XIII Colóquio Kant da UNICAMP: “Kant e a Ciência de seu Tempo”

IFCH-UNICAMP – 14 a 16 de dezembro de 2011

 

Indexicalidade e indiferença na representação do espaço e tempo na Crítica da razão pura

 

José Oscar de Almeida Marques

Departamento de Filosofia – Universidade Estadual de Campinas

 

Resumo: Ao descrever a apreensão do espaço e do tempo como intuitiva, isto é, imediata e singular, Kant pareceria ter de admitir que ela se determina necessariamente pela situação particular do sujeito da intuição, comportando, portanto, inevitavelmente, aspectos indexicais ligados ao aqui-agora em que se realiza a intuição, além das correspondentes distinções entre direções espaciais (esquerda-direita) e ordenação temporal (passado-presente-futuro). No entanto, em todas as suas caracterizações do espaço e do tempo, Kant segue sempre o modelo newtoniano de um espaço e tempo uniformes e sem diferenças características entre as partes que os compõem. Neste trabalho pretendo examinar como essas duas atitudes se conciliam. Minha proposta é que nossa intuição do espaço e tempo só se torna objetiva quando envolve a representação de objetos no espaço e no tempo, e essa representação não se limita a objetos que estejam dados na intuição presente, mas estende-se a quaisquer objetos de uma intuição possível (A156, B195). Isto exige que o sujeito possa representar suas possíveis translações espaço-temporais de modo a passar da posição <aqui-agora> para outra posição <ali-então>, na qual em princípio a intuição do objeto se realizaria. Mas essa translação, por sua vez, só pode ser representada em um espaço e tempo não determinados pelas marcas indexicais associadas ao sujeito, isto é, um espaço e tempo que possa acolher indiferentemente todas as possíveis trajetórias e mudanças de perspectivas do sujeito. O não-perspectivismo comumente associado ao espaço e tempo newtonianos ("the view from nowhere") revela-se, então, como um perspectivismo completamente generalizado.

 

Indexicality and indifference in the representation of space and time in the Critique of Pure Reason

 

José Oscar de Almeida Marques

Department of Philosophy – State University of Campinas

 

Abstract: In describing the apprehension of space and time as intuitive, that is, immediate and singular, Kant would seem to admit that it is necessarily determined by the particular situation of the subject of intuition, and thus inevitably involves indexical aspects linked to the here-now in which intuition takes place, besides the corresponding distinctions between spatial directions (left-right) and temporal ordering (past-present-future). However, in all its characterizations of space and time, Kant always follows the Newtonian model of a uniform space and time and without characteristic differences between its component parts. In this paper I intend to examine how these two attitudes are reconciled. My proposal is that our intuition of space and time only becomes objective when it involves the representation of objects in space and time, and this representation is not limited to objects that are given in present in intuition, but extends to any objects of a possible intuition (A156, B195). This requires that the subject can represent his possible translations in space-time in order to move from the <here-now> position to another position <there-then>, where, in principle, the intuition of the object would be effected. But this translation, in turn, can only be represented in a space and time not determined by indexical marks associated with the subject, that is, a space and time can admit indifferently all possible trajectories and changing perspectives of the subject. In this manner, the non-perspectivism commonly associated with the Newtonian space and time ("the view from nowhere") reveals itself as a completely generalized perspectivism.