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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 08 de agosto de 2016 a 14 de agosto de 2016 – ANO 2016 – Nº 664Pesquisa utiliza satélite para
detectar petróleo na superfície
Metodologia é proposta em artigo originado de tesede doutorado ainda em desenvolvimento no IG
Pesquisa em desenvolvimento para a tese de doutorado do geólogo Saeid Asadzadeh propõe nova abordagem para promover a detecção direta de petróleo exposto na superfície terrestre. O método utiliza a técnica do sensoriamento remoto, mais especificamente os dados gerados pelo satélite comercial WorldView-3, operado pela empresa norte-americana DigitalGlobe. Os resultados preliminares gerados pelo trabalho, que só será concluído em dois anos, deram origem a quatro artigos que foram publicados nas mais importantes revistas científicas da área. Um deles recebeu o prêmio concedido pelo Geological Remote Sensing Group, da Geological Society of London (Reino Unido).
Asadzadeh, que é iraniano, é orientado por Carlos Roberto de Souza Filho, professor titular do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. A tese desenvolvida pelo pós-graduando estuda diferentes sistemas petrolíferos, a partir de ferramentas de sensoriamento remoto. O objetivo é identificar, com o auxílio de sensores no solo, a bordo de aviões ou em satélites, a presença de petróleo na superfície, a distâncias que variam de alguns poucos metros a 700 quilômetros. “No momento, estamos estudando a detecção de hidrocarbonetos na superfície terrestre, o petróleo em particular”, afirma o pesquisador.
O professor Carlos Roberto explica que o petróleo pode alcançar a superfície por meio de exsudações naturais. “A despeito de os reservatórios ficarem localizados a certa profundidade, eles não são totalmente selados. Assim, podem ocorrer fraturas que são permeadas pelo óleo, que por sua vez atinge a superfície e fica eventualmente exposto”, detalha. O docente observa que, quando as pessoas pensam em petróleo, normalmente o associam a um óleo escuro, portanto fácil de ser observado. “Mas nem sempre é assim. Existem óleos leves que apresentam praticamente a mesma coloração e viscosidade da gasolina”, informa.
Um dos recursos utilizados por Asadzadeh em seus estudos é o satélite WorldView-3, capaz de gerar imagens da ordem de 30 centímetros de resolução espacial. O equipamento possui características sem precedentes. Opera com 16 bandas espectrais, a melhor configuração na história para essa categoria de satélites. Seu antecessor – o ASTER - possuía somente nove bandas no mesmo intervalo do espectro eletromagnético. “O interessante é que uma dessas bandas, que opera na região do infravermelho, é capaz de identificar a assinatura do petróleo. Nem a DigitalGlobe, proprietária do WorldView-3, previa isso. Foram nossos trabalhos recentes que chamaram a atenção da empresa para essa capacidade”, conta o professor Carlos Roberto.
Até então, a DigitalGlobe considerava outro conjunto de bandas espectrais, de comprimento de onda mais longo, para identificar hidrocarbonetos. “Nesta faixa, também é possível fazer a identificação. Entretanto, essas bandas espectrais também detectam a assinatura de vários minerais presentes em solos e rochas, o que pode dificultar a detecção direta de petróleo, gerando, por hipótese, resultados considerados falsos positivos”, completa o docente do IG. Na banda sugerida pelos pesquisadores da Unicamp, as “feições” relacionadas ao petróleo são mais fáceis de serem identificadas diretamente.
Os obstáculos naturais ao uso do satélite para a identificação direta do petróleo, conforme os especialistas, são a presença de nuvens ou de vegetação densa. Esta última, porém, pode contribuir para a identificação indireta do óleo. O professor Carlos Roberto explica que a presença do petróleo no solo normalmente causa algum tipo de estresse nas plantas. “Algumas espécies podem ter o desenvolvimento afetado. Por outro lado, espécies que não deveriam estar num determinado local podem se desenvolver ali, dado que se valem, por exemplo, dos gases emitidos pelos hidrocarbonetos para seu crescimento. A ocorrência de um ou outro caso pode nos fornecer evidência de que há petróleo em determinado local”, pormenoriza.
Em seu trabalho, Asadzadeh utilizou o sensoriamento remoto para analisar áreas no Brasil, Irã e Estados Unidos, cada uma com características próprias. Enquanto no Brasil os reservatórios de petróleo estão localizados a significativas profundidades, no Irã eles ficam praticamente expostos, dado que muitas vezes estão situados a poucos metros abaixo do solo. “Nós solicitamos à DigitalGlobe a varredura dos locais de interesse com o WorldView-3. Depois, fomos a campo para coletar amostras e analisá-las em laboratório. Com isso, conseguimos validar as simulações que fizemos em laboratório acerca da possibilidade de identificar petróleo diretamente na superfície terrestre”, afirma o autor da tese. De acordo com ele, essa metodologia pode ter diferentes aplicações.
A primeira delas é localizar possíveis reservatórios petrolíferos para exploração comercial. Outra aplicação é utilizar o sensoriamento remoto para monitorar sítios de refinarias e áreas próximas, para verificar a ocorrência de vazamentos de combustíveis e determinar, consequentemente, ações de remediação. A ferramenta também pode ser utilizada, acrescenta o professor Carlos Roberto, para identificar outros elementos, como metais preciosos ou minerais utilizados em larga escala pela indústria. “Tudo isso no campo da geologia. Mas há outras possibilidades, como aplicar o sensoriamento remoto para fazer o levantamento de espécies vegetais de uma determinada reserva”, exemplifica o docente do IG.
Nessa linha, outro orientando do professor Carlos Roberto está realizando, com o auxílio dessa ferramenta, o mapeamento de espécies da Mata de Santa Genebra, área de proteção ambiental remanescente da Mata Atlântica, localizada na área urbana de Campinas. “Esse trabalho é mais fácil de ser feito em regiões de clima temperado, onde a variedade de espécies não é tão grande. Aqui no Brasil, que tem clima tropical, a diversidade da flora é imensa. Temos inúmeras espécies, de diferentes tamanhos e conformações. Está sendo um desafio fazer essa distinção”, conta o docente do IG.
A tese desenvolvida por Asadzadeh, de acordo com o professor Carlos Roberto, se encaixa perfeitamente no perfil dos trabalhos que compõem a linha de pesquisa do seu grupo, que apresenta abrangência internacional. “Eu quero que meus alunos concorram com os melhores estudantes do mundo. Essa busca por qualidade internacional é uma das razões que nos permitiram realizar a pesquisa do Saeid. Até aqui, não gastamos recursos de projeto para utilizar os dados gerados pelo WorldView-3. A DigitalGlobe tem nos cedido as informações gratuitamente, por entender que os resultados que temos gerado e ainda podemos gerar serão importantes inclusive para orientar a construção de novas gerações de satélites”, pontua.
O reconhecimento internacional às pesquisas realizadas pelo grupo coordenado pelo professor Carlos Roberto também pesou na decisão de Asadzadeh de vir realizar a pós-graduação na Unicamp. “Na minha visão, a Unicamp exerce a liderança mundial na área de sensoriamento remoto, principalmente quando o assunto é petróleo”, considera o doutorando, que conta com bolsa de estudos concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Segundo o docente do IG, ao longo dos anos o seu grupo alcançou importantes resultados, sendo que vários dos estudos mereceram premiações de destacadas entidades científicas nacionais e internacionais.
Outra conquista citada por ele foi a estruturação do laboratório, graças a financiamentos de agências de fomento não somente do Brasil, mas também do exterior. “Nós contamos com o apoio da Fapesp, CNPq, Finep, Petrobras e Nasa, entre outros. Recentemente, superamos a primeira etapa de um edital internacional para a realização de nova pesquisa na área”, adianta. Questionado se os resultados obtidos até aqui com a tese de Asadzadeh demandariam alguma ação no âmbito da proteção intelectual, o docente do IG diz que esta questão ainda está sendo analisada.
Ele explica que os dados gerados pelo satélite não podem ser protegidos, visto que não pertencem à Unicamp, mas sim à DigitalGlobe. “O que nós estamos estudando é eventualmente pedir o depósito de patente de softwares de detecção ou de alguns dos métodos que temos desenvolvido. Outra possibilidade é criar e patentear bibliotecas espectrais. Nesse caso, os dados relacionados às assinaturas espectrais de hidrocarbonetos e suas misturas com outros materiais geológicos, por exemplo, poderiam ser de interesse da indústria”, infere.