; e o professor Max Cameron, da University of British Columbia e diretor do Centro de Estudos de Instituições Democráticas. A mesa propôs oferecer um olhar mais amplo sobre o tema da reforma política, discutindo outros mecanismos de controle democrático sobre os poderes e as estratégias para viabilizá-los.
José Antônio Moroni salientou que no âmbito da Plataforma da Reforma Política utiliza-se a expressão “reforma do sistema político”, para diferenciar seu objetivo daquilo que o Congresso Nacional, os partidos políticos e a grande mídia acabam identificando como uma reforma unicamente eleitoral. “Estamos falando de algo muito mais amplo, do exercício do poder, que deve ser colocado no centro deste debate sobre a reforma política. Temos uma sociedade estruturada nos processos de desigualdades – de renda, gênero, racial, geracional – e o nosso sistema político, ao mesmo tempo em que reflete tais desigualdades, também dá a sustentação política e ideológica para que elas se perpetuem.”
A título de exemplo, Moroni sugere um olhar com lupa para a Câmara dos Deputados, que em sua opinião espelha muito bem a sociedade brasileira. “Nosso Parlamento possui 10,4% de mulheres (não falo de feministas), 15% de negros (que são mais da metade da população) e nenhuma representação dos mais de 270 povos indígenas; os jovens são 6%, a maioria representando o poder hereditário (do pai e avô). Falamos, portanto, de reforma do sistema político, do exercício do poder e dos mecanismos para exercê-lo.”
Claudio Couto, segundo palestrante, confessou certo incômodo com o tema da reforma política, por ver outra conotação na ideia repetidamente enunciada por atores políticos e no debate pela mídia. “A reforma aparece quase como uma solução mágica para todos os males que afetam o sistema político do país. Acho que a expressão ‘reforma política’ tornou-se muito mais uma palavra de ordem do que uma plataforma com conteúdo determinado; geralmente, o que se coloca no debate público é um lema e não uma proposta clara. Isso me parece complicado por que reforma pode significar coisas diametralmente opostas: na reforma de uma casa, posso derrubar duas paredes ou construir mais quatro, dependendo do que eu quero. E, dependendo da parede que derrubo, a casa pode cair sobre minha cabeça. Em qualquer reforma, há o risco de deixar as coisas piores do que estão.”
Mobilização e ativismo
A segunda mesa-redonda da quarta-feira tratou de “Mobilização, ativismo e os limites da democracia”, tendo como expositores Monika Dowbor, do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento); Verónica Giordano, da Universidade de Buenos Aires e estudiosa dos movimentos sociais de direita; Guilherme Boulos, coordenador nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto); e Raúl Sanchez, líder do 15-M (Movimento dos Indignados de 15 de maio de 2011 em Madri) da Espanha.
As duas mesas marcadas para quinta-feira são: “Políticas públicas e controles democráticos: experiências pontuais ou regimes de controle democrático?”, com Roberto Pires (IPEA), Benjamin Goldfrank (Seton Hall University), Ernesto Isunza Vera (Ciesas-México) e Fabiano Angélico (Prefeitura Municipal de São Paulo); e “Política e inovação democrática na América Latina do século XXI”, com Wagner de Melo Romão (Unicamp), Moira Zuazo (Universidad Mayor de San Andrés e FES-Bolívia), Edna Maria Ramos de Castro (UFPA) e Adrian Gurza Lavalle (USP).