Nelson Dagoberto de Matos
1 IntroduçãoEscrever sobre um pensador tão debatido quanto foi e é Rousseau parece-me uma tarefa complexa até para os que já transitam no campo filosófico; talvez mais ainda para alguém que se considera mais um curioso do que estudioso do debate filosófico, como é o meu caso. Desta forma por não me considerar com competência suficiente para empreender uma análise aprofundada de um tema determinado sobre Rousseau, pois isto demandaria um estudo mais extenso e profundo, optei por fazer sobre ele um relato genérico, para o que considero ter o curso me capacitado, tal a sua qualidade, referendada pela qualificação dos professores que nele atuaram. Assim, se tivesse que nomear este relatório certamente seria "Rousseau, uma síntese", esperando não cometer contra esse pensador, aos seus estudiosos ou aos professores que atuaram nesse curso, nenhuma heresia de cunho epistemológico.
2 Desenvolvimento
Em 28 de Junho de 1712, em Genebra, Suíça, nascia aquele que se tornaria uma importante e polêmica figura no campo do conhecimento humano: Jean-Jacques Rousseau. Sua história de vida, como diriam os adeptos marxianos, caracterizada por períodos de dificuldades como conseqüência da origem pobre, certamente marcou os pensamentos expressos nas suas obras, tendo ele próprio experimentado os efeitos das diferenças sociais entre os homens, as quais condenou.
Considerado um dos mais importantes filósofos iluministas, Rousseau se interessa inicialmente pela música, além do teatro, motivo pelo qual teria se transferido para Paris, à época referência do desenvolvimento do conhecimento, marcada pela efervescência de um movimento conhecido como Iluminismo. Esse movimento, cujo palco cronológico de eclosão é o século XVIII, foi conseqüência de toda evolução da ciência e das artes de períodos anteriores, que na concepção dos pensadores dessa época iluminaria o destino do Homem, promovendo o seu desenvolvimento. Daí este período ser também chamado de "Época das Luzes".
A questão básica da obra rousseauniana consiste em compreender as causas das mudanças nos seres humanos. Na busca dos "porquês" destas mudanças reside um aspecto prático que pode favorecer o controle sobre elas. Para Rousseau, a percepção dos objetos se dá por meio das nossas sensações cujo domínio tornaria possível controlar as mudanças que ocorrem durante nossas vidas, estabelecendo daí os contornos da moral sensitiva.
São estas sensações que, para Rousseau, impressas em nossas emoções, modelam a nossa conduta. Daí a moral sensitiva se propor a um duplo objetivo: fazer frente a estas alterações e fundar uma técnica de controle que nos tornasse mais seguros, mantendo a alma mais próxima da virtude.
A trajetória de Rousseau como um pensador paradoxal, característica daquele que pensa em paralelo ao pensamento hegemônico, se inicia após sua mudança para Paris. É na França que Rousseau, a partir de 1740, faz algumas ligações, especialmente com Diderot e d'Alembert, motivo pelo qual é convidado para escrever verbetes sobre música na Enciclopédia. Esta situação de co-autoria da Enciclopédia é que exigiu de Rousseau manifestar-se contra d'Alembert , quando este, influenciado por Voltaire, escreveu um verbete sobre Genebra. Neste verbete, d'Alembert entre outros temas, fala sobre o teatro suscitando o povo genebrino a quebrar alguns princípios morais daquela cidade contra aquela manifestação da arte. Pressentindo que, sob esta iniciativa de d'Alembert, havia a influência de Voltaire, contra o qual nutria uma certa antipatia pelo fato deste pretender ser referência no teatro tal qual ele mesmo, Rousseau escreve este manifesto. A sua contestação, onde afirma que a contribuição do teatro é inócua ou prejudicial às virtudes do homem, constitui a obra chamada Carta a d'Alembert, escrita em 1758. Quando escreve este manifesto contra d'Alembert, atingindo indiretamente Voltaire, Rousseau já era conhecido por outros escritos.
Ao ser convidado a participar de um concurso da Academia de Dijon, cujo tema era se o progresso das ciências e das artes tinha contribuído para aprimorar os costumes, Rousseau inaugura seu perfil de pensador polêmico, respondendo negativamente. Este é o primeiro discurso de Rousseau, escrito em 1750, com o qual ganhou o primeiro prêmio que lhe abriu as portas da fama e possibilidade de ser ouvido em círculos mais amplos. Em 1755, publica o Discurso Sobre a Origem e o Fundamento da Desigualdade entre os Homens.
No campo da teoria política e da pedagogia, Rousseau escreve em 1757 duas obras marcantes: O Contrato Social e Emílio.
Na primeira, contesta de forma clara as proposições de Locke e Hobbes segundo as quais a sociedade estabelece o contrato social em que os homens garantem a segurança para todos por meio da figura do Estado, cujo poder tem extensão diferenciada. Para Rousseau, o contrato social proposto por Hobbes e Locke é falso e situa-se como uma tentativa de convencer os mais pobres a se conformar com a situação de desigualdade, e com isto protegendo a condição dos mais ricos, perpetuando e aprofundando as diferenças entre as pessoas. São estas diferenças que Rousseau aponta como causa do sofrimento humano, propondo assim o retorno ao estado de natureza ou do Homem natural ou ainda, de acordo com a compreensão de estudiosos do pensamento rousseauniano, o refinamento do estado de natureza.Na segunda, Rousseau propõe um processo educativo envolvendo o professor (preceptor) e a criança, desde a primera idade até a fase mais avançada. Esta proposta de educação expressa a idéia de sistema em Rousseau, encontrando-se em 5 livros: idade da necessidade (o bebê); a idade da natureza (2-12); a idade da força (12-14); idade das paixões (15-20); e a idade da sabedoria e do casamento. A base desta proposta pedagógica é uma educação libertadora de uma criança, destituída de medo, inveja e outros comportamentos moldados pela sociedade.
Quando publicadas em 1762, estas duas obras são consideradas uma ofensa às autoridades e proibidas, ao tempo em que é ordenada a prisão de Rousseau, o que o obriga a exilar-se da França.
Em 1764, motivado por um panfleto atribuído a Voltaire, chamando Rousseau de hipócrita, pai ingrato (Rousseau entregou seus cinco filhos, tidos com Thérèse Levasseur, a orfanatos, procedimento justificado por ele pela sua condição de pobreza e doença) e amigo ingrato, põe-se a escrever outra obra onde relata toda sua vida e seu pensamento.
No campo da literatura, Rousseau é compreendido como um precursor do Romantismo, criando a análise do homem natural (feliz) e do homem na sociedade (infeliz), inaugurando a oposição entre o campo e a cidade. A valorização da natureza ou daquilo que ela tem de misterioso, marca do Romantismo, pode ser encontrado no romance A Nova Heloísa, escrito a partir de 1756.
Sua última obra, começa a ser escrita a partir de 1776, referindo-se a períodos da vida do filósofo e foi denominada Os Devaneios do Caminhante Solitário. Em 2 de Julho de 1778, em Ermenonvilhe, falece aquele que foi considerado um pensador radical, altamente crítico dos valores da sociedade da sua época e de linha de pensamento oposta aos seus pares iluministas.
3 Conclusão
Como a proposta deste texto não se submete ao rigor da metodologia de um trabalho científico, embora fundamentado em referências científicas, me permito fazer um comentário não mais sobre o tema do curso mas à organização do curso.
Não poderia deixar de ressaltar a alta qualidade do curso, que atendeu ao interesse de muitos profissionais nele inscritos buscando a fundamentação teórica para a sua atuação. Senti-me extremamente feliz por constatar a competência de uma Instituição Pública em realizar um evento aberto para a comunidade, legitimando sua função social, o que contraria a política equivocada de desmanche do ensino superior público no Brasil.
Gostaria de ressaltar ainda a seriedade e o compromisso acadêmico e profissional dos coordenadores professores Karin Volobuef e José Oscar de Almeida Marques, esperando que mantenham o vigor para novos eventos.