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CULTURA

 

A terceira categoria de mídia
TV Cultura dribla lei para se firmar como emissora da sociedade, em contraposição às estatais e comerciais

ual a diferença entre as emissoras de rádio e TV estatais e as emissoras públicas? As estatais só podem transmitir conferências, aulas, uma ou outra entrevista, e são proibidas de receber qualquer ajuda financeira da sociedade, mesmo que em forma de doação ou de publicidade institucional. Esta é a lei que a TV Cultura dribla dia e noite, dentro de sua proposta de exercer um papel social, levando ao ar cultura, educação, jornalismo e entretenimento.

Enquanto isso, as emissoras comerciais não exercem nem a função educativa nem a social, como ressalta Jorge da Cunha Lima, presidente da Fundação Padre Anchieta, mantenedora da TV Cultura. “Nós temos de forçar a barra, no sentido de garantir que a Cultura faça o que a sociedade precisa”, defende.

Cunha Lima explica que o conceito de televisão pública é novo, uma terceira categoria de mídia que não se regula pelo mercado das comerciais ou pelas normas das estatais. Ele julga que a Constituição, no papel, é bastante razoável quanto à função social e educativa exigida da radiodifusão. “Ocorre que a televisão comercial é totalmente subordinada ao mercado, aos índices de audiência de domingo, dia em que oferece um dos espetáculos mais degradantes da cultura contemporânea. A televisão educativa formal de hoje, por outro lado, está a serviço da propaganda política de governo”.

O presidente da Fundação Anchieta observa com ironia que a televisão pública está formalmente na ilegalidade, mas conceitualmente dentro do estabelecido na Constituição, promovendo o papel social e educativo; e que as demais estão formalmente na legalidade, mas absolutamente irregulares em relação à função da radiodifusão.

Segundo Cunha Lima, a Fundação Anchieta teve a sorte e o privilégio de ter se transformado em fundação de direito privado, criada pelo Governo do Estado de São Paulo, mas independente na gestão, com um conselho curador representativo da sociedade. “É um modelo institucional muito interessante. Somos uma televisão pública que tem compromissos com a população, eqüidistante do poder político e do poder de mercado”.

A pirataria – Sinceramente impressionado com os argumentos apresentados no mesmo auditório pelos integrantes da Rádio Muda (veja matéria nesta página), Cunha Lima afirmou a necessidade de que a sociedade conheça e discuta a regulamentação de radiodifusão e multimídia em tramitação em Brasília, ressaltando o papel difusor das rádios e televisões públicas, como a própria Rádio Muda e a TV Universitária (à qual a Unicamp é associada). Segundo ele, as emissoras livres têm de ser uma instituição da sociedade para a sociedade, realizando atividades de interesse da população. “Nesse sentido é preciso defender inclusive a pirataria, enquanto ela estiver voltada em exercer essa missão pública”.

O presidente da Fundação Anchieta lembrou que a lei que rege o rádio e a televisão no Brasil ainda é a mesma da ditadura militar, sendo esse um dos pontos que aproximam uma Rádio Muda da TV Cultura, já que ambas encontram-se no mesmo plano quanto ao aspecto da legalidade. “Não existe lei de radiodifusão no país. A lei em vigor, que é de 1967, não vale nada, não existe. A Cultura não segue essa lei”.

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Com a palavra, a Rádio Muda

À esquerda do auditório chamavam a atenção uma parafernália de equipamentos, a haste de uma antena retransmissora e um grupo descontraído de estudantes. Era o pessoal da Rádio Muda (105,7 MHz), cuja programação muitas vezes é marcada por discursos em tons libertários e captada por ouvintes fiéis da região de Barão Geraldo, distrito onde fica a Unicamp. A rádio livre ia transmitir ao vivo a palestra de Thiago Galleta, aluno de sociologia, convidado ao debate sobre “Mídia e Cultura”.

“As rádios e televisões públicas e livres no Brasil são a melhor resposta da sociedade democrática ao poder de concentração dos conglomerados e monopólios de comunicação de massa”, discursou Galleta. Informando que a Rádio Muda está no ar há mais de 10 anos e que o limite de subordinação da sociedade civil à estrutura de organização das mídias já foi rompido, o estudante emendou: “São os fatos que já atropelaram a imaginação dos políticos e dificilmente se poderá imaginar outra forma de viabilizar o acesso da sociedade aos meios de radiodifusão, que não seja a devolução das ondas ao domínio público”.

A proposta de democratização dos meios de comunicação, segundo Thiago Galleta, não será digna de crédito se não puder transformar a função social dos meios e garantir para a audiência canais que intervenham com autonomia. Lembrando que no Brasil – e no mundo – o mecanismo de concessões de rádio e TV não é e nunca foi um mero expediente técnico, e sim um sistema de controle das emissões pelo poder de Estado, o aluno de sociologia acrescentou: “Isso já é uma forma de censura, pois sua função é discriminar os que estão autorizados a falar e os que estão condenados a ouvir. A liberdade de imprensa que se garantiu na legislação da ‘nova democracia’ é extremamente precária, à medida que a liberdade de produção de conteúdo se encontra subordinada a uma estrutura de mídia, cujo controle está distante da maior parte da sociedade”.

Tecnologia – Galetta vê como outro fator fundamental o atual estágio tecnológico, que oferece a possibilidade de emitir sinais de rádio e TV por grupos de cidadãos com um mínimo de recursos e conhecimentos de eletrônica. “Qualquer legislação que ignore essa realidade está defasada no tempo. É responsabilidade de todos nós – universidades, movimentos sociais, minorias étnicas, partidos políticos, ONGs, comunidades locais e produtores culturais – garantir espaço também para outras modalidades de exploração, mais democráticas”.

No rádio, o espaço próprio para uma pequena revolução é o da freqüência modulada (FM). É uma forma de emissão relativamente barata e que não requer antenas transmissoras sofisticadas. É possível colocar no ar uma emissora investindo entre dois e três mil reais. O equipamento pode ser comprado em pequenas fábricas ou construído de maneira artesanal. As outras modalidades de emissão requerem tecnologia mais requintada e maior capital, razão porque as despesas dificilmente poderiam ser bancadas por emissoras sem interesse comercial. O alcance de FM também é mais limitado, o que favorece as experiências comunitárias ou as emissões voltadas para as populações locais.

 

 

 


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