Pipoquinhas que
ensinam adultos
20/07/2015 - 15:31
- Text:
- Images:
- Images Editor:
Na escola, os pequenos Duda, de oito anos, e Mau, de dez, dialogam com a professora:“Tia, eu fui o campeão na dança da cadeira, sabia?”, revela um deles. “Nossa! Faz tanto tempo que não brinco de dança da cadeira”, comenta a professora, ao que é aconselhada pelo outro. “Tem que voltar a ser criança, tia. Ser adulto o tempo todo é chato!” Em outra conversa, Lu, de dez anos, chega contando para a professora “uma coisa terrível.” “Sabia que o mercado é preconceituoso?” “Como assim preconceituoso?”, questiona a professora. “É! Tem uma parte que vende produtos de limpeza, coisas para casa, pra cozinha, e está escrito ‘Espaço Mulher!’” Outro comentário, de Da, três anos, explica: “Tia, pato é uma galinha que morde.”
Os relatos reais, de crianças entre três e dez anos, foram captados em escolas de ensino infantil da região de Campinas por meio da escuta sensível de quatro estudantes de pedagogia da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Graduandas do último ano, Cristiane da Silva Antonio, Juliana Terra, Jéssica Caputti Moraes e Mariana Guimaraes resolveram compartilhar, nas redes sociais, as ‘falas’ tomadas do cotidiano escolar vivido por elas durante estágio realizado como parte das atividades de fim de graduação. A repercussão dos relatos das crianças foi tanta que as estudantes da Unicamp criaram uma página no Facebook, com 16 mil seguidores até o momento; e acabaram de lançar o Livro “Pipoquinhas – Papo de criança” (Pedro & João editores, 120 páginas, R$ 30,00 ), com as narrativas dos pequenos.
“Essas pequenas pipocas, que, de repente, pulam, têm algo de muito simples e que nos dizem muito. Por exemplo, a noção de dinheiro que alguns deles têm: eles são tão pequenos e já sabem que se você tem muito dinheiro é algo bom; se você, ao contrário, tem pouco dinheiro é ruim. Quer dizer: o mundo adulto já invadiu o mundo de uma criança tão pequena. Em outros relatos, as crianças relembram algo que os adultos perderam: a simplicidade, a inocência, a sabedoria...”, revela Cristiane da Silva Antonio.
“Ao escutar estas crianças, percebemos que suas falas são carregadas de um conhecimento e de uma vivência que não são valorizados no espaço escolar e na sociedade. E não adianta dizermos que vamos dar voz as crianças porque elas já falam. Precisamos ouvi-las”, complementa a estudante de pedagogia.
Para Juliana Terra, os relatos das crianças, que tornam a relação aluno-professor uma troca de saberes, permitem estabelecer novas ferramentas pedagógicas e outros contextos para a sala de aula. “O termo pipoca é um registro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada (GEPEC), coordenado pelo professor Guilherme do Val Toledo Prado, que, inclusive, assina o prefácio do nosso livro. Os professores e participantes deste grupo usam o termo ‘pipoca pedagógica’ para relatar situações do cotidiano escolar narradas a outros colegas docentes”, acrescenta.
No prefácio, Guilherme do Val, escreve: “Esses ‘papos de criança’, como as autoras nomearam, ganham vida quando são tratados como acontecimentos que necessitam ser narrados, de professor para professor, com o intuito de revelar a potência da palavra infantil na voz de uma profissional que preocupa-se com a formação de seus estudantes a partir do olhar sensível para a relação educativa que pode estabelecer-se entre pessoas de diferentes gerações.”
Além dos relatos do ambiente pedagógico, a página no facebook do Pipoquinhas também compartilha muitos relatos de crianças enviados pelo público que segue o perfil.