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Nossas
contas, nosso ponto de vista
HERMANO
TAVARES
Apresento
à Comunidade Universitária uma versão
ampliada da exposição ao Conselho Universitário
(CONSU) em 18 de dezembro de 2001, na reunião extraordinária
que deliberou o orçamento de 2002. Este artigo
é uma prestação de contas do orçamento
da UNICAMP, no período que se inicia em 1998 e
termina em 2001. Nesse período, é bom frisar,
vivemos intensas variações de ICMS. Esse
biênio foi, do ponto de vista da receita, dos piores
nos últimos 12 anos, com o recolhimento do ICMS
sofrendo intensa redução no ano de 1998,
mesmo em valores nominais. Mas passamos também
por períodos melhores, como no ano 2000, em que
foi possível melhorar salários e resolver
questões de endividamento da Universidade.
Vamos
começar esta exposição pelo ano de
1998, em que foi muito crítica a situação
geral da Universidade. A previsão orçamentária
daquele ano, aprovada pelo CONSU em dezembro de 1997,
supunha que poderia haver um aumento em valores nominais
de 6% no RTE (Recursos do Tesouro do Estado). Contudo,
o que ocorreu foi um declínio do ICMS em termos
nominais.
Esta
mesma previsão orçamentária continha
recomendações, igualmente referendadas pelo
CONSU, de medidas relativas a vários assuntos,
dentre eles gastos excessivos com água, energia
elétrica, transporte e alimentação.
Nenhuma delas havia sido implementada até maio
de 1998. Ao final do primeiro quadrimestre de 1998, já
se podia perceber como era difícil a situação,
sobretudo em razão da queda abrupta da arrecadação
do ICMS. A folha de pagamento chegou a consumir nestes
meses iniciais nada menos que 99,9% dos Recursos do Tesouro
do Estado!
Assim
que assumi a Reitoria, no dia 22 de abril de 1998, tornei-me
também presidente do Conselho de Reitores das Universidades
Estaduais Paulistas (CRUESP). Logo em seguida, o CRUESP
promoveu reuniões para discutir o reajuste salarial
daquele ano. A partir da expectativa de que poderia haver
uma recuperação orçamentária
através do aumento do ICMS, acordou-se com os nossos
colegas do Fórum das Seis um reajuste salarial
de 3%.
O
ano de 1998 finalmente fechou com um valor dos Recursos
do Tesouro do Estado que se confirmou declinante da ordem
de 2,5% em termos nominais, em relação a
1997. Por esse motivo, a participação da
Folha Salarial na parcela dos RTE alocada para a UNICAMP
alcançou o valor de 95,6%. Gostaria de chamar a
atenção para o fato de que este é
o maior valor de comprometimento de Folha Salarial que
a Unicamp teve em toda sua história e, em particular,
na história de sua autonomia. As despesas de capital
e custeio foram necessariamente contidos dentro desse
ambiente, o que trouxe prejuízos claros para a
Universidade. É importante ressaltar que, apesar
dessa contenção, o custeio foi da ordem
de 16,5% do RTE. As despesas com os salários,adicionadas
do custeio e capital, somavam mais que 110% dos Recursos
do Tesouro do Estado. Com este cenário, portanto,
dívidas foram necessariamente contraídas.
Tivemos
também, no caso da Unicamp, questões trabalhistas
judiciais muito importantes. Citarei duas delas: o precatório
trabalhista decorrente da URP, que envolvia 512 funcionários
e estava calculado em R$ 70 milhões, valor que
a Unicamp não tinha obviamente como pagar. Tivemos
também um problema com o INSS, relativo à
perda do o certificado de filantropia que nos concedia
isenção no pagamento da parte patronal do
INSS dos servidores celetistas. Por conta disto, a direção
da Unicamp tinha acionado os fóruns competentes,
no sentido de tentar corrigir esta situação.
Na impossibilidade de recuperar o certificado de filantropia,
havia uma dívida presumível de da ordem
de R$ 100 milhões.
Neste
quadro adverso, que se somava à iminente e já
anunciada crise cambial que estava para ocorrer no país,
decidimos, até porque não tínhamos
outra alternativa, que o único caminho seria assumir
uma política de austeridade franca em relação
a capital e custeio, bem como um prolongamento de nossas
pendências com o IPESP. É de se lembrar que,
desde 1997, a Unicamp não recolhia os valores correspondentes
à contribuição de seus assalariados
ao IPESP.
No
caso do INSS, conseguimos junto ao Ministério da
Previdência Social sustar a autuação
de dívida passada, mas tivemos que assumir o pagamento,
doravante, da contribuição previdenciária
dos nossos funcionários contratados pela CLT (Consolidação
das Leis Trabalhistas). Isto implica num valor aproximado
de R$ 20 milhões por ano, incorporando-se às
despesas com salários presentes no Orçamento
da Unicamp, num gasto adicional de 4% a 5% da folha de
pagamento.
Quanto
à URP, o precatório envolvia um número
grande de funcionários e a questão havia
sido causada por determinações do Governo
Estadual, previamente à autonomia. Após
intenso trabalho junto ao Poder Judiciário conseguimos
reduzir o valor de R$ 70 milhões para cerca de
R$ 11 milhões. Além disso, conseguimos também
parcelar o pagamento dessa quantia em cinco anos. Estas
ações começaram a ser implementadas
no ano de 1998, mas só vieram de fato a ser concluídas
no ano de 2000.
Ao
passarmos para o ano de 1999, as dificuldades persistiram.
Em janeiro daquele ano, logo após o anúncio
dos resultados eleitorais, a crise cambial brasileira
explodiu, vindo se juntar aos outros problemas nacionais
com reflexos claros sobre o ICMS. No Orçamento
de 1999, tivemos um aprofundamento dos cortes em capital
e custeio e, no período de janeiro a abril, a nossa
folha chegou a ultrapassar 100% dos Recursos do Tesouro
do Estado. Contudo, outras negociações se
iniciaram e tiveram algum sucesso. Estas incluíram
a normalização dos repasses referentes à
Lei Kandir a partir de agosto de 1999 e o pagamento dos
atrasados referentes aos meses de janeiro a julho de 1999
em parcelas durante o ano de 2000.
Na
realidade, o fato de o Governo ter concordado em fazer
esta negociação já mostrava que começava
a haver uma certa folga nas finanças do Estado,
ou seja, a grande crise ocorreu aproximadamente de 1997
até julho de 1999. Assim, em 1999, para superarmos
esta crise orçamentária aguda, fizemos estudos
cuidadosos e racionalizamos gastos com capital e custeio.
O IPESP, contudo, continuou sem receber seus pagamentos.
Pressões muito fortes vieram de todos os lados,
sobretudo da área hospitalar da Unicamp. Esta,
como sabemos, é a área com maior envolvimento
social e que, por esta e outras razões, é
o setor que exerce a maior pressão sobre os gastos
de custeio e capital. Da mesma forma que ressaltei o fato
de que em 1998 ocorreu o maior comprometimento com a Folha
da história da autonomia, eu também gostaria
de ressaltar que 1999 é o único ano em que
o CRUESP não conseguiu dar reajustes salariais.
A
crise de 1998/1999 nos fez aprender algumas lições.
A primeira é a de que era necessário aumentar
a transparência do orçamento e realizar seu
monitoramento de forma mais detalhada, com o intuito de
alcançarmos maior consenso nas medidas necessárias
para enfrentar a crise. Ficou claro que as revisões
do orçamento adotadas em 1998/1999 deveriam se
tornar uma prática perene. Ficou também
claro que tínhamos que distinguir entre gastos
permanentes e gastos não permanentes. Distinguir
gastos que implicam em reflexos duradouros, como a contratação
de uma pessoa que em princípio vai ficar aqui trinta
anos, daqueles correspondentes a investimentos, que são
realizados uma única vez.
Aprendemos
também, a partir das lições ensinadas
neste período de grande dificuldade, que devemos
priorizar ações de descentralização,
além de trabalhar assumidamente com uma metodologia
que implante o planejamento com o apoio e a participação
dos membros do Conselho Universitário.
Deve
também ficar muito claro que as nossas despesas
correntes são quase totalmente fixas, enquanto
as nossas receitas são variáveis, muito
variáveis, dependendo do ICMS. O fato de termos
receitas variáveis e despesas fixas nos recomenda,
a longo prazo, a adoção de estratégias
para implantarmos um fundo na Universidade que possa compensar
estas variações do ICMS.
Para
a Área de Saúde, conforme já expressei
para os nossos dirigentes deste importante setor da Universidade,
creio que deveríamos evoluir para uma autonomia
gradativa. Deveríamos pensar em um método
de compensação entre o orçamento
e os aumentos que possamos eventualmente angariar nos
recursos SUS e nos recursos oriundos de planos de saúde
(ação em estudo por parte do Governo). Ainda
para esta área, gostaria de assinalar que foi possível,
através de ações junto ao Governo
Federal, sobretudo junto à Câmara de Deputados,
obter dotações do orçamento nacional
para investimentos na Área de Saúde da ordem
de R$ 5 milhões em 1999 e 2000; em 2001 ocorreu
um novo aporte. Estas dotações, embora aprovadas
algumas delas em 1999, só geram efeitos após
alguns anos. Neste momento temos, em fase avançada,
as construções do Bloco D e
do Hospital Dia.
Continua...
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