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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 08 de abril de 2013 a 14 de abril de 2013 – ANO 2013 – Nº 556Programa simula controle de sistema de resfriamento
Engenheiro químico desenvolve ferramenta que mimetiza funcionamento de equipamento
Os sistemas de refrigeração são comumente utilizados em supermercados, para a conservação de produtos perecíveis, em prédios com sistemas de ar condicionado central, para a manutenção de temperaturas confortáveis, e assumem particular importância em indústrias químicas que desenvolvem processos de transformação que exigem temperatura controlada. O gasto energético desses sistemas é muito alto e em determinadas indústrias chegam a corresponder a 70% do custo de produção. Segundo dados recentes, o consumo energético de sistemas de refrigeração chega a 10% da produção mundial de energia. Visando reduzir esses gastos, exaustivos trabalhos de pesquisa vêm sendo desenvolvidos.
No Laboratório de Controle e Automação de Processos (LCAP), da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp, é mantido protótipo de um chiller, sistema responsável pela refrigeração de um fluido de utilidade fria nos processos de refrigeração. Esse equipamento é utilizado em pesquisas de técnicas de modelagem e controle de novos sistemas de refrigeração que possam vir a reduzir o gasto energético. É no contexto das pesquisas desenvolvidas nesse laboratório, liderado pelos professores Ana Maria Frattini Fileti e Flávio Vasconcelos da Silva, que se situa o trabalho apresentado na dissertação de mestrado do engenheiro químico Saulo Fernando dos Santos Vidal, orientado e coorientado, respectivamente, por eles.
Ana Maria explica inicialmente que se procura normalmente com controle e automação obter um produto dentro da especificação desejada, com qualidade melhor, que envolva um processo ambientalmente correto e sustentável, com menor gasto de energia. Almeja-se, ainda, um sistema que funcione continuamente, sem necessidade de interrupções, pois os processos liga/ desliga (On-Off) usualmente empregados no controle de temperatura dissipam muita energia. “Em nosso caso, o objetivo não é obter um produto propriamente dito, mas o desenvolvimento de um sistema com o qual se possa economizar energia. O produto do processo que estamos desenvolvendo é simplesmente a corrente de um líquido resfriado, que constitui a utilidade usada no resfriamento de um sistema”, explica a docente.
As motivações
O protótipo do LCAP empregado para estudos foi montado por um grupo de pesquisadores e envolveu – e envolve – custos que não deixam de existir, pois, a cada experimento, podem ocorrer avarias quando ensaios mais drásticos são realizados, caso de um salto maior na rotação do compressor. Em vista disso, alguns destes testes estavam se tornando tecnicamente inviáveis, além de caros. Ao perceber a capacidade de desenvolvimento computacional de Saulo, que iniciava o mestrado, a orientadora sugeriu que ele fizesse uma programação para simular o funcionamento do equipamento de resfriamento. Os ensaios passariam então a ser realizados previamente no computador. A simulação computacional constitui uma alternativa muito mais barata e rápida de analisar e avaliar o comportamento destes processos.
Saulo acrescenta que o estudo de uma planta química, além de custoso, é geralmente demorado. Por isso, o uso de software capaz de modelar e simular os processos se tornou muito comum, contornando problemas envolvidos nos testes práticos. Essas simulações computacionais têm se constituído em valiosas ferramentas capazes de representar os processos e fornecer respostas com desvios aceitáveis em relação à realidade.
O trabalho
Para simplificação do trabalho a que se propôs, o pesquisador desenvolveu um modelo a partir dos simuladores comerciais Aspen Plus e Aspen Dynamics, utilizados para ensaios computacionais para a maioria dos sistemas químicos e capazes de representar o protótipo do LCAP. A partir da montagem desse simulador virtual, ele passou a utilizar o computador para testar variáveis e condições diferentes e drásticas. Na simulação, o modelo computacional responde da mesma forma que o protótipo, apontando qualquer problema, como a possibilidade de o compressor não conseguir responder à rotação solicitada. Mas a acurácia do modelo precisava ser avaliada. Para tanto foram utilizados dados obtidos da própria planta piloto experimental, em diferentes condições de processo, o que permitiu determinar a funcionalidade do modelo para situações adversas e também extremas de funcionamento do equipamento. A partir desta validação, o modelo computacional pode ser utilizado para avaliar modificações nas condições do processo e possibilidades de otimizá-lo.
Como nenhum modelo é capaz de representar o fenômeno físico com 100% de exatidão, o autor considera que “para se obter um projeto de controle robusto é necessário definir a melhor forma de aproximá-lo do real, tornando a simulação confiável”.
Para a validade da simulação são realizados experimentos no piloto com vistas a reproduzi-los no simulador. Os dados obtidos experimentalmente na planta são utilizados então para verificar se no simulador conduzem às mesmas respostas. “Nesse processo vai se parametrizando o modelo de forma a reduzir o erro ao mínimo, através de ajustes no simulador, até chegar a valores aceitáveis. É isto que se denomina validação do sistema”, diz a docente.
Sobre a necessidade de testar condições drásticas na simulação, ela exemplifica através do que ocorre em um balcão frio de supermercados que, quando praticamente vazio, é preenchido novamente. O sistema de refrigeração tem que dar conta dessas variações de condições extremas, chamadas de perturbações, para que os produtos adicionados sejam mantidos na temperatura desejada. Perturbações como essas são testadas no simulador para que ele indique como deve operar o compressor para resolver o problema de mudanças bruscas na temperatura.
Depois de constatada a representatividade da simulação em relação ao protótipo, o simulador passou a ser utilizado para poupar o protótipo. Começaram então os estudos de técnicas digitais de controle de processos que, no caso, trata-se de um programa computacional que, acoplado ao simulador, faz o cálculo da intensidade da rotação do compressor para a manutenção da temperatura desejada com economia de energia. Constitui, portanto, outro programa computacional que envolve o controle de processos vinculado ao funcionamento do compressor. Segunda a professora, não existe comercialmente programa computacional estabelecendo esse liame.
Os resultados
Em suma, a proposta do trabalho foi a de realizar a simulação de um sistema de refrigeração existente no Laboratório de Controle e Automação da FEQ, validando o modelo a partir da realização de experimentos no próprio protótipo. Embora inúmeros trabalhos venham sendo desenvolvidos com o intuito de estudar e avaliar o desempenho energético do protótipo existente no LCAP, um problema recorrente nessas pesquisas decorre do número de variáveis de processo, o que demanda um exaustivo esforço na busca de variáveis ótimas para o sistema de controle.
Em vista deste quadro, o trabalho procurou o desenvolvimento de um modelo computacional Aspen que fosse capaz de representar o modelo experimental e através do qual fosse possível simular prováveis situações de operação, de forma a encontrar a melhor combinação de variáveis que permita realizar um controle mais eficaz do processo. Para a professora Ana Maria, é possível desenvolver um modelo capaz de simular com relativa precisão o sistema de refrigeração a que se propuseram. A ferramenta computacional conseguiu reproduzir os valores encontrados no protótipo experimental, como ficou mostrado a partir da validação do modelo.
Os pesquisadores consideram que, testada a ferramenta e desenvolvido o modelo, se tornará bem mais simples realizar estudos no protótipo. A partir de um projeto inicial, será possível obter uma gama de dados em tempo consideravelmente menor do que o gasto se os testes fossem feitos no equipamento real. Além disso, outras estratégias de controle e modificações no protótipo poderão ser testadas no simulador, que permitirá também exportar o modelo criado para outros softwares e averiguar sem custos o uso de controle inteligente na planta experimental.
O advento dos controles digitais, lembra a docente, possibilitou alterar o funcionamento de outros equipamentos das plantas industriais. Antigamente, nas indústrias químicas, a alteração de uma vazão de resfriamento ou de produto era feita através do manuseio de válvulas por um operador, que as abria e fechava manualmente. Com o advento do controle automático, a abertura da válvula passou a ser mecanizada . Nos sistemas convencionais analógicos, as bombas têm que operar em sua máxima capacidade projetada e é a válvula que aumenta ou restringe o fluxo. Com a utilização do sistema digital desenvolvido, controla-se a rotação dos motores de bombas ou compressores, conforme a necessidade de fluxo, o que leva ao menor consumo de energia. A expectativa, segundo os pesquisadores, é a de uma economia energética de até 12%, muito significativa em plantas industriais em que a energia compõe 70% do custo de produção. Ana Maria conclui, destacando a preocupação com a formação de recursos humanos: “O Saulo aprendeu a trabalhar com sistemas físicos de controle e automação, área em que há uma carência muito grande de profissionais no mercado de engenharia química. Existem engenheiros de automação e controle, mas eles dificilmente entendem o que se passa nos processos químicos. Então, aqui na faculdade, procuramos desenvolver o engenheiro químico interessado na área de automação e controle, porque do processo químico ele entende. Dessa forma, se torna mais fácil a formação desse profissional de grande carência no mercado”.
Durante o estudo, Saulo aprendeu a trabalhar com hardware de controle, com simulador dinâmico Aspen, extensamente usado na indústria química, e com o desenvolvimento de controladores inteligentes. Ela constata que 85% dos sistemas químicos industriais utilizam ainda hoje o sistema tradicional de controle, principalmente por falta de especialistas que saibam utilizar estes novos recursos digitais.
Publicação
Dissertação: “Simulação dinâmica para avaliação de controle de um sistema de resfriamento de líquido”
Autor: Saulo Fernando dos Santos Vidal
Orientadora: Ana Maria Frattini Fileti
Coorientador: Flávio Vasconcelos da Silva
Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ)