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>>ENERGIA

É o fim do mundo?
ECientistas defendem a necessidade de se mudar a predominância
dos combustíveis fósseis e adotar fontes mais limpas de energia


Carlos Tidei

A ameaça de um futuro trágico também faz parte das preocupações dos cientistas. Pelas projeções da IPCC – agência das Nações Unidas que mede emissões de poluentes –, o aumento da poluição, resultado da escalada global do desenvolvimento energético, revela a necessidade de se mudar a predominância do uso de combustíveis fósseis para fontes mais limpas de energia. José Goldemberg declara grande preocupação com o impacto ambiental, como o causado pela emissão de chumbo, que cresceu 18 vezes nas últimas décadas. As emissões de carbono, por sua vez, também provocam sérias conseqüências ao clima: aumento da temperatura global, com forte impacto na produção de alimentos e o derretimento de geleiras.

Nebojsa Nakicenovic, cientista de Luxemburgo, alerta que não basta trabalhar o desenvolvimento tecnológico, mas também o comportamento do ser humano em relação ao consumo. Opinião compartilhada por William Sefton Fyfe, da Universidade de Otago, Nova Zelândia, para quem a qualidade mais universal é a diversidade. “Não podemos produzir energia adequada e limpa para bilhões de pessoas, mas se continuarmos a fazer o que estamos fazendo, o aquecimento global pode resgatar a sobra de Chernobyl, o dia do julgamento final. O desastre seria nossa escolha”, adverte.

“Ghandi dizia que, quem consome mais do que necessita, está cometendo um crime”, filosofou Othon Leonardos, da Universidade de Brasília. “A ciência e tecnologia estão destruindo a nossa casa”, reforça. Segundo ele, a biosfera apresenta trocas complexas e o grande desafio do nosso tempo é sobreviver, e se possível viver com qualidade. Existem estatísticas inacreditáveis: no Estado de Goiás, as matas, que ocupavam 20% do território, foram reduzidas a uma área de 0,3%, por conta da revolução agrícola que devasta nosso habitat. “Precisamos de uma nova agenda para esse século, atacando o problema comportamental que nos impede de desligar a máquina, de acumular coisas e abusar da terra”, professa.

“Quem precisa de carro grande? Para conquistar mulher bonita?”, questiona Fyfe. “Não precisamos de carro, mas de outra arquitetura. A qualidade da educação é a chave. Precisamos pensar globalmente, mas agir localmente”, deduz. Fyfe diz que a humanidade possibilitou a destruição em massa com a energia nuclear convencional, não existindo forma segura de descartar resíduos. “Países vão fechar as usinas nucleares, mas os riscos continuam”.

O armazenamento de plutônio oferece risco de vazamento em estruturas de concreto. O lixo atômico dos EUA está depositado em uma área vulcânica, enquanto na Suécia este lixo é revestido de cobre por mais segurança. “Se você não conseguir apertar a descarga em sua casa, a vida vai ficar difícil. É mais ou menos o que está acontecendo no mundo. A Shell pretende usar combustíveis biológicos e sua fonte de matéria-prima é a Amazônia”, denuncia Fyfe.

Fumaça mortal – José Roberto Moreira, da USP, apresentou estudos revelando que a emissão de carbono cresce mais no setor de transporte; na indústria e na construção ela diminui; na agricultura, é estável. Na cidade de São Paulo, o número de mortes causadas pelo dióxido de enxofre emitido por motores de combustão decresceu com o rodízio e os investimentos em tecnologia, que melhoraram a qualidade do ar. Mas muita gente ainda morre em decorrência da fumaça.

Antes não havia estatísticas confiáveis sobre os reais impactos da poluição na saúde da população. Hoje se tem como fato que doenças respiratórias e cardiovasculares estão diretamente relacionadas com o nível de partículas no ar. Estudos epidemiológicos atuais medem os níveis diários de poluição e a morbidade – doenças respiratórias e cardiovasculares – e a mortalidade – relacionada em modelagem por técnicas de séries temporais.

Existe uma tendência sazonal de óbitos: morre-se mais em julho e menos em dezembro, onde se constata que o frio mata mais; morre-se mais também às segundas-feiras. Excluindo-se esses fatores, ou acompanhando a evolução dos números, é gradual o risco de morrer devido ao aumento da poluição, de enfarto no pico da poluição e de doenças respiratórias um ou dois dias depois. Na mortalidade relacionada com o monóxido de carbono, sofrem mais as crianças.

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O combustível do seu carro

Q produção, em maior escala, de motores capazes de operar com diferentes combustíveis, foi defendida no segundo dia do encontro por Luiz Augusto Horta Nogueira, presidente da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Ele argumentou que, frente ao inevitável caráter não renovável das reservas de petróleo e gás natural, é oportuno o desenvolvimento de sistemas combinados com energia renovável. Mas só tecnologia não basta: a viabilidade de alternativas energéticas no mercado automotivo depende da confiança do consumidor.

Nogueira observou que as reservas de combustíveis fósseis são necessariamente exauríveis e devem ser utilizadas com a clara noção de sua inerente e irreversível exaustão. Assim, na busca de uma perspectiva sustentável para a indústria do petróleo e do gás natural, é importante que se considerem as possibilidades de transição para fontes energéticas mais brandas.

No caso do Brasil, salientou ele, algumas destas alternativas já estão identificadas e devem ser reforçadas, especialmente aquelas associadas ao uso das bioenergias, como o álcool, cujo potencial brasileiro é reconhecido. “Com o Programa Nacional do Álcool, o etanol hidratado efetivamente passou a deslocar parte da demanda de gasolina, exigindo motores exclusivos para este combustível e determinando a existência de uma frota cativa de veículos a etanol, como de resto existe uma para veículos a gasolina”, lembrou.

O presidente da ANP esboçou ainda um outro cenário possível, em que as bioenergias atuariam como complemento e não como combustíveis exclusivos, proporcionando uma transição mais suave. Exemplos dessa complementaridade entre biocombustíveis e combustíveis fósseis são os veículos multicombustível (flexible fuel), que trabalham com mesclas de gasolina-etanol anidro. De acordo com Nogueira, motores com essa tecnologia equipam uma frota de quase um milhão de carros nos Estados Unidos.
Fabricantes nacionais de auto-peças e sistemas de ignição dominam a tecnologia do flexible fuel, e alguns veículos de linha já saem das montadoras para as ruas equipados com motores multicombustível. Se isso não ocorre em maior escala, deve-se provavelmente à postura conservadora do mercado, acredita o presidente da ANP. “Não existe motor de ignição por centelha que trabalhe com derivado de petróleo puro. Ou ele trabalha com álcool hidratado puro ou com mistura de gasolina e 24% de etanol. E essa mescla é extremamente favorável quando o país é obrigado a fazer ajustes de política energética em função até de condicionantes internacionais”, declarou.

Para ele, a adoção mais efetiva de alternativas bioenergéticas seria extremamente útil, até como forma de resgatar o programa do álcool no Brasil, que passa por uma fase de indefinição importante, sofrendo o risco de ter sucateada toda uma infraestrutura logística de armazenamento e distribuição disponível. “Há mais de um ano o álcool é um combustível absolutamente competitivo frente a gasolina. Então, se o problema não é o preço, é a falta de maior confiança do mercado nessa tecnologia que nos impede de avançar no campo dos biocombustíveis”, criticou Horta.

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