Unicamp
Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 04 de abril de 2016 a 10 de abril de 2016 – ANO 2016 – Nº 651Pesquisa alerta para adição de
sucralose em alimentos quentes
Resultados demonstraram que, quando aquecido, adoçante torna-se quimicamente instável, liberando compostos tóxicos
Um artigo científico publicado por pesquisadores da Unicamp num periódico online pertencente ao grupo Nature alerta para os riscos do uso do adoçante sucralose, especificamente, em alimentos e sobremesas quentes, como chás, cafés, bolos e tortas. Os principais resultados do estudo indicam que, quando aquecido, o adoçante torna-se quimicamente instável, liberando compostos potencialmente tóxicos e cumulativos ao organismo humano.
Derivado da sacarose, o nosso açúcar de mesa, a sucralose é o adoçante mais consumido no mundo e liberado irrestritamente pelos principais órgãos de segurança alimentar, incluindo o Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, o Joint Expert Committee on Food Additivies (JECFA), da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Brasil.
No estudo que gerou a publicação no periódico online de acesso livre Scientific Reports (https://www.nature.com/articles/srep09598), o professor Rodrigo Ramos Catharino, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unicamp, e os pesquisadores Diogo Noin de Oliveira e Maico de Menezes demonstraram que, quando aquecida, a sucralose torna-se quimicamente instável, liberando hidrocarbonetos policíclicos aromáticos clorados (HPACs), compostos tóxicos, cumulativos no organismo humano e potencialmente cancerígenos.
“Com a queima das moléculas da sucralose há a formação de HPACs, uma família de compostos que têm muita facilidade para se tornarem tóxicos e mutagênicos. Isso acontece na sucralose por conta de um rearranjo das moléculas, quando elas são aquecidas. Outro fator preocupante é que esta substância liberada pelo aquecimento da sucralose é extremamente cumulativa no nosso organismo”, explica o professor Rodrigo Ramos Catharino, que coordena o Laboratório Innovare de Biomarcadores da Unicamp e atua junto ao curso de Farmácia da FCF.
O docente da Unicamp assegura que o estudo é o primeiro, em nível mundial, a relatar o comportamento térmico da sucralose, abrangendo uma vasta gama de abordagens analíticas, como análises térmicas, espectroscopia no infravermelho e espectrometria de massas. Os HPACs estão associados ao aumento da incidência de diversos tipos de canceres no homem. A exposição humana aos HPACs se dá principalmente através da contaminação ambiental por meio da fumaça gerada a partir da queima de combustíveis fósseis.
“Os resultados da nossa pesquisa apontam dados novos na área de toxicologia de alimentos, indicando que a exposição crônica de seres humanos ao adoçante, caso, por exemplo, de diabéticos e de quem faz dietas especiais, pode causar efeitos nocivos à saúde. O uso deste edulcorante artificial merece, portanto, muita atenção dos consumidores, além do desenvolvimento de outras pesquisas por parte de órgãos de regulamentação”, indica.
O estudo da Unicamp, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), não determinou a quantidade liberada e o impacto direto da queima da sucralose no organismo humano. Foram utilizadas duas marcas do adoçante, adquiridas no comércio de Campinas e região. Devido a questões legais e éticas, os nomes dos fabricantes não foram revelados na pesquisa. As amostras foram submetidas a aquecimento em banho-maria, em temperaturas suaves para avaliar um amplo espectro de compostos perigosos formado na degradação do produto.
“Nós observamos uma liberação de HPACs a uma temperatura próxima a 98 graus célsius, um pouco abaixo da temperatura de ebulição da água. É uma temperatura muito próxima de um chá quente ou de um café”, revela o pesquisador Diogo Noin de Oliveira, que conduz doutorado na área sob a orientação de Catharino. O seu colega Maico de Menezes, que assina o artigo, também é orientado de Catharino em pesquisa de mestrado em andamento.
Ainda de acordo com o doutorando da FCM, a sucralose é produzida sinteticamente a partir da sacarose, o açúcar de mesa obtido, no Brasil, por meio da cana-de-açúcar. A principal diferença química entre este edulcorante e o açúcar comum é a existência de átomos de cloro presentes na sucralose. Tais átomos são capazes de aumentar o poder de doçura do adoçante, que chega a ser 400 vezes maior do que o da sacarose.
“O açúcar comum possui átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio (C12H22O11). Na sucralose (C12H19Cl3O8) alguns átomos de oxigênio foram substituídos pelo cloro. Dentre outras características, isso confere a ela um poder de dulçor maior. Observamos, porém, que estes átomos de cloro aumentam não só o poder adoçante dela, mas a reatividade. Quimicamente ela se transforma em algo que vai reagir mais facilmente. Isso, portanto, explica essa instabilidade da sucralose em temperaturas mais quentes”, conta Diogo de Oliveira.
Neste ponto, Rodrigo Catharino esclarece que a sucralose não decomposta é isenta de riscos ao nosso organismo. “Se não aquecer a sucralose não tem problema nenhum, ela é completamente inofensiva”, confirma. Ainda conforme Catharino, a reação verificada com o aquecimento da sucralose é muito similar ao que acontece com a queima da carne do churrasco. Neste último caso ocorre a liberação de HPAs, hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, semelhantes aos HPACs, diferindo apenas pela presença do cloro.
“No churrasco, em produtos defumados e até no fumo é possível encontrar HPAs. A queima de combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás de carvão, é uma das principais fontes de emissão destes compostos. Tantos os HPAs como os HPACs são bastante nocivos. No caso específico do churrasco, que já é bem conhecido, a formação dos HPAs ocorre quando a gordura da carne respinga no carvão por conta do calor. Com a fumaça, estes compostos aderem à carne trazendo riscos à saúde”, exemplifica.
Rótulo
Conforme os pesquisadores da Unicamp, muitos fabricantes informam, no rótulo do adoçante, que a sucralose é estável ao aquecimento, indicando e sugerindo, inclusive, receitas com alimentos quentes, como chás, bolos, tortas, entre outros. “Não foi isso que o estudo demonstrou”, rebate Rodrigo Catharino.
Ele situa que nos últimos anos outras pesquisas vêm chamando a atenção da comunidade científica sobre a segurança alimentar da sucralose e de suas aplicações industriais. Para Catharino, embora seja o adoçante artificial mais utilizado em alimentos e produtos farmacêuticos, muitas perguntas ainda precisam ser respondidas quanto ao potencial da sucralose em degradar e formar subprodutos clorados em temperaturas quentes.
“A sucralose é o adoçante artificial mais utilizado tanto para fins industriais e uso pessoal. Embora inicialmente considerado seguro para uso, a literatura recente aumentou a conscientização sobre o potencial de que a sua estrutura tem de gerar compostos tóxicos quando expostos a temperaturas altas. Importantes contribuições têm ampliado significativamente o conhecimento sobre as condições precisas em que estas moléculas indesejáveis surgem. Este é o caso da nossa pesquisa”, contextualiza.
Publicação
de Oliveira, D.N., de Menezes, M. & Catharino, R.R. Thermal degradation of sucralose: a combination of analytical methods to determine stability and chlorinated byproducts. Sci. Rep. 5, 9598; DOI:10.1038/srep09598 (2015).
Comentários
Trabalho muito interessante.
Trabalho muito interessante. Parabéns aos autores. Sucralose e sacarose, da qual se origina tem fórmulas "semelhantes". Saberiam informar o que acontece com a sacarose quando aquecida em idênticas condições do teste? Fico no aguardo.
Cordialmente,
Lino José C. Santos