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Com
que roupa se vai ao crime?
Não bastassem o desemprego e a miséria,
as classes pobres continuam
sendo vítimas do estigma preto, pobre, ladrão
JOÃO
MAURÍCIO DA ROSA
A
nova roupagem da criminalidade ainda não é suficientemente
conhecida por suas vítimas. Mas nada tem a ver
com o estigmatizante adágio popular preto, pobre,
ladrão, afirmou o padre Benedito Ferraro,
em sua conferência no simpósio sobre Segurança
Urbana promovido pela Unicamp. Há muito tempo a
criminalidade se tornou organizada e ligada ao narcotráfico,
tendo enorme poder econômico e corruptor, contando com
a cumplicidade direta de parte do aparato de segurança
pública que mantém ligação, em grande
parte conhecida, com o sistema de corrupção política.
Ferraro,
professor do Instituto de Teologia e Ciências Religiosas
da PUC-Campinas, esteve no evento representando a Igreja Católica.
Ele lembra que muitos especialistas já desconfiam desta
associação imediata da pobreza com a criminalidade,
embora haja uma realidade muito presente sobre esta relação.
Cita informações do economista da Unicamp Marcio
Porchmann, dando conta de que, quanto mais cresce a pobreza,
há mais estímulo à violência, indicando
que para combatê-la é necessário melhor
distribuição de renda e também o combate
à pobreza.
Em Campinas, segundo a Acic (Associação Comercial
e Industrial), 16,7% da população economicamente
ativa estão desempregados, o que corresponde a aproximadamente
83 mil pessoas. Dados do Dieese para a Região Metropolitana
de Campinas ampliam este contingente para 100 mil pessoas.
O
padre recorda que a Igreja vem alertando desde o Documento de
Medellín (Colômbia, 1968) que a forma de organização
da sociedade é uma violência institucionalizada.
Em 1979, o Documento de Puebla (México) corroborava o
primeiro e classificava a sociedade e sua organização
como pecado social. Ou seja: o pecado está
embrenhado nas próprias dimensões da sociedade
econômica, política e culturalmente, explicou,
referindo-se ao fenômeno da exclusão social e lembrando
o Documento da CNBB nº 61, onde a entidade define as transformações
do movimento dos trabalhadores a partir dos anos 90: Antes
protestavam contra a exploração, agora nem mais
explorado o trabalhador pode ser, pois não tem emprego:
é desnecessário como mão-de-obra e desinteressante
como consumidor de baixa renda.
Agora,
após tê-los marginalizado, chegam a vê-los
como perigosos para a sociedade e criminosos em potencial,
acusou Ferraro. Precisamos colocar a segurança
como questão de cidadania e o grande problema nisso é
a despolitização da segurança pública.
Não podemos achar que a segurança seja apenas
uma questão de repressão policial, argumentou.
Para ele, as camadas mais pobres, ao mesmo tempo em que são
alvo principal no recrutamento para a criminalidade e suas principais
vítimas, também são o setor mais vitimado
pelo aparato repressivo, punitivo e menos protegido pelo Poder
Judiciário. E ainda são estigmatizados segundo
a famosa associação pobre, negro, ladrão.
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